Por Jean Silva* - Jornal da USP - 1 de novembro de 2024 - Tucuruvi,…
BPS e BPF: alternativas ao BPA são tão ou mais perigosas. Entenda
Os bisfenóis estão presentes nas embalagens de plástico, nos enlatados, nas maquiagens e até em fórmulas para bebês
Você já deve ter ouvido falar sobre o BPA ou pelo menos já viu alguma embalagem com o selo “BPA-free” (livre de BPA). Este material, também chamado de bisfenol A, é um material sintético utilizado em diversos tipos de plásticos, recibos, embalagens de alimentos e outros produtos.
Depois do surgimento de uma variedade de estudos mostrando seus efeitos prejudiciais aos organismos, principalmente por sua capacidade de desequilibrar o sistema endócrino, seu uso foi regulamentado e o BPA passou a ser proibido em mamadeiras e limitado a determinados níveis em outros tipos de materiais.
Substitutos
Neste contexto, sem o BPA, as empresas desenvolveram substitutos semelhantes, o BPS e o BPF, também chamados de bisfenol S e bisfenol F, respectivamente.
O BPS é muito empregado como agente de fixação de lavagem em produtos de limpeza industrial, solvente de galvanoplastia e melhorador de cor de recibos de papel (saiba mais em “Perigo à espreita: você sabe o que é BPS?)”.
Já o BPF é mais presente em revestimentos epóxi, pisos industriais, lâminas, adesivos, plásticos, canos de água, selantes dentários e embalagens de alimentos (saiba mais em “Você sabe o que é BPF e os riscos que ele proporciona?“).
Apesar da diferença na terminação dos nomes, os três, BPA, BPS e BPF são disruptores endócrinos muito semelhantes quimicamente com capacidade de produzirem efeitos similares para o uso na indústria e também na saúde dos organismos.
Contaminação
A presença dos bisfenóis não se limita à embalagens e a materiais em que eles são utilizados como matéria-prima.
De acordo com estudo publicado pela Environmental Health Perspective, o BPS, o BPF e o BPA também acabam contaminando produtos cotidianos como pastas de dente, produtos para cabelo, maquiagens, loções, bilhetes, passagens, envelopes, carnes, processados de carne, produtos enlatados, vegetais, cereais, ração de gato e cachorro, fórmulas para bebês e estão presentes até na poeira doméstica.
Com a ingestão e o contato com alimentos e produtos contaminados, essas variedades de bisfenol se acumulam no organismo humano. Em contato com a pele através do toque de papéis de recibo e jornais, por exemplo, eles acabam parando na corrente sanguínea. Exames mostraram a presença de bisfenóis inclusive na urina humana.
Se descartados de maneira incorreta, os materiais contendo BPA, BPF e BPS vão parar no oceano e acabam ficando presos no gelo polar e em rochas, passando a integrar o ambiente e o organismo dos animais, causando sérios prejuízos ambientais.
Efeitos
O BPF pode proporcionar efeitos negativos na tireoide, aumento do tamanho do útero e do peso de testículos e glândulas, entre outros efeitos fisiológicos/bioquímicos indesejados.
O BPS apresenta comprovadamente potencial de causar câncer, efeitos negativos nos testículos de mamíferos, na glândula pituitária, na reprodução de fêmeas mamíferas e dos peixes.
De acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA, na sigla em inglês), o bisfenol S se torna altamente perigoso à saúde quando utilizado como alternativa à tinta de impressão.
O BPA, o mais estudado de todos, pode causar aborto, anomalias e tumores do trato reprodutivo, câncer de mama e de próstata, déficit de atenção, de memória visual e motora, diabetes, diminuição da qualidade e quantidade de esperma em adultos, endometriose, fibromas uterinos, gestação ectópica (fora da cavidade uterina), hiperatividade, infertilidade, modificações do desenvolvimento de órgãos sexuais internos, obesidade, precocidade sexual, doenças cardíacas e síndrome dos ovários policísticos. Um estudo publicado pela agência Fapesp mostrou que o bisfenol A pode desregular os hormônios da tireoide mesmo em doses baixas.
Aos animais, os disruptores endócrinos que se acumulam no ambiente causam sérios danos. Eles provocam reduções em populações de golfinhos, baleias, veados e furões, prejudicam o desenvolvimento de ovos de aves, causam deformidades sexuais em répteis e peixes, alterações na metamorfose de anfíbios e muitos outros danos.
Exposição
Depois da polêmica envolvendo o BPA e a sua proibição, as pessoas passaram a se sentir mais seguras com os produtos contendo os rótulos “BPA free“. Entretanto, com o desenvolvendo dos substitutos BPF e BPS que são, assim como o BPA, disruptores endócrinos e capazes de causarem danos semelhantes, não há segurança verificável, pois estes ainda não são regulamentados e as pessoas podem estar expostas a esses materiais indiscriminadamente.
Estima-se que os prejuízos financeiros com os habitantes europeus gerados pelos danos causados pelos disruptores endócrinos geram um custo de 157 a 210 bilhões de euros por ano à União Europeia (dados de 2015).
Prevenção
A melhor maneira de prevenir a exposição aos diferentes tipos de bisfenol é evitar ao máximo consumir produtos industrializados que venham em embalagens de plástico e enlatados.
Quando possível, dê preferência a embalagens e recipientes de vidro, cerâmica e aço inoxidável
Jamais aqueça ou resfrie recipientes de plástico e descarte aqueles rachados ou quebrados, pois alterações na temperatura e na forma física do recipiente podem liberar bisfenol.
Não imprima recibos e comprovantes de papel, dê preferência às versões digitalizadas.
Prefira os alimentos mais ao natural possível, que fiquem pouco tempo em contato com embalagens.
Descarte
O descarte dos produtos contendo bisfenol é um grande problema. Primeiramente porque se forem descartados incorretamente, além de causar poluição visual, estes materiais começam a liberar bisfenol no ambiente contaminando lençóis freáticos, solos e a atmosfera, podendo vir parar em alimentos, recursos hídricos e prejudicar pessoas e animais das formas mais graves possíveis.
Por outro lado, se o material contendo bisfenol for destinado para a reciclagem, dependendo do tipo de material que ele vir a se transformar pode ter um impacto maior sobre a saúde humana, um exemplo nesse sentido são os papéis higiênicos reciclados a partir de papéis contendo bisfenol. O papel higiênico reciclado contendo bisfenol é uma exposição mais grave, pois entra em contato direto com mucosas mais sensíveis indo parar diretamente na corrente sanguínea.
Além do mais, incentivar a reciclagem de produtos contendo bisfenol é incentivar a permanência desse tipo de substância no cotidiano das pessoas e no meio ambiente.
Sendo assim, a melhor opção, obviamente, é a redução mais radical possível desse tipo de produto, e quando não for possível zerar o consumo, a melhor forma de descartar é a seguinte:
Unir recibos e jornais (ou outro material) que contenham bisfenóis, embalá-los firmemente em sacolas plásticas não-biodegradáveis (para que não vazem) e destiná-los a aterros seguros, pois lá eles não correrão o risco de vazarem para lençóis freáticos ou solos.
O problema é que serão um volume a mais em aterros. Então aliado à essa atitude é preciso pressionar órgãos fiscalizadores e empresas para que deixem de usar substâncias tão nocivas como os bisfenóis e seus substitutos, principalmente, ou pelo menos, em embalagens de alimentos e outros recipientes que são fontes de exposição mais significativas.
Fonte – eCycle
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