Por Pedro A. Duarte - Agência FAPESP - 12 de novembro de 2024 - Publicado…
Contaminação Da Biodiversidade Por Transgênicos, Parte 6/6
NODARI et. al. (2010) registram que já em 1989, pelo menos 15 anos antes da liberação no meio ambiente da primeira planta transgênica, o tomate Flavr Svr segundo TIEDJE et al. (1989), se anteciparam os principais riscos ambientais.
A criação de novas pragas e plantas daninhas, um aumento das pragas já existentes por meio da recombinação gênica entre a planta transgênica e outras espécies filogeneticamente relacionadas e a produção de substâncias que são ou poderiam ser tóxicas a organismos não-alvos, são efeitos que ocorrem.
O efeito disruptivo em comunidades bióticas e o desperdício de valiosos recursos genéticos, seguido de contaminação de espécies nativas com características originadas de parentes distantes ou de espécies não relacionadas também ocorrem.
E efeitos adversos em processos dos ecossistemas e origem de substâncias secundárias tóxicas após a degradação incompleta de químicos perigosos, além do efeito adverso nos processos ecológicos e extravagância de recursos biológicos valorosos, também se registram, conforme assinalam NODARI et. al. (2010).
Praticamente todos os efeitos adversos previstos ocorreram com os organismos geneticamente modificados (OGMs) liberados. Portanto, não é correto dizer que os mesmos são imprevistos, pois os efeitos adversos ou os danos foram alertados por parte da própria comunidade científica.
Uma das consequências mais dramáticas e mais preocupantes de cultivo de variedades transgênicas é a contaminação genética de variedades crioulas ou populações silvestres de uma espécie cultivada, em centro de origem ou de diversidade genética, com os transgenes (TIEDJE et al., 1989 e NODARI e GUERRA, 2004).
A contaminação genética tem muitas consequências. Primeiro, a contaminação de variedades convencionais tem consequências socioeconômicas. É ilustrativo o caso do milho transgênico StarLink, um tipo que produz uma toxina de Bt a partir do gene Cry9C, aprovado pela agência americana “Environmental Protection Agency (EPA)” para alimentação animal mas não para consumo humano.
Este milho contém uma proteína (Cry9C) que pode causar reações alérgicas em humanos, uma vez que ela não seja quebrada imediatamente nos testes de digestão. Como nos Estados Unidos a rotulagem não é utilizada, em apenas dois anos de cultivo causou uma enorme contaminação em outras variedades e na cadeia alimentar.
Detectado em produtos alimentares para humanos nos Estados Unidos; em alimentos e bebidas em outros países e em lotes de sementes de outras variedades (THE ROYAL SOCIETY OF CANADA, 2001).
A contaminação nas áreas de cultivo em apenas dois anos alcançou aproximadamente 9% das amostras coletadas num raio de 9 km das áreas cultivadas com a variedade Starlink pela Secretaria de Agricultura dos Estados Unidos (10.688 de 118.622 amostras). Neste relatório da Academia de Ciências do Canadá consta ainda que a toxina Cry9C é suspeita de causar alergia em pessoas.
No Brasil são comuns as contaminações por transgenes de variedades convencionais ou produzidas organicamente.
NODARI et. al. (2010) relatam que dedicado ao cultivo de produtos orgânicos, sem agrotóxicos e com sementes naturais, por mais de 30 anos, o agricultor Max Enro Dockhorn, de 73 anos, desistiu, no ano passado, da lavoura de soja que mantinha em uma área de 70 ha no município gaúcho de Três Passos.
Dockhorn disse também à revista Carta Capital (2007) “Na safra de 2005 para 2006 perdi metade da minha produção orgânica. No momento de vender, testes identificaram proteína transgênica na minha soja, bastou que, ao redor de minha propriedade, outros produtores usassem sementes transgênicas para haver a contaminação”. Além da perda de valor, que superava os 10 reais por saca, ele teve de pagar royalties por ter sido acusado de usar sementes transgênicas.
Por ocasião da liberação comercial da soja transgênica pelo governo brasileiro era admitido que, por ser uma espécie autógama, a taxa de fecundação cruzara era mínima e, até, desprezível.
No entanto, estudos científicos realizados após esta decisão da CTNBio em 2008, demonstraram que plantas de sojas distantes até 7 m podem se cruzar (ABUD et al., 2003 e SCHUSTER et al., 2007).
Além disso, na época, a CTNBio também desprezou o fato de que o fluxo gênico, ou seja, a dispersão de transgenes, também se dá por mistura de sementes, especialmente pelo uso coletivo ou contratação de máquinas para plantio ou colheita de terceiros, prática muito comum na realidade dos pequenos agricultores brasileiros e da impossibilidade de segregação no sistema de transporte, secagem e armazenagem hoje disponíveis.
Estes dados aliados a tantos outros indicam que a transgenia é uma tecnologia totalitária, e falível, ao contrário do que argumentam seus defensores, pois suas variedades não coexistem com aquelas cultivadas em outros sistemas de cultivo, como o convencional, o orgânico e o agro-ecológico, sem causar efeitos adversos ou negativos, particularmente a quem não quer utilizar transgênicos.
Mas, a contaminação de variedades crioulas por transgenes causa mais impactos que em variedades convencionais. Variedades crioulas são cultivadas especialmente para alimentação humana, cujos produtos são típicos da cultura das comunidades que os produzem. Atualmente estas variedades estão sendo contaminadas principalmente com toxinas de Bt.
Também o reservatório genético, que é uma fonte de variabilidade genética, é prejudicado de diferentes formas pela contaminação genética (ELLSTRAND, 2003).
Para os agricultores, as consequências da contaminação genética são a diminuição da diversidade genética em cultivo, em razão do pequeno número de variedades transgênicas disponíveis, a redução da fonte de novos alelos ou combinações alélicas tanto para a seleção praticada pelos agricultores em suas propriedades como para os programas de melhoramento genético e o prejuízo aos efeitos da seleção natural em favor da adaptação aos ambientes locais (ELLSTRAND, 2003).
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Roberto Naime, Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Fonte – EcoDebate de 04 de setembro de 2016
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