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A força da biodiversidade e da vontade de viver da Caatinga

Rodrigo Castro em conferência no Instituto Humanitas Unisinos – IHU (Fotos: Ricardo Machado/IHU)

O termo Caatinga vem do Tupi e significa algo como “mata” (caa) “branca” (tinga). Esse aspecto de mata seca, no entanto, não corresponde à realidade do bioma em toda sua complexidade, porque no período de chuvas a Caatinga é uma floresta verde e, além disso, rica em biodiversidade. “A Caatinga é a única floresta exclusivamente brasileira. Trata-se de uma floresta seca tropical, o que é inusitado, mas esta é a região semiárida do planeta com maior biodiversidade”, pontua Rodrigo Castro, pesquisador e coordenador-geral do Projeto de Conservação do Tatu-bola. “As árvores abortam suas folhas como um processo de adaptação climática, para resguardar as plantas da perda de água por transpiração, porque sem folhas transpiram menos e suportam melhor o período de seca”, explica.

“Tendo condições de se regenerar, sem caça, fogo e desmatamento, a Caatinga tem uma grande capacidade de regeneração. A restauração florestal se dá espontaneamente com a sucessão natural do meio ambiente”, reitera Castro, durante sua conferência Bioma Caatinga: biodiversidade, riquezas e fragilidades, que integra a programação do evento Os biomas brasileiros e a teia da vida, promovido pelo IHU. A conferência ocorreu na noite da quinta-feira, 25-5-2017, na sala Ignacio Ellacuría e Companheiros no IHU.

Teia da vida

Castro destaca que a relação evolutiva da espécie humana sempre foi muito arraigada à relação com as árvores e às florestas, mas que o Brasil é, atualmente, líder mundial negativo no que diz respeito à preservação das matas nativas. “O Brasil lidera o ranking dos países com maior perda de floresta nativa, segundo levantamento da FAO com dados de 2010 a 2015. A taxa de desmatamento do Cerrado é maior que a Amazônia, seguido da Caatinga”, descreve.

Por outro lado, mais da metade das floretas nativas sobreviventes em escala global estão nas regiões tropicais e subtropicais, da qual o Brasil faz parte. Entretanto, o ponto central é que estas regiões também são as mais frágeis economicamente. “A monocultura, principalmente as plantações de soja e milho, e a ocupação do território por meio do crescimento das cidades tem afetado a preservação ambiental. Some-se a isso o uso da lenha e o carvão vegetal para queima com vistas à produção energética, que tem gerado prejuízo grande à Caatinga”, sustenta o conferencista.

Rios voadores

A crise hídrica que atingiu fortemente a região sudeste a partir de 2014 está também relacionada aos poucos cuidados com as regiões interioranas do Brasil, onde estão as nascentes de água. Ainda há a questão do aquecimento global, que interfere no equilíbrio ambiental em sentido mais amplo, porque as florestas também são depósitos de carbono, que vão parar na atmosfera quando elas são queimadas.

“Quanto maior for o desmatamento da Amazônia mais erráticos serão os ciclos das chuvas. Avançarmos no desmatamento da Amazônia em nome da agricultura é um tiro no pé, porque sem chuva não há agricultura nem grãos para serem exportados e manterem a balança comercial brasileira”, frisa Castro. “Esses rios voadores viajam por até 4 mil quilômetros e precipitam grandes volumes de água o que é fundamental para várias regiões”, complementa.

Infográfico é uma reprodução da página riosvoadores.com.br

Quanto vale a floresta?

Engrossando o coro de outros conferencistas que participaram do ciclo de debates sobre os biomas brasileiros, Rodrigo Castro aposta na importância de se valorizar economicamente a sustentabilidade da Caatinga a partir da ideia da “floresta de pé”. “Atribuir valor à riqueza da biodiversidade da Caatinga encurta o caminho para a sustentabilidade. O que eu posso extrair da floresta manejando ela sem deflorestar?”, provoca. “A questão não é o lucro a curto prazo e a destruição, mas a construção de um valor agregado em médio e longo prazo”, propõe.

Nesse sentido, um dos caminhos que ele aponta é tentar mobilizar a sociedade e as comunidades que defendem seu sustento da preservação ambiental da Caatinga. “É necessário ampliar o conhecimento sobre os recursos florestais, o que consequentemente levará a uma justificativa econômica, porque considerando que estamos em uma economia de mercado, essa estratégia permitirá que tenhamos mais sucesso”, analisa.

Alternativas

Estas estratégias já estão sendo colocadas em prática em vários locais do nordeste brasileiro com a produção de mel, cooperativas de recolhimento e seleção de resíduos sólidos que antes iam para o meio ambiente, mutirão de construção de cisternas que custam menos de R$ 2 mil e garantem segurança hídrica para uma família de até cinco pessoas durante um ano. “Não precisa desmatar para plantar, há a possibilidade de fazer o uso da terra de forma consorciada e sustentável”, sublinha.

Outro mecanismo que parece ser importante para uma preservação sustentável social e ambientalmente é a criação de incentivos financeiros, por parte do Estado, para quem presta serviços ambientais. “Quem preserva a natureza precisa de uma equação matemática econômica para se sustentar. Muitos países já trabalham com isso e o Brasil está atrasado. Há dois programas no Brasil que tratam disso o Marco regulatório sobre Pagamento por Serviços Ambientais no Brasil e o programa Produtor de Água”, apresenta Castro.

Há também a alternativa das cotas reserva ambiental, mas que não existe de maneira efetiva no país. “As cotas de reserva ambiental permitem que um produtor que não tenha protegido sua cota de área conforme o Código Florestal possa pagar para que em outro terreno um outro proprietário mantenha preservado uma área equivalente a sua cota”, esclarece o palestrante.

Quando se fala em preservação e recuperação de áreas degradadas imagina-se um trabalho cujos frutos só serão colhidos em décadas. Todavia, na Caatinga se uma nascente seca, ela volta a brotar água quatro anos depois de ter sua região reflorestada. “O tatu bola só será salvo se protegermos as áreas onde eles vivem e é nestas áreas onde estão as nascentes que dão a segurança hídrica às pessoas que vivem nas grandes cidades”, reitera Castro. “Um futuro possível depende de nós e só de nós. Da nossa coragem e engajamento”, complementa.

Rodrigo Castro

Rodrigo Castro é graduado em Ciências Naturais pela Escola Politécnica Federal de Zurique, mestre em Estudos do Desenvolvimento pela National University of Ireland e doutorando em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal do Ceará. É coordenador-geral do Projeto de Conservação do Tatu-bola (Tolypeutes tricinctus).

Fonte – IHU de 25 de maio de 2017

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