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Como as Soluções Baseadas na Natureza podem tornar as cidades mais sustentáveis e resilientes ao clima

Por Vanessa Barbosa, – Um Só Planeta – 3 de junho de 2022 – Conheça intervenções inspiradas nos processos e funcionamento da natureza que estão ajudando cidades globais a enfrentar alguns dos maiores desafios contemporâneos – Foto: Sutthipong Kongtrakool/GettYImages

Construir parques lineares na margem de córregos e rios para minimizar os impactos de enchentes e aumentar a cobertura de árvores e vegetação para reduzir as ilhas de calor são exemplos do pacote de soluções de “infraestruturas verdes” capazes de adaptar os acinzentados centros urbanos aos riscos de um mundo em aquecimento.

Essas intervenções fazem parte das chamadas Soluções Baseadas na Natureza – ou simplesmente SBNs.

Cunhado pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), o termo carrega um leque de medidas simples e econômicas que beneficiam a sociedade, o ambiente e a biodiversidade.

Investir na restauração e conservação de ecossistemas, em serviços de adaptação climática, e no gerenciamento de recursos naturais, entre outras soluções, ajuda a fortalecer a natureza e preparar nossas cidades para enfrentar desafios ambientais e socioeconômicos contemporâneos.

Não à toa, as SBNs fazem parte de um debate que vem ganhando força no mundo em um momento de discussões sobre a urgência de uma recuperação econômica sustentável pós-pandemia e do papel das cidades na luta contra as mudanças climáticasredução de desigualdades.

Concentrando mais da metade da população mundial, os centros urbanos emitem mais de 70% dos gases de efeito estufa globais, pelos cálculos da ONU, e enfrentam riscos que vão desde a elevação do nível do mar até ondas de calor e enchentes mortais.

Felizmente, se bem planejadas, as cidades apresentam oportunidades únicas para reduzir o impacto ambiental da humanidade e atender às necessidades da sociedades de forma mais eficiente.

É possível mudar a rota. “A natureza pode ser a espinha dorsal do desenvolvimento urbano.

Ao reconhecer as cidades como sistemas vivos, podemos apoiar condições melhores para a saúde das pessoas, do planeta e da economia nas áreas urbanas”, acrescentou. Conheça a seguir alguns exemplos do potencial de aplicação de SBNs em curso no mundo.

Mais verde, menos cheias

Centros urbanos são particularmente propensos a inundações por chuvas fortes e volumosas, que têm se tornado mais constante com as mudanças climáticas.

As superfícies impermeáveis das cidades, como o concreto e asfalto, fazem com que a água escorra e se acumule em áreas baixas, afetando moradias, serviços públicos e no extremo, deixando vítimas fatais.

Singapura: revegetação das margens dos ruis fazem parte do pacote de SBNs. — Foto: Calvin Chan Wai Meng/GettyImages

Singapura: revegetação das margens dos ruis fazem parte do pacote de SBNs. — Foto: Calvin Chan Wai Meng/GettyImages

Atento ao problema, o governo de Singapura criou um programa de “renaturalização” de sua extensa rede de canais, drenos, rios e lagoas que ajudam a reduzir os riscos de inundação.

Batizado de Active, Beautiful, Clean Waters (ABC Waters), o projeto busca, como o nome sugere, garantir um fluxo de águas bonitas, limpas e ativas no cosmopolita centro urbano.

Desde que foi lançado, há 15 anos, o programa reduziu a área propensa a inundações de 3.200 hectares para 32 hectares, economizou cerca de U$ 390 milhões em custos de tratamento de água anualmente e incentivou a iniciativa privada a “adotar” soluções nos cursos hídricos do país.

Atualmente, o ABC Waters conta com mais de 300 parceiros institucionais ativos.

Além do benefício ecológico e econômico, os espaços vegetados tornaram-se um atrativo para a vida selvagem e para atividades de lazer da população, gerando bem-estar.

Vista aérea do Jardim Botânico de Singapura e a cobertura vegetal margeando os rios. — Foto: Sérgio Sala/Unplash

Vista aérea do Jardim Botânico de Singapura e a cobertura vegetal margeando os rios. — Foto: Sérgio Sala/Unplash

Combinando soluções

Em 2019, as cidades costeiras de Moçambique sofreram com a passagem do ciclone Idai, um dos mais fortes e mortais já registrados no continente africano. Investir na construção de resiliência ganhou, então, os holofotes em algumas localidades.

É o caso da litorânea Beira, quarta maior cidade do país, que tem apostado num mix de soluções para enfrentar o clima revolto.

Por meio do Projeto Cidades e Mudanças Climáticas (3CP, em inglês), financiado pelo Banco Mundial, a cidade combina abordagens verdes inovadoras e obras convencionais de engenharia (infraestrutura cinza) para proteger os moradores e bens dos riscos climáticos, ao mesmo tempo que melhora os ecossistemas e serviços essenciais, como acesso à água e saneamento.

A lista inclui desde melhoramentos e extensões de sistemas de drenagem inadequados, bem como soluções baseadas na natureza que se concentram no restabelecimento da capacidade do Rio Chiveve para mitigar as cheias na Beira.

O rio, que atravessa o centro da cidade conectando o porto até os bairros de baixa renda no sudeste, possuía manguezais e vegetação nativa severamente degradados e sufocados por lixo e dejetos orgânicos.

As intervenções verdes transformaram o rio e a área circundante em um parque urbano vegetado que, além de melhorar a resiliência ao absorver e reduzir o nível das águas das inundações trazidas pelo aumento dos eventos climáticos, serve de espaço recreativo, afetando positivamente a vida de cerca de cerca de 230 mil moçambicanos.

O governo estuda agora como adotar intervenções semelhantes em outras cidades costeiras da região.

Novas atividades: melhora no entorno do rio, antes poluído e degradado, abriu espaço para áreas recreativas. — Foto: WorldBank/Divulgação

Novas atividades: melhora no entorno do rio, antes poluído e degradado, abriu espaço para áreas recreativas. — Foto: WorldBank/Divulgação

Telhados ecológicos

A instalação de telhados verdes em edifícios também é uma forma de ajudar a mitigar os efeitos do clima instável nas cidades.

Os benefícios são múltiplos: eles ajudam a filtrar água da chuva para reuso, promovem eficiência energética por funcionarem como isolantes térmicos e melhoram a qualidade do ar.

De quebra, esses espaços podem servir à prática de agricultura urbana, reduzindo a distância entre os alimentos e o consumidor final.

Os famosos telhados verdes da cidade de Munique, na Alemanha, são um exemplo da incorporação de práticas sustentáveis no plano diretor: são mais de três quilômetros quadrados de área construída, quase metade da área total de telhados verdes no país.

Em Barcelona, na Espanha, a prefeitura já ofereceu subsídios de 75% no custo de novos telhados verdes, criando loteamentos urbanos e espaço para geração de energia renovável.

Telhados verdes na Alemanha: solução que mitiga efeitos da chuva e melhora o clima local. — Foto: Geogif/GettyImages

Telhados verdes na Alemanha: solução que mitiga efeitos da chuva e melhora o clima local. — Foto: Geogif/GettyImages

A demanda pelos serviços ecossistêmicos que os telhados verdes podem fornecer é particularmente alta em bairros residenciais densos e áreas mais industriais, segundo pesquisa recente.

Em cidades que sofrem com ilhas de calor, os telhados verdes podem ser um coringa, pois suas temperaturas são em média de 16 a 22°C mais baixas do que os telhados convencionais e podem reduzir a temperatura em mais de 2°C nas cidades, estima a agência ambiental americana, EPA.

Pacto para esverdear as cidades

Entre as soluções baseadas na natureza mais populares está o plantio de árvores.

Nos centros urbanos, a paisagem vegetada entrega muita mais do que um efeito embelezador: são uma ferramenta poderosa para filtrar o ar poluído, ajudar no escoamento da água da chuva e melhorar o microclima local.

Atentos à série de benefícios, 31 grandes centros, incluindo Londres, Milão, Bogotá e Rio de Janeiro, assinaram no ano passado uma declaração da C40, rede de cidades comprometidas com a luta contra a crise climática, prometendo investir em espaços verdes para combater os efeitos do aquecimento global.

A meta é ter 30-40% da superfície urbana construída consistindo de espaços verdes até o ano de 2030, como parques e ruas arborizadas, ou espaços permeáveis para absorver a água e evitar inundações.

Há ainda um ganho extra nisso tudo: mais saúde mental. Cada vez mais, a literatura científica tem mostrado como os espaços verdes combatem quadros depressivos e comportamentos agressivos, contribuindo para a sensação de bem-estar da população.

Em tempos de alerta vermelho frente ao aumento dos problemas de saúde mental em todo o mundo, que incluem novos diagnósticos como a “ecoansiedade”, investir na natureza pode pavimentar o caminho para cidades mais seguras, resilientes e saudáveis no futuro.

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