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Perigo escondido – cientistas alertam para os problemas causados pelos ftalatos, compostos químicos presentes em garrafas plásticas, cosméticos, brinquedos e perfumes

Crianças participam de manifestação nos Estados Unidos contra o uso de ftalatos na fabricação de brinquedos | Crianças participam de manifestação nos Estados Unidos contra o uso de ftalatos na fabricação de brinquedos

Não importa o quão cuidadosos somos com nossa saúde, nossos corpos certamente estão repletos de compostos químicos nocivos chamados ftalatos (phthalates). Eles são praticamente onipresentes na vida moderna, sendo encontrados em garrafas plásticas, cosméticos, alguns brinquedos, condicionadores de cabelo e perfumes. Muitos cientistas associam esses compostos a vários males, desde deformidades sexuais em bebês até a obesidade e diabete.

O problema é que os ftalatos suprimem os hormônios masculinos e, às vezes, imitam os femininos. Compostos químicos chamados de perturbadores endócrinos, acredita-se, explicam a proliferação de peixes “intersexuados” – peixes em que os machos produzem ovos – assim como deformidades sexuais em animais e seres humanos. Os ftalatos (pronuncia-se talatos) estão entre os perturbadores endócrinos mais comuns, além de serem do tipo mais difícil de se evitar. Eles estão presentes até na água de torneira, e os níveis sobem de forma galopante em certos tipos de garrafas plásticas de água.

Estes compostos podem não trazer mal a nós, adultos, mas com crianças a situação é diferente. Em meninas, as pesquisas revelam que os ftalatos podem favorecer a puberdade precoce. Entretanto, os mais vulneráveis são os fetos masculinos durante o primeiro trimestre de gravidez, época em que o sexo está se diferenciando. Os pesquisadores estão convencidos de que os ftalatos podem “feminilizar” os fetos neste estágio.

“Alguns ftalatos usados com frequência podem diminuir a virilidade em humanos”, concluiu uma pesquisa realizada pela Universidade de Rochester. O estudo baseou suas conclusões, em parte, em medições da “distância anugenital” – a distância entre o ânus e os genitais, que normalmente é o dobro nos homens do que é nas mulheres. Alguns pesquisadores acreditam que a redução desta distância em indivíduos masculinos reflete uma “feminilização” da anatomia masculina.

Os pesquisadores descobriram que mulheres grávidas que apresentavam uma maior concentração de ftalatos em seus organismos davam à luz bebês com uma distância anugenital mais curta. É possível que tal mudança não traga qualquer implicação ao desenvolvimento dessas crianças. Porém foi observado que os bebês do sexo masculino com menor distância anugenital apresentaram maiores possibilidades de ter testículos não-descendentes e menor volume peniano. Além disso, os ftalatos estão associados à baixa contagem de espermatozóides ou baixa qualidade do esperma em humanos.

Na China, cientistas descobriram que as fêmeas de ratos que receberam ftalatos deram à luz filhotes com uma deformidade peniana chamada hipospádia – caso em que a uretra sai pela lateral ou na base do pênis, e não na ponta. Muitos outros estudos com animais em todo o mundo obtiveram resultados semelhantes.

Alguns endocrinologistas utilizam o termo “síndrome do ftalato” para se referir à maioria dos casos envolvendo hipospádia ou testículos não descendentes.

“Dados de estudos científicos apontam para uma relação entre o desenvolvimento embrionário adverso e a exposição a ftalatos”, concluiu um artigo publicado recentemente pela revista Trends in Endocrinology and Metabolism.

A Endocrine Society – entidade composta de milhares de médicos da especialidade – publicou em junho último um aviso alarmante de que os perturbadores endócrinos, entre eles os ftalatos, representam uma “grande preocupação à saúde pública”.

Uma das charadas para cientistas e jornalistas é como chamar a atenção para estes riscos sem fazer sensacionalismo em torno de perigos que possam nem existir. Todavia, é cada dia mais comum ver endocrinologistas concluírem que as evidências apontam para se tomar certos cuidados.

É verdade também que existem vários artigos científicos questionando até que ponto os perturbadores endócrinos estão ligados à obesidade, autismo e alergias, apesar de as evidências nesses casos serem menos sólidas do que nos casos de anormalidades genitais e baixa contagem de espermatozóides.

O Conselho de Química Norte-Americano sugere que os ftalatos não representam um problema. Para a instituição, esses compostos não se soltam de produtos tão facilmente e são rapidamente eliminados pelo organismo humano. A indústria química apontou um estudo aparentemente reconfortante, publicado no Journal of Urology (Jornal de Urologia), que indica que casos de hipospádia não aumentaram no estado de Nova Iorque (mesmo apesar de pesquisas diferentes apontarem aumento dos casos nos EUA e também na Dinamarca).

James Yager, professor de toxicologia na Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health, concorda que existem enormes incertezas neste campo, mas acredita que gestantes e crianças devem tomar certas precauções. “Quando minha mulher estava grávida, nos preocupávamos com bebidas e cigarro. Hoje, estaríamos mais preocupados com a exposição a químicos como os ftalatos, presentes nas mamadeiras”, diz.

Theo Colborn, fundadora do Endocrine Disruption Exchange, vai mais longe. Ela incentiva os pesquisadores a jogar fora garrafas plásticas de água e as substituir por jarras de aço inox. “Eu não possuo utensílios ou recipientes plásticos em casa. Uso vidro”, afirma a cientista.

Certos ftalatos foram proibidos nos brinquedos vendidos nos EUA, mas as crianças continuam expostas a estes compostos químicos desde o momento em que são concebidas. Dr. Ted Schettler, da Science and Environmental Health Network, afirma que a forma dos agentes do governo examinar os riscos (estudando o impacto de um composto químico por vez) está errada, considerando que as pessoas são expostas a um verdadeiro coquetel químico todos os dias. Regular o uso de compostos é tão patético, de acordo com ele, que não é necessário nem divulgar quais produtos contém ftalatos.

Se terroristas estivessem contaminando nossa água com ftalatos, seríamos atingidos de forma cruel e teríamos de gastar bilhões de dólares para garantir a segurança. Entretanto, os riscos disto acontecer são menores do que envenenarmos a nós mesmos.

Fontes – The New York Times / tradução Thiago Ferreira, Gazeta do Povo de 17 julho de 2009

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