Por Bruna Bopp - Agência FAPESP – 21 de novembro de 2024 - Uma expedição…
Maior aumento da concentração de CO2 da história humana
“Se uma planta não consegue viver de acordo com sua natureza, ela morre,
assim também o ser humano”
Henry Thoreau (200 anos de seu nascimento)
Estudos indicam que o mundo conseguiu, pelo terceiro ano consecutivo, manter estáveis suas emissões de gases CO2. Os otimistas comemoram o desacoplamento relativo. Mas os números indicam que, se as emissões pararam de subir, elas continuam nos níveis mais elevados da história.
Na realidade, a concentração de gases de efeito estufa (GEE) ultrapassou permanentemente o limiar de 400 partes por milhão e atingiu um perigoso ponto de não retorno. Nos 800 mil anos antes da revolução industrial a concentração de CO2 na atmosfera ficou abaixo de 280 partes por milhão (ppm). Ou seja, em cada um milhão de moléculas de ar no planeta, havia menos de 280 do principal gás de efeito estufa. As medições com base no estudo do gelo, mostram que em 1860 a concentração atingiu 290 ppm. Em 1900 estava em 295 ppm. Chegou a 300 ppm em 1920 e atingiu 310 ppm em 1950. A partir do início do Antropoceno (1950), o efeito estufa se acelerou.
Em 1958, Charles Keeling, instalou no alto do vulcão Mauna Loa o primeiro equipamento para medir as concentrações de CO2 na atmosfera. Isto possibilitou que a partir de uma série histórica de dados houvesse a possibilidade de acompanhar a poluição recente. A série de Keeling mostra que a concentração de CO2 na atmosfera, na média mensal, chegou a 399,76 partes por milhão (ppm) em maio de 2013 e só ultrapassou a barreira de 400 ppm no ano seguinte. Em abril de 2014 a concentração de CO2 ficou em 401,34 ppm, passou para 401,88 ppm em maio e caiu para 401,20 ppm em junho de 2014. Mas como a concentração segue um padrão sazonal, ao longo do ano, com os picos acontecendo no mês de maio e os vales acontecendo nos meses de setembro, a média anual de 2014 foi de 398,61 ppm.
Em 2015, a marca das 400 ppm foi ultrapassada em 8 dos 12 meses. Na média anual, 2015 foi o primeiro ano a ultrapassar a barreira simbólica e marcou a cifra de 400,83 ppm. Mas foi o ano de 2016 que tornou permanente a marca de 400 ppm em todos os meses e em todas as semanas. A média anual de 2016 foi de 404,21 ppm.
A National Oceanic & Atmospheric Administration – NOAA – (Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos) apresenta o gráfico acima com o crescimento médio anual (e por décadas) da concentração de CO2. Nota-se, que apesar das variações anuais, existe uma clara tendência de aumento da concentração dos gases de efeito estufa.
O aumento médio anual estava abaixo de 1 ppm na década de 1960, chegou a 2 ppm na década passada e está em 2,41 ppm ao ano no período 2010-2016. Neste ritmo, a concentração de CO2 na atmosfera pode chegar a 700 ppm no final do século XXI, quando o nível considerado minimamente seguro seria 350 ppm. Já estamos vivendo uma situação inédita em relação aos últimos milhões de anos do Planeta.
Artigo de Nicola Jones (26/01/2017), no site e360 Yale, apresenta o gráfico abaixo que mostra que a concentração de CO2 ficou abaixo de 400 ppm nos últimos 20 milhões de anos. Somente antes de 200 milhões de anos, a concentração ficou consistentemente acima de 1000 ppm. No ritmo acelerado da atualidade esta marca pode ser atingida no século XXII. Seria o caos climático para os humanos e a biodiversidade da Terra.
O mundo corre sério perigo. O aumento da concentração de CO2 na atmosfera contribuiu para o fato do ano de 2016 ser o mais quente já registrado e aponta para novos recordes futuros de aquecimento. O efeito estufa trará custos enormes e as sociedades podem não estar preparadas para pagar o alto preço de limpar no futuro a sujeira feita no passado e no presente.
Artigo de David Spratt (26/01/2017) mostra que o degelo da Antártica atingiu um ponto de mutação e, a partir de 2016, se acelerou de forma preocupante. As principais conclusões do artigo são:
“O setor do Mar de Amundsen da Plataforma de Gelo da Antártica Ocidental, provavelmente foi desestabilizado e o recuo de gelo é imparável nas condições atuais;
Nenhuma aceleração adicional nas mudanças climáticas seria necessária para desencadear o colapso do restante da Plataforma de Gelo Antártico Ocidental em escalas de tempo de décadas;
Somente a Antártida tem o potencial de contribuir com mais de um metro de elevação do nível do mar até 2100;
Uma grande fração do gelo da bacia da Antártida Ocidental pode desaparecer dentro de dois séculos, causando um aumento do nível do mar de 3 a 5 metros;
Mecanismos semelhantes aos que estão causando a desglaciação da Antártica Ocidental também são encontrados, em menor grau, na Antártida Oriental;
• A desglaciação parcial da camada de gelo da Antártica Oriental é provável no atual nível de concentração de dióxido de carbono (CO2) atmosférico, contribuindo para 10 metros de aumento do nível do mar no longo prazo e 5 metros nos primeiros 200 anos”.
Portanto, existe uma relação inexorável entre o aumento das emissões de gases de efeito estufa, provocadas pelo aumento das atividades antrópicas (crescimento demoeconômico do mundo), o aumento da concentração de CO2 na atmosfera, o aumento do aquecimento global, o aumento do degelo do Ártico, da Antártica, da Groenlândia e dos glaciares – tudo isto – provocando o aumento do nível dos oceanos e o naufrágio das áreas costeiras (urbanas e rurais) de todo o mundo.
No ritmo atual, as gerações futuras vão receber uma herança maldita, que pode provocar uma significativa mobilidade social e ambiental descendente. No longo prazo, o aumento da concentração de CO2 na atmosfera e o aquecimento global – filhos bastardos do progresso humano – são as maiores ameaças à vida na Terra e podem ser responsáveis pelo colapso da civilização.
Referências
Nicola Jones. How the World Passed a Carbon Threshold and Why It Matters, e360 Yale, 26/01/2017
David Spratt. Antarctic Tipping Points for a Multi-Metre Sea Level Rise. Resilience, 26/01/2017
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal.
Fonte – EcoDebate de 01 de fevereiro de 2017
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