Por Jean Silva* - Jornal da USP - 1 de novembro de 2024 - Tucuruvi,…
Frutos maduros por caminhos distintos
O amadurecimento do mamão, estudado na USP, é controlado por genes do tipo NAC. Léo Ramos Chaves
Enciclopédia genética revela rotas bioquímicas distintas na maturação do tomate, do mamão e da banana
ma equipe internacional liderada pelo bioquímico Silin Zhong, da Universidade Chinesa de Hong Kong, analisou todo o DNA de 11 espécies de plantas, além de outras moléculas envolvidas na ação dos genes, para desvendar a sequência de reações bioquímicas que controlam o rápido amadurecimento de frutos como o tomate, o mamão e a banana. As conclusões publicadas hoje (24/9), em artigo na revista Nature Plants, fornecem pistas de como aconteceu a evolução das frutas carnosas (com polpa) ao longo dos últimos 160 milhões de anos.
“Foi um trabalho complexo e que levou cinco anos para ser concluído”, relata João Paulo Fabi, farmacêutico bioquímico da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP), que gerou dados sobre fisiologia e genética do amadurecimento do mamão papaia para o estudo coordenado por Zhong. Ao todo, os pesquisadores sequenciaram 361 transcriptomas – os conjuntos de todas as sequências de RNA produzidas pelos genes de um organismo. Além disso, realizaram centenas de análises bioquímicas para verificar a influência de proteínas que se ligam às moléculas de DNA, regulando a expressão dos genes das plantas. O resultado é uma enciclopédia de dados genéticos que pode ser consultada no site fruitENCODE.
As maçãs ficam no ponto graças aos genes MADS, ligados à formação de flores. Léo Ramos Chaves
Ao longo da evolução, desde que surgiram as plantas com flores (angiospermas), frutos secos deram origem a versões carnosas mais atraentes para animais que cumprem o papel de dispersar as sementes ao defecá-las longe da planta-mãe. Por isso, ter seus frutos devorados só é um benefício para as plantas quando as sementes estão totalmente desenvolvidas dentro dos frutos, prontas para germinar em outro lugar. Nesse momento as células do fruto verde começam a produzir o gás etileno, hormônio vegetal que desencadeia mudanças de cor, textura e sabor.
O amadurecimento acelerado de alguns frutos acontece por uma reação em cadeia: a presença do etileno induz à produção de ainda mais gás, em um ciclo de retroalimentação. Isso acontece nas chamadas frutas climatéricas, que foram objeto do estudo, como a banana. Vem desse mecanismo a popular sugestão de embrulhar cachos de banana verde em jornal: o gás etileno produzido pelos frutos fica preso, acelerando o amadurecimento.
Zhong e sua equipe identificaram os genes e proteínas que modificam a expressão dos genes responsáveis pela produção de etileno e descobriram três tipos de ciclos de retroalimentação. O resultado indica caminhos evolutivos independentes, corroborando o que outros estudos já sugeriam: a evolução das plantas produziu linhagens de frutos climatéricos de maneira independente ao longo da história da vida na Terra.
As bananas são diferentes dos mamões e outros frutos estudados: respondem aos dois grupos de genes. Léo Ramos Chaves
No mamão, no melão e no pêssego, o ciclo do etileno é controlado por genes do tipo NAC, uma das maiores famílias de genes reguladores das plantas. Já no tomate, na maçã e na pera, genes da família MADS comandam. “Os genes MADS são conhecidos por serem essenciais na formação das flores”, explica o agrônomo Lázaro Peres, especialista na fisiologia e genética do tomateiro na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, que não participou do estudo. A diferença na rota bioquímica explica por que os genomas do tomate, da maçã e da pera sofreram duplicações ao longo da evolução. “A duplicação permite que uma das cópias de um gene ganhe uma nova função no desenvolvimento da planta, sem comprometer a antiga”, diz Peres.
A banana é diferente das outras. Talvez por seu genoma ter sido duplicado um número de vezes muito maior que o da maioria das frutas, o ciclo de amadurecimento é regulado tanto por genes NAC quanto MADS. A diferença também pode ser atribuída ao fato de a banana ser uma monocotiledônea, classe de plantas que inclui capins e milho, enquanto as demais plantas com frutos carnosos estudadas são dicotiledôneas – definidas por terem duas partes na semente (imagine um feijão brotando). Essas duas classes têm muitas diferenças em sua estrutura e seu funcionamento.
Além de estudos evolutivos, a equipe de Zhong sugere o uso dos dados da fruitENCODE para o desenvolvimento de estratégias que retardem a degradação dos frutos durante o transporte, além de aumentar sua duração nas prateleiras dos supermercados.
Artigo científico
LÜ, P. et al. Genome encode analyses reveal the basis of convergent evolution of fleshy fruit ripening. Nature Plants. 24 set. 2018.
Fonte – Igor Zolnerkevic, Pesquisa FAPESP de 24 de setembro de 2018
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