Por Jean Silva* - Jornal da USP - 1 de novembro de 2024 - Tucuruvi,…
Potenciais efeitos da união Bayer-Monsanto
Ativista protesta contra a Monsanto na Alemanha, em 2014
Críticos temem que a aquisição da Monsanto pela Bayer eleve a pressão a favor do plantio de transgênicos em países da União Europeia. Concentração no mercado de sementes e pesticidas também preocupa.
Em maio deste ano, ambientalistas saíram mais uma vez às ruas de cidades de todo mundo em sua “Marcha contra a Monsanto”, que nos últimos quatro anos tem protestado contra o mais odiado produtor de organismos geneticamente modificados (OGMs).
Os ataques dos manifestantes nunca foram bem-sucedidos. Pelo contrário, a empresa se tornou tão bem-sucedida que deve ser adquirida pela Bayer, uma das maiores companhias alemãs, por 66 bilhões de dólares.
Trata-se da maior oferta já feita por uma firma alemã para a aquisição de uma companhia estrangeira. Ambas as empresas produzem pesticidas e, juntas, controlariam 28% desse mercado em todo o mundo. A oferta da Bayer foi selada nesta quarta-feira (14/09), e a fusão ainda precisa ser aprovada por autoridades antitruste.
O tamanho da empresa conjunta deverá ser objeto de escrutínio pelos reguladores do mercado. E a posição potencialmente dominante no campo de agroquímicos também soou o alarme por motivos ambientais.
Enterrando uma marca denegrida
A reação foi particularmente forte na Alemanha, onde a população é amplamente contra alimentos transgênicos. A americana Monsanto se retirou do mercado europeu há alguns anos devido à moratória que a União Europeia (UE) aplicou ao plantio dos chamados OGMs. Mas a companhia ainda continua envolvida na importação de transgênicos para a UE.
A Monsanto se tornou o principal alvo do movimento global contra os transgênicos – particularmente na Europa, onde é alvo de grande controvérsia em torno do glifosato, seu herbicida mais usado e que os ambientalistas continuam tentando proibir.
Embora a autorização do uso de glifosato na UE tenha expirado em junho deste ano, a Comissão Europeia aprovou uma prorrogação de uso por 18 meses.
Mudança de nome
Muitos observadores esperam que a Bayer desista do nome Monsanto. Indagado pelo jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ) se a empresa alemã iria enterrar a marca, o presidente da Bayer, Werner Baumann, afirmou: “Basta dizer que a Bayer goza de excelente reputação e apelo mundiais. Precisamos tirar proveito disso.”
Embora a Bayer esteja envolvida em muitas atividades semelhantes, ela escapou de uma percepção pública negativa na Europa, ao contrário de sua homóloga americana.
O ativista Jan Pehrke, da ONG alemã Coalizão contra os Perigos da Bayer, diz que é mais difícil conscientizar a população das atividades da Bayer na produção de pesticidas porque a empresa está envolvida em muito mais áreas que a Monsanto – que lida basicamente com sementes e transgênicos.
“Nós tentamos colocar o foco não somente na Monsanto e conscientizar o público de que, além dela, há muitas multinacionais agroquímicas que são enormes e também têm produtos perigosos”, afirmou Pehrke à DW.
Ele diz temer que, com um nome menos “manchado” e mais poderoso, como Bayer, à frente dos produtos da Monsanto, países europeus estejam mais sujeitos a aprovar o plantio de transgênicos. “Tememos que, se uma grande empresa alemã, como a Bayer, for tão forte no setor de transgênicos, haverá mais pressão para colocar esses produtos no mercado europeu”, afirmou.
Katherine Paul, diretora associada da Organic Consumers Organization, que organiza o movimento Milhões contra a Monsanto, afirma que uma mudança de nome não fará com que os ativistas antitransgênicos mudem de foco. “Podemos mudar da nossa campanha Milhões contra a Monsanto para Bilhões contra a Bayer”, diz. Pehrke também afirmou que a Coalizão contra os Perigos da Bayer irá mudar o nome da “Marcha contra a Monsanto” para “Marcha contra a Bayer”.
Lições aprendidas
Os executivos da Bayer, por sua vez, parecem estar propensos a evitar os erros que levaram ao problema de imagem da Monsanto na Europa – como a falta de envolvimento com responsáveis políticos e grupos ambientalistas.
Na entrevista ao FAZ, o presidente da Bayer declarou que a empresa está convidando ativistas para conversar com os administradores da companhia. “Assim como falo com nossos investidores para convencê-los dos planos, a oferta também vale para organizações ambientais e outras ONGs”, disse Baumann.
“A nossa forma de fazer negócios pode diferir da da Monsanto. Posso assegurá-los de que conduziríamos esses negócios com base nos mesmos padrões das nossas demais operações.”
E exatamente essas outras áreas em que a Bayer atua a protegeram da crítica por parte da opinião pública, mesmo tendo sido alvo de controvérsia por algumas partes de seus negócios agrícolas. Isso inclui a produção de pesticidas neonicotinoides, acusados de matar abelhas e afetar a biodiversidade.
“A Monsanto, a Bayer, a Syngenta e outras empresas estão todas no mesmo barco quanto à necessidade de defender nossas atividades na agricultura”, afirma Brandon Mitchener, porta-voz da Monsanto na Europa. “As pessoas que se opõem a qualquer inovação na agricultura se opõem da mesma maneira aos neonicotinoides fabricados pela Bayer e a Syngenta, ao glifosato e a sementes transgênicas vendidas por todas as três [empresas].”
Mercado de sementes
Além do peso político reforçado da nova empresa conjunta, a concentração de patentes de sementes também é uma das principais preocupações. A incorporação proposta vem numa hora de recentes fusões e aquisições no setor agroquímico, com os investidores procurando cortar custos em face do declínio dos preços das commodities agrícolas.
Em fevereiro, a ChemChina comprou a Syngenta, assumindo a primeira posição no mercado de produtos químicos agrícolas. No ano passado, as empresas americanas Dow e DuPont anunciaram uma fusão de 13 bilhões de dólares para criar a DowDuPont, que irá controlar cerca de 40% do mercado de sementes de milho e soja nos EUA.
Sven Giegold, deputado alemão no Parlamento Europeu pelo Partido Verde, trabalhou numa petição online contra a fusão Bayer-Monsanto. Ele afirma que as uniões de empresas no setor agroquímico está fora de controle e coloca o futuro da agricultura em risco.
“O Partido Verde defende a ideia de que, numa economia de mercado, deve haver uma competição ferrenha”, afirmou Giegold à DW. “Já existe um forte monopólio no setor de sementes e pesticidas – mais concentração no mercado é indesejável.”
Giegold afirma que se houver somente alguns poucos competidores no mercado de sementes, os agricultores serão forçados a comprar deles, muitas vezes em combinação com pesticidas.
Fonte – DW de 15 de setembro de 2016
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