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Consumo consciente

O elevado grau de degradação do ambiente natural e suas inúmeras consequências negativas para a sociedade, a escassez de energia, água potável e outros recursos, a onda de informações a respeito das potenciais consequências das mudanças climáticas para o bem-estar humano e as constantes discussões sobre desenvolvimento sustentável têm colocado em xeque a sociedade de consumo e do desperdício. A palavra de ordem tem sido a redução do consumo energético, de água e de outros recursos naturais, além da redução da geração de resíduos. A reutilização e a reciclagem de materiais têm estado na pauta do dia da sociedade. Essas ações têm sido traduzidas nas campanhas publicitárias do “consumo consciente” realizadas tanto pelo setor público quanto pelo setor privado.

Parece que a sociedade está acordando para o fato de que a quantidade de matéria e energia necessárias para a realização da produção de bens e serviços é finita. Essa nova realidade já tem sido apresentada pelos relatórios do World Wildlife Fund (WWF) sobre a Pegada Ecológica Global desde a década de 1970, os quais indicam que a sociedade tem consumido recursos naturais acima da capacidade de provimento natural pelo ecossistema global. Significa que estamos usando a reserva de recursos naturais para manter ou expandir nosso padrão de consumo. Vale recordar que temos apenas os recursos naturais disponíveis neste planeta, não existe outra fonte conhecida. Desse modo, a redução do consumo de bens e serviços econômicos e a redução na geração de resíduos se tornam fundamentais neste século.

Realmente precisamos reduzir o consumo e o desperdício de recursos naturais. Não existe mais a possibilidade de atrasar essa decisão, porque os custos para a sociedade têm sido crescentes. Contudo, você sabe quais os impactos do “consumo consciente” para a sociedade? Quais os efeitos sociais e econômicos da redução do consumo? Será que alguém tem refletido sobre as consequências para a sociedade da redução do consumo em uma economia capitalista? Como os modelos econômicos e políticos têm incorporado essa nova realidade?

A redução do consumo ou o consumo consciente afeta diretamente a atividade econômica, por exemplo reduzindo o nível de produção. Isso mesmo: reduzir o consumo reduz a produção. Por conseguinte, afetará negativamente o nível de emprego e renda da sociedade. O resultado final pode ser uma redução do crescimento econômico, e até mesmo do Produto Interno Bruto (PIB), fenômeno conhecido como recessão. Por exemplo, uma pessoa que troque seu celular a cada seis meses consumirá, em um ano, dois celulares. Agora, se essa pessoa aderir à onda do consumo consciente, trocando seu celular a cada dois anos, deixará de consumir três celulares neste período; resultado: as empresas terão uma queda de 75% nas vendas. Veja o exemplo de São Paulo, onde o governo estadual e a Sabesp estimularam a redução do consumo de água e o desperdício, oferecendo bônus aos consumidores conscientes. Contudo, alcançado o objetivo, a Sabesp precisou aumentar a tarifa porque o resultado para a campanha foi uma redução no faturamento, o que afetou o seu equilíbrio financeiro.

Parcela da sociedade tratará os resultados dos exemplos como algo anormal do ponto de vista econômico. A solução proposta pelos economistas e outros tomadores de decisão será a retomada das vendas, o estímulo ao consumo. Nesse sentido, existe algo mais contraditório hoje na sociedade do que estimular o consumo diante da eminente escassez de recursos naturais? Mas o consumo consciente não é reduzir o consumo? Essa situação mostra como não estamos preparados para o século 21, porque ainda usamos instrumentos inadequados para a nova realidade, caracterizada pela escassez de recursos naturais. Precisamos repensar o nosso sistema socioeconômico para essa nova realidade. A sociedade está preparada para enfrentar os desafios postos pelo desenvolvimento sustentável? Melhor: a sociedade realmente quer enfrentar esses desafios?

Junior Ruiz Garcia, doutor em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente pelo Instituto de Economia da Unicamp, é professor do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Econômico do Departamento de Economia da UFPR.

Fontes – Gazeta do Povo / EcoDebate de 05 de agosto de 2015

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