Por Ellen Nemitz · ECO - 18 de dezembro de 2024 - Câmara ressuscitou “jabutis” da…
As sacolinhas e a ética do lixo em SP
Não foi apenas a Braskem. Quatro outros fabricantes de embalagens plásticas também fizeram contribuições ao diretório do PT durante campanha em que Fernando Haddad se elegeu prefeito de São Paulo. No total, as doações dessas empresas somaram R$ 437 mil. Além dessas empresas, apenas o Banco Safra integralizou doações à campanha paulistana por intermédio do diretório do Partido dos Trabalhadores.
A contrapartida veio rápido. No dia 5 de janeiro a Prefeitura de São Paulo atendeu ao lobby dos fabricantes de embalagens plásticas ao regulamentar a chamada Lei das Sacolinhas. O decreto foi feito com o objetivo de permitir algo que a norma legal proibia expressamente — a distribuição de sacolinhas pelo comércio varejista.
A lei 15.374/11, editada pelo prefeito Gilberto Kassab, simplesmente proibiu a distribuição de sacolas plásticas aos consumidores. Ao regulamentá-la, no entanto o atual prefeito transformou uma proibição expressa em uma autorização seletiva: “Consideram-se sacolas reutilizáveis (…) as sacolas para coleta seletiva de resíduos sólidos domiciliares secos que atendam às especificações a serem definidas pela Autoridade Municipal de Limpeza Urbana – AMLURB”.
E que sacolas seriam essas ?
As que a Braskem julgou serem as melhores para… Ela própria! Sacolas fabricadas com 51% de polietileno proveniente da cana-de-açucar e 49% de polietileno de petróleo. Que são absolutamente iguais àquelas que foram proibidas na gestão Kassab. E que agora retornam disfarçadas de embalagens ecológicas, quando não são. Que voltam reclassificadas como reutilizáveis, quando a única reutilização possível é o descarte do lixo. Ou seja: exatamente como eram as sacolinhas proibidas na gestão passada. Com a única diferença de que as sacolas de agora custam quase três vezes mais do que as anteriores — R$ 0,08 por unidade contra R$ 0,03 no passado.
E como se sabe que a Braskem foi quem definiu onde a população iria acomodar as compras de supermercado ?
Porque o projeto de criação das novas sacolinhas foi executado por uma ONG chamada Greening Innovative and Sustainable Solutions. E essa ONG ostentava em sua homepage na internet os logotipo da própria Braskem em sua galeria de patrocinadores. E também a logomarca de um selo de certificação criado pela Braskem para atestar que certos produtos desenvolvidos com sua matéria-prima se enquadram dentro de critérios de sustentabilidade ambiental que ela mesma estabelece. Dias atrás, os dois logotipos desapareceram da galeria de ‘sponsors’. Misteriosamente.
A Prefeitura alega que não há problema em ter recebido e encampado o modelo das sacolinhas proposto pela ONG da Braskem. Mas não explicou até agora como a entidade apareceu numa reunião dentro do gabinete do Secretário de Serviço, Simão Pedro, no dia 14 de novembro de 2014, um mês e meio antes da expedição do decreto que regulamentou a lei de Kassab. Também não explica por que trecho inteiros do decreto parecem ter sido escritos pela mega-corporação de química fina. Alega também que não há dinheiro da empresa na campanha que elegeu Haddad.
O que, aliás, não é verdade.
Na contabilidade direta do candidato realmente não há o registro de um único real da Braskem na campanha de 2012. Mas quando se verificam as doações feitas ao diretório municipal do PT, aí sim, aparece o dinheiro. Se você observar a tabela retirada do site do TSE (acima), vai perceber que:
– Houve cinco grandes financiadores nessa relação. Um deles é o Banco Safra, que fez doações por intermédio de três pessoas jurídicas diferentes (Safra Leasing, Safra Participações, Safra Seguro e Previdência e Banco Safra).
– Todos os demais financiadores pertencem à cadeia das sacolinhas: a própria Braskem, a ATP Indústria de Plásticos, a Plastquatro Indústria e Comércio de Plásticos e a Polien Embalagens Flexíveis. Juntas, elas doaram R$ 437 mil. Isso corresponde a pouco mais de um terço dos recursos arrecadados pelo diretório municipal do PT, que totalizaram R$ 1,187 milhão. Pelo caixa-um, é bom que se frise.
Não é difícil entender o interesse desse segmento na candidatura Haddad. Era natural que, acossados pela lei restritiva de Kassab, eles fossem buscar um ponto de entrada em outro candidato. Alguém mais dócil, menos hostil, capaz de assegurar sua sobrevivência num mercado bilionário em que cada brasileiro consome 59 sacolas por ano para levar as compras do supermercado até em casa. Difícil é entender a negativa da Prefeitura ao que parece óbvio: que ela sucumbiu ao lobby das sacolas. Porque parece óbvio demais.
Quem apresentou a Greening aos interessados no assunto foi o próprio secretário Simão Pedro, que ganhou a vaga no primeiro escalão porque coordenou a campanha de Haddd. Isso aconteceu no dia 14 de novembro. Quando os convidados chegaram para a reunião, foram apresentados à Greening pelo próprio Simão Pedro. E foi também o secretário que avisou: “Esses caras têm a solução para o problema”.
Com o representante da ONG estava não apenas o layout das novas sacolinhas. Havia também protótipos prontos, mocapes de sacolinhas exatamente como elas são hoje. Alguns dos presentes à reunião não entenderam de onde havia saído aquilo. Nem que proveito o município, o meio-ambiente e o munícipe/consumidor tirariam do ovo de Colombo apresentado por aqueles estranhos ao assunto.
O fato é que, um mês e meio depois, a cidade foi surpreendida por um decreto que em muito remete a conceitos que a própria Greening repete em seus ensaios. O discurso comercial da entidade acabou criando bordões que se transformaram em mantras da atual administração, ou em justificativas para o injustificável.
Até aqui, não parece haver nada de ilegal em toda essa transação. Mas há muitos problemas de natureza ética. A Prefeitura diz que não houve dinheiro público no negócio. Mas não se importou em impor ao consumidor paulistano um ônus de oito centavos por sacolinha para fazer suas compras. E ninguém explica como surgiu essa ONG na mesa presidida pelo secretário — e da qual faziam parte também o secretário de meio-ambiente e o então presidente da AMURB.
Fonte – Blog do Pannunzio de 15 de maio de 2015
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