Por Jean Silva* - Jornal da USP - 1 de novembro de 2024 - Tucuruvi,…
Agrotóxicos agressivos ao meio ambiente
Imagem: iStock / Getty Images Plus / comzeal
O uso de agrotóxicos prejudica a vida de diversas espécies, causando inúmeros impactos ambientais.
Há 56 anos, foi publicado o livro “Primavera Silenciosa”, de Rachel Carson, que advertia sobre os efeitos prejudiciais dos pesticidas no meio ambiente e culpava as indústrias químicas pela crescente contaminação que afetava diversos animais, incluindo aves e peixes.
Em um momento em que os agrotóxicos estavam aumentando a competitividade da produção agrícola norte-americana, muitos cientistas criticaram o livro considerando-o fantasioso. No entanto, suas denúncias repercutiram na sociedade e o tornaram o primeiro livro de divulgação sobre impacto ambiental, além de um clássico da conscientização ecológica.
“Primavera Silenciosa” é considerada a publicação que inspirou o movimento ambientalista que inicialmente conseguiu fazer com que o Departamento de Agricultura revisasse sua política sobre agrotóxicos, proibisse o uso do DDT nos Estados Unidos e contribuísse para a criação da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA).
O livro remete o leitor para um futuro em que as aves morrem devido à ingestão de pesticidas, o que justifica o silêncio da primavera ao qual se refere o título. Infelizmente, o futuro prognosticado por Rachel Carson está próximo, pois a situação atual é mais grave do que ela havia previsto. Na época, a autora não sabia como os polinizadores, como as abelhas, são vitais para a biodiversidade e para a produção de alimentos. Estes são um dos seres vivos mais prejudicados pelos agrotóxicos.
No final de março, a União Europeia proibiu o uso de três agrotóxicos a base de neonicotinoides na agricultura: imidacloprid e clotianidina, do laboratório Bayer, e tiametoxam, da Syngenta. A proibição teve como base um estudo da Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (EFSA), divulgado em fevereiro deste ano, que afirma serem os neonicotinoides causadores de vários danos às abelhas e outros polinizadores silvestres, por prejudicar a memória e reduzir o número de posturas da rainha da colmeia. Estudos de amostras de mel revelaram contaminação global causada pelos neonicotinoides.
As abelhas têm importante papel na produção de alimentos. Segundo dados adotados pelas Nações Unidas, 71% das culturas agrícolas que respondem por 90% da alimentação mundial dependem da polinização das abelhas.
No Brasil, apicultores do Rio Grande do Sul, estado que concentra a maior produção de mel do país, têm alertado sobre o aumento da mortandade de abelhas, observando a progressiva redução de colmeias ano a ano. As estimativas são de que as perdas decorrentes, tanto de colmeias como da produção de mel, estejam em torno de 30% a 40%, embora muitos agricultores estimem que o prejuízo seja maior.
Em 2017, o relatório final do Grupo de Trabalho sobre Mortandade da Abelhas no Rio Grande do Sul, criado em 2015, incluiu como primeira providência para conter a morte dos insetos que está dizimando as colmeias gaúchas o banimento dos agrotóxicos neonicotinóides. O Grupo explica que a ação mortal desses pesticidas nas abelhas é exercida sobre seu sistema nervoso central, bloqueando de forma irreversível os receptores nervosos. Estima-se que, em 2015, pelo menos 250 mil colmeias desapareceram no Estado.
O documento do Grupo de Trabalho aponta como principal causa a utilização em larga escala no Brasil de agrotóxicos com efeitos nocivos às abelhas, em especial aqueles do grupo de neonicotinóides (Clotianidina, Imidacloprid, Tiametoxam) e Fipronil. Este último, a Agência Ambiental norte-americana classificou como de alto potencial cancerígeno, afetando principalmente a tireoide.
Enquanto isso, a bancada ruralista na Câmara dos Deputados segue firme na tentativa de destruir a atual lei de agrotóxicos por meio da aprovação de um relatório do Deputado Luiz Nishimori na Comissão Especial sobre o projeto de Lei 6299/02, que muda a forma de avaliar registros de defensivos agrícolas (agrotóxicos) do atual modelo, priorizando a identificação do perigo por um procedimento de análise de risco, visando reduzir o tempo médio da avaliação de oito para três anos.
O projeto de lei apresenta diversos problemas denunciados amplamente por cientistas e ambientalistas. Por exemplo: para amenizar a nocividade dos agrotóxicos, estes passariam a ser chamados “defensivos agrícolas”; acabaria a regulação específica sobre propaganda de agrotóxicos; a avaliação de novos agrotóxicos deixaria de considerar os impactos à saúde e ao meio ambiente; seriam permitidas a venda de alguns agrotóxicos sem receituário agronômico; estados e municípios ficariam impedidos de adotar regulações mais restritivas; e seria admitida a possibilidade de registro de substâncias comprovadamente cancerígenas sendo estabelecidos somente níveis aceitáveis para sua utilização.
O pacote de medidas de interesse da bancada ruralista no Brasil contraria o movimento global contra a proliferação dos pesticidas que prejudicam o meio ambiente e a saúde humana. A tendência mundial é um rígido controle na utilização dos agrotóxicos, adotando sua redução e até mesmo proibição.
Fonte – Reinaldo Dias, Pensamento Verde de 05 de maio de 2018
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