Skip to content

Brasil vive extremos de calor em 2015

Além de Brasília, que em outubro teve temperaturas até 9 graus mais altas que a média, Manaus e Belo Horizonte bateram recordes neste ano, mostra Instituto Nacional de Meteorologia

Junte um El Niño que já está sendo chamado por aí de “Godzilla” e uma tendência discernível de aquecimento global e você ganha o que os moradores de Brasília ganharam neste mês de outubro: uma onda de calor com temperaturas até 9oC mais altas do que a média histórica.

A capital federal teve no sábado, 17 de outubro, seu dia mais quente desde que as medições começaram a ser feitas sistematicamente. As temperaturas na estação do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), que funciona desde 1963, atingiram 35,9oC. A média histórica para o mês – que costuma ser o mais quente do ano na cidade – é de 27,5oC. O recorde anterior havia sido batido em 2008, com 35,8oC.

As vendas de aparelhos de ar-condicionado dispararam. No sábado, não havia condicionadores de ar para pronta entrega em nenhuma das lojas de eletrodomésticos do Conjunto Nacional, um dos shopping centers mais tradicionais da cidade. E, justamente quando os brasilienses achavam que não podia ficar pior, o domingo, 18 de outubro, registrou 36,5oC, com termômetros de rua marcando 40oC ou mais. Brasília atingiu a marca de duas máximas recorde em dois dias seguidos.

As temperaturas mínimas – registradas na madrugada – também são as maiores para o mês desde o início da série histórica, embora não tenham batido o recorde, que ainda pertence à década passada.

“Você só pode considerar onda de calor um período de um certo número de dias com temperaturas 5oC ou mais acima da média máxima. E é isso o que estamos verificando”, afirmou Mamede Melo, meteorologista do Inmet.

O instituto está monitorando o fenômeno desde o começo de outubro, o que nos dá 21 dias de onda de calor (e contando). Mas o período quente e seco vem de antes: segundo o calendário “oficial” da meteorologia, a estação úmida em Brasília começa na segunda quinzena de setembro. Quando começarem a cair, o que está previsto para o dia 23 ou 24, as chuvas no DF estarão mais de um mês atrasadas. “E virão com tudo”, completa Ingrid Peixoto, colega de Melo no Inmet.

Bolha do inferno

Há várias explicações para o calorão. A mais imediata é o que os meteorologistas chamam de “bloqueio atmosférico”, uma massa de ar quente estacionada sobre uma determinada região e que não permite a entrada de frentes frias, que trazem umidade. Além de Brasília, partes de Goiás e Mato Grosso estão debaixo dessa bolha do inferno.

No mês passado, Cuiabá foi vitimada por uma onda de calor extremo. A capital mato-grossense teve 15 dias seguidos com máximas maiores ou iguais a 40oC, afirma Francisco de Assis Diniz, meteorologista do Inmet que vem compilando dados de extremos de temperatura no país. “Setembro deste ano está sendo considerado o mais quente no Brasil”, afirma.

Os bloqueios atmosféricos são favorecidos pelo El Niño, o aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico no litoral da América do Sul. O El Niño, um fenômeno cíclico e natural, perturba o padrão de ventos e enlouquece o clima no mundo inteiro: O oeste-sudeste dos Estados Unidos se acaba em chuvas, a Amazônia pega fogo e a região do Prata tem tempestades. A América do Sul, a Austrália, a Califórnia e a África veem os termômetros subir em anos de El Niño. O deste ano está sendo considerado especialmente forte, comparável ao de 1998.

O El Niño, por sua vez, não está fazendo suas travessuras sozinho. “Este El Niño aparece sob um ruído de fundo de aquecimento global”, afirma o climatologista José Marengo, do Cemaden (Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais). “Ainda que este El Niño seja um pouco mais quente que o normal se compararmos a 1998, a [temperatura] normal em 1998 era menor que em 2015.”

Ninguém está a salvo

“O planeta está passando por um período quente, e esse aquecimento tem provocado ondas de calor com muito mais frequência. O Brasil, devido à sua dimensão territorial, não esta fora desse contexto”, afirmou Assis Diniz.

Segundo o pesquisador, essa situação tem sido mais evidente desde o começo do século. Todos os 15 anos mais quentes da história no planeta foram registrados a partir do ano 2000. A exceção é justamente 1998, por causa do El Niño. Até agora, 2014 foi o ano mais quente da história, mas deverá ser desbancado por 2015.

Durante o século 21, continua Assis, em vários locais no Brasil, das regiões Centro-Oeste, Sudeste e parte da Norte, têm ocorrido recordes de temperaturas de 50 anos, 70 anos a 100 anos, de acordo
com a série histórica das medições de cada estação do Inmet.

Dados das séries históricas apresentados por Diniz recentemente em São Paulo dão uma dimensão do calor, com os recordes registrados em algumas cidades brasileiras – vários deles batidos em 2015:

Manaus: 38,2oC (1982), 38,3oC (2010), 38,6oC (2015), 39oC (2015)
Cuiabá: 42,3oC (2010)
Brasília: 35,8oC (2008), 35,8oC (2015), 36,4oC (2015)
Goiânia: 39,6oC (2014),
Goiás (GO): 42,5oC (2015)
Palmas: 41,9oC (2013)
Belo Horizonte: 37,1oC (2012), 37,4oC (2015)
Rondonópolis (MT): 42,3oC (2014)
Indaial (SC): 41,2o C (2014)
Vitória: 39,6oC (2006)
Os gráficos de temperaturas máximas extremas em Brasília e em Manaus, duas das cidades que quebraram seus recordes neste ano, também indicam uma tendência a aquecimento.

“De 1960 até 1988, tivemos no país três invernos quentes. De 1988 a 2015 foram 12. É uma relação de 4 para 1”, afirmou o meteorologista do Inmet – que, no entanto, mostrou-se cauteloso ao conjecturar sobre o futuro dessa tendência.

Quanto mais quente, mais pobre

E o calor extremo não faz mal apenas para a saúde de quem está mergulhado nele. Um estudo publicado nesta quarta-feira no periódico científico Nature mostra que calor demais também faz mal ao PIB.

Um grupo de pesquisadores liderado pelo economista Marshall Burke, da Universidade Stanford (EUA), mostrou que o capitalismo tem uma temperatura ideal de funcionamento: 13oC de média anual. A produtividade dos trabalhadores e da agricultura cai quando as temperaturas médias ficam muito abaixo disso, mas despenca quando elas sobem demais além dessa média.

Numa comparação feita com 166 países, inclusive o Brasil, com dados desde 1960, Burke e colegas mostraram que o declínio é não-linear, ou seja, a produtividade despenca a altas temperaturas. “Essa relação é generalizável para o globo, inalterada desde 1960 e aparente em atividades ligadas ou não à agricultura, em países ricos e pobres”, escreveram os cientistas.

No caso de um aquecimento global desenfreado, no pior cenário do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática), o PIB mundial sofreria uma redução de 23%. Nada menos que 77% dos países teriam perdas, com o mundo tropical liderando a marcha para o abismo por ser mais quente – e, no geral, mais pobre – já hoje, mas com problemas grandes também para países ricos relativamente quentes, como EUA e China.

“Se as sociedades continuarem a funcionar como funcionaram no passado, a mudança climática deve reformatar a economia mundial ao reduzir substancialmente a produção e possivelmente amplificar desigualdades econômicas globais já existentes”, escreveram os autores.

Fonte – Claudio Angelo, Observatório do Clima de 21 de outubro de 2015

Este Post tem 0 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Back To Top