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Hidrelétricas na Amazônia: uma ameaça para o clima
Canteiro da construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, em 2014 (© Carol Quintanilha/Greenpeace)
A aposta do governo brasileiro nas hidrelétricas com grandes reservatórios na Amazônia representa um passo atrás em relação aos compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris
O governo brasileiro indica querer voltar a construir hidrelétricas com grandes reservatórios, conforme anúncio de setembro do ano passado da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). No entanto, para Philip Fearnside, pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), este anúncio vai completamente contra os compromissos assumidos pelo Brasil ao ratificar o Acordo de Paris para o clima – o documento da ONU que pretende barrar o aquecimento global e que já virou lei no Brasil.
O Acordo prevê que países do mundo todo se comprometam a evitar as emissões de gases que agravam o efeito estufa. A meta é não deixar que o aquecimento da Terra chegue perto de 2 °C – e que, preferencialmente, nem chegue aos 1,5 °C. Superar esse 1,5 °C significaria trazer riscos graves para as populações e para a biodiversidade do planeta.
Em artigo publicado na The Globalist, no fim de janeiro, Fearnside, que recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007, afirma que a construção de hidrelétricas na Amazônia, principalmente com grandes reservatórios, causa um grande fluxo de emissão do metano (CH4).
A emissão de metano fica concentrada nos primeiros anos após o enchimento do reservatório, assim, a maior parte do impacto ambiental dessas hidrelétricas ocorre nesse período, quando as árvores da floresta morrem e o carbono nas folhas e no solo é transformado em metano no fundo do reservatório. Portanto, esta emissão agrava ainda mais o impacto das barragens sobre o Acordo de Paris porque o impacto deste gás está concentrado justamente na janela de tempo necessária para atingir a meta. Como explica Fearnside, emissões evitadas 80, 90 ou 100 anos no futuro não são tão relevantes quanto as emissões dos próximos 20 anos: “O Acordo de Paris mudou tudo porque o critério passou a ser não passar de um limite “bem abaixo” de 2º C acima da média antes da Revolução Industrial e trabalhar na direção de chegar a 1,5º C, o que significa que o que realmente conta são os próximos 20 anos. É uma mudança muito importante em termos das hidrelétricas porque elas têm grande impacto a curto prazo”, diz o pesquisador.
De acordo com o autor, cada tonelada de metano tem um impacto sobre o aquecimento global cerca de 200 vezes o de uma tonelada de CO2 enquanto permanece na atmosfera. O metano permanece por um tempo relativamente curto (12,4 anos em média), porém, se encaixa nesse período que é o mais relevante para os compromissos assumidos com o clima. Uma tonelada de CO2 tem um impacto muito mais brando que metano enquanto permanece na atmosfera, mas fica cerca de dez vezes mais tempo. Para converter metano em equivalentes de CO2 com uma base de 100 anos, cada tonelada de metano vale por 34 toneladas de CO2, mas se converter com base de 20 anos vale por 86 toneladas de CO2. Assim, o impacto das barragens é muito maior se é mesmo para cumprir com o limite de temperatura acordado em Paris.
Grandes reservatórios
No artigo, Fearnside esclarece que, no Brasil, os planos para futuras grandes barragens estão predominantemente na Amazônia, onde as emissões são mais altas do que em locais fora dos trópicos úmidos devido à alta biomassa e clima quente da Amazônia. As emissões de grandes reservatórios são maiores do que as de barragens a fio d’água, embora as barragens de fio d’agua também não tenham emissões zero ou insignificantes. Além disso, é preciso considerar os outros impactos ambientais que também são mais significativoss com grandes reservatórios, incluindo deslocamento forçado de pessoas e a perda de floresta e biodiversidade.
O reconhecimento dos impactos das hidrelétricas na Amazônia, incluindo suas emissões de gases de efeito estufa e seus outros impactos ambientais e sociais, é essencial para a tomada de decisões racionais sobre o desenvolvimento energético e sobre estratégias para mitigar as mudanças climáticas. De acordo com o artigo, a contabilidade adequada para o impacto do aquecimento global das barragens e o metano que produzem é necessário para cumprir os objetivos acordados em Paris. Para Fearnside, a mudança de prioridades anunciada recentemente pelo Brasil para barragens com grandes reservatórios é um golpe para esses esforços.
Veja o artigo de Philip Fearnside, em inglês.
Fonte – Greenpeace de 09 de fevereiro de 2017
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