Há mais fragmentos microscópicos de plástico entre as algas dos arrecifes das praias urbanas de Pernambuco do que os micro-organismos, base da cadeia alimentar.
É o que indica o resultado de uma pesquisa, ainda inédita, realizada pelo departamento de Oceanografia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Os dados do estudo ainda estão na fase final de sistematização, última etapa antes da publicação em revistas científicas.
A presença de micro e nanoplásticos em algas e arrecifes da costa brasileira não é novidade.
As primeiras pesquisas a identificar o material no litoral de Sergipe e Alagoas aconteceram em 2014 e foram financiadas pela Petrobras. Depois há outros registros na praia de Tamandaré, litoral sul do estado, em 2018.
A coleta das algas vermelhas da espécie Palisada perforata aconteceu entre 2017 e 2019 nos arrecifes do Pina, zona sul da capital pernambucana, tanto em meses chuvosos quanto em períodos mais quentes e de estiagem.
A quantidade de plástico foi comparada com a de microalgas que compõem o fitoplâncton, e com a quantidade de organismos animais. Na maior parte da amostras, havia um pouco mais microalgas do que plástico, mas na comparação com os animais, a proporção se inverteu: só uma amostra tinha mais micro-organismos vivos do que plástico.
Os números dão uma ideia mais clara: em setembro de 2017 a equipe identificou 277 fragmentos de plástico por mililitro de água do mar agregados às algas vermelhas. Na mesma amostra, havia apenas três nematódeos (animal de corpo cilíndrico), uma larva de microcrustáceo e 11 protozoários ciliados.
Seis meses depois, já no período das chuvas, foram encontrados 212 micro ou nano plásticos para 37 animais, incluindo os nematódeos, microcrustáceos, protozoários e foraminíferos (minúsculos animais com conchas microscópicas).
Roupas sintéticas
As partículas plásticas em forma de filamento, originadas da lavagem de roupas sintéticas, foram as encontradas em maior volume nos arrecifes do Pina. De acordo com o relatório preliminar da pesquisa, “os fios de poliéster das roupas em lavagem se misturam com a água e esta é liberada no ambiente marinho, desta forma, este tipo de resíduo constitui cerca de 35% de todos os microplásticos primários dispersos no mar. As fibras de poliéster também estão presentes em roupas de banho, podendo se desprender com facilidade”.
De acordo com a professora Maria da Glória Cunha, os meses com maior incidência de plástico nas algas são os mais quentes, coincidindo com o aumento das atividades na praia e do incremento do turismo por causa do verão.
Agora, as pesquisadoras do Laboratório de Fitoplâncton prosseguem com estudos mais detalhados sobre o tamanho, formato, coloração e outros aspectos dos fragmentos encontrados microplásticos, além de analisar quais os impactos no ecossistema dos arrecifes.
As partículas de microplásticos são menores que 5 milímetros, enquanto aquelas classificadas como nanoplásticos são medidas em escala de micrômetros, ou seja, 10-3 milímetros.
Tais partículas são encontradas, principalmente, dentre outros itens, nos produtos de higiene e cosméticos usados no dia a dia, como em determinados cremes dentais, de barbear e esfoliantes. Por recomendação da Organização das Nações Unidas, alguns países já proíbem o uso dessas partículas na composição desses produtos.
Danos invisíveis
A pesquisa faz parte de um projeto maior que compõe a tese de doutorado da bióloga e mestre em oceanografia Nayana Buarque Antão da Silva, que se dedica a analisar várias espécies de macroalgas nas praias urbanas do Pina e Boa Viagem, além de Pedra de Xaréu e Enseada dos Corais, no litoral sul).
No Pina, a grande quantidade de microplásticos levou outra pesquisadora, Giulia de Andrade Lima Bertotti, a mudar o foco do trabalho, inicialmente destinado a analisar a “comunidade biológica” presente nas macroalgas.
“Imediatamente, percebi que havia partículas nas lâminas que não eram organismos vivos. E essas partículas estavam sempre presentes em grande quantidade.
Eram micro e nanoplásticos. Esses resultados são muito preocupantes, pois apontam para danos provocados pelos plásticos que não são visíveis a olho nu”, explica Giulia.
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