Por Ellen Nemitz · ECO - 18 de dezembro de 2024 - Câmara ressuscitou “jabutis” da…
Contra lei, 98 municípios do Paraná mantêm lixões ou aterros irregulares
Descartável: prazo para o fim dos lixões a céu aberto está vencido desde 2014
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Política Nacional dos Resíduos Sólidos determinou que prefeituras mandassem lixo para aterros sanitários até 2014. Três anos depois, porém, situação ainda está longe do ideal.
Noventa e oito municípios do Paraná ainda enviam lixo para locais irregulares e, com isso, descuprem a lei federal da Política Nacional dos Resíduos Sólidos, sancionada em 2010, conforme dados do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) obtidos com exclusividade pelo G1.
O conjunto de normas determinou que todas as prefeituras integrassem à política municipal um plano de gerenciamento de resíduos sólidos até 2012 e extinguissem lixões ou aterros inadequados até 2014. Três anos depois, porém, ainda falta muito a percorrer para resolver o problema.
“A gestão de resíduos é de responsabilidade dos municípios. Eles devem ter um planejamento de coleta e destinação: quem vai coletar, como vai ser feita a coleta, a separação dos recicláveis, tudo isso cabe à prefeitura. O grande objetivo é a erradicação dos lixões. Já temos uma situação bem melhor, mas para chegar no ‘lixão zero’ falta um pedaço”, afirma Ivonete Coelho da Silva Chaves, diretora de Monitoramento Ambiental e Controle da Poluição do IAP.
Entre as 399 cidades do estado, 24 mantêm lixões municipais — lugares abertos, sem controle ambiental, onde pessoas têm livre acesso para entrar e cavoucar o que os outros jogam fora sem cuidado sanitário algum. Para especialistas, é o pior cenário ambiental e social quando se fala em resíduos.
“Os lixões são muitas vezes mal operados. O que isso pode trazer? Doenças, pessoas que se dispõem do lixo pra alimentação. Isso tem que ser erradicado. Outra questão é a do chorume, que vai atingir corpos hídricos e o próprio solo. Se não for adequado, vai atingir corpos de água subterrâneos, onde muitas vezes há depósitos que as pessoas usam para abastecimento”, explica Ivonete.
Municípios devem enviar o lixo para aterros sanitários, como o de Fazenda Rio Grande, na região de Curitiba (Foto: Weliton Martins/RPC)
Outros 74 municípios paranaenses têm aterros controlados, sem a gestão adequada — muitos deles são apenas lixões com acesso restrito, segundo o IAP. Os 301 restantes, por consequência, levam seus resíduos a aterros sanitários que seguem as normas estipuladas pela Polícia Nacional.
Aos inadequados, cabe ao Ministério Público e aos órgãos de fiscalização do estado, como o próprio IAP, cobrarem providências e estipularem metas e prazos às prefeituras, segundo o Ministério do Meio Ambiente. Se o acordo não for cumprido, o município sofre punições, como a aplicação de multas ou o embargo de recursos.
“É fundamental que os municípios cumpram a Legislação, mas é necessário dar estrutura. Muitos deles não têm recursos para fazer o que a Política Nacional determina. Portanto, eu nem falo em multar os municípios, em embargar. O ideal seria o órgão ambiental ou o Ministério Público constituir grupos de trabalhos para, de forma cooperada, ver qual a previsão, qual seria a possibilidade e, aos poucos, implementar esses aterros sanitários”, diz o professor e advogado Alessandro Panasolo, especialista em direito ambiental.
Para o especialista, prefeituras pequenas, com menos de 20 mil habitantes, deveriam se unir no uso de um mesmo aterro. “No caso dos municípios pequenos, uma saída é fazer consórcio. Não tem necessidade de cada município ter seu aterro sanitário. Dois, três, quatro municípios podem constituir consórcios e dividir seus custos”, sugere o professor.
Projeto quer esticar o prazo
Um projeto de lei elaborado pela Subcomissão Temporária de Resíduos Sólidos do Senado, em 2014, tenta a prorrogação do prazo aos municípios para a erradicação dos lixões. A ideia é colocar datas limites de forma escalonada, levando em conta o tamanho da população.
Veja as escalas e os prazos propostos:
- Capitais e municípios de regiões metropolitanas, até 31 de julho de 2018
- Municípios de fronteira ou com mais de 100 mil habitantes, até 31 de julho de 2019
- Municípios com 50 a 100 mil habitantes, até 31 de julho de 2020
- Municípios com menos de 50 mil habitantes, até 31 de julho de 2021
Em 2015, o Senado aprovou o projeto e enviou à Câmara dos Deputados, onde está parado na Mesa Diretora desde o parecer do relator, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSC-RJ), em novembro de 2015.
Requerimentos das deputadas Gorete Pereira (PR-CE) e Conceição Sampaio (PP-AM), em 2016 e 2017, respectivamente, tentaram levar a discussão a plenário, mas foram indeferidos pela própria Mesa Diretora.
No site da Câmara, a informação é de que, atualmente, o projeto aguarda a criação de uma comissão temporária pela Mesa para seguir adiante. O G1 não conseguiu contato com os deputados responsáveis pelo andamento do processo até a publicação desta reportagem.
Vila Santa Maria, em Paranaguá, se desenvolveu no entorno de um lixão (Foto: Weliton Martins/RPC)
Logística reversa
A Política Nacional dos Resíduos Sólidos também instituiu a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos e a logística reversa. Conforme o regulamento, fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes que colocam produtos no mercado têm o dever de retirá-los de circulação.
“A logística reversa é uma questão que está no início. Para funcionar, tem que ter fiscalização. Exemplo: uma lata de condimento, tempero, você sabe que quem produz não é do Paraná, é de outro estado. Como nós vamos autuar o produtor se não é do Paraná? Então, a devolução das embalagens que tem que ser tratada a nível nacional. Se a gente quer reduzir nosso volume de resíduos e resolver o problema dos aterros, a logística reversa é um grande passo”, comenta a diretora de Monitoramento Ambiental e Controle da Poluição do IAP.
Segundo Saint-Clair Honorato Santos, procurador do Núcleo de Meio Ambiente do Ministério Público do Paraná (MP-PR), o trabalho que as empresas teriam que fazer sobra para os municípios, que deveriam ser pagos por isso.
Responsabilidade da retirada do lixo é, em grande parte, das empresas que o produzem (Foto: Weliton Martins/RPC)
“A nossa logística reversa não está funcionando adequadamente. Como as empresas são as grandes colocadoras desse material, quando vendem os seus produtos, também têm que participar do modelo, o que não tem acontecido. Nós entendemos que as empresas devem ressarcir os municípios pela coleta, já que não retiram tudo que colocam no mercado”, sugere o procurador.
Dinheiro no lixo
Cada paranaense produz em média 1 quilo de lixo por dia, de acordo com o IAP. Levando em conta a população de 11 milhões de habitantes, conforme o Censo, o estado fecha o mês com 11 mil toneladas de resíduos para tratar, o que gera um alto custo.
Em Curitiba, por exemplo, o lixo custa perto de R$ 19 milhões por mês aos cofres públicos, estima o Ministério Público. Como o valor é diluído nos impostos, muitas vezes deixa o bolso dos cidadãos de forma imperceptível.
“É uma conta alta. Como vem diluída no imposto, as pessoas não sabem que esse valor é tão alto. Certamente, se soubessem que o valor é esse, iríamos começar a discutir melhor o modelo para saber se podemos aperfeiçoá-lo, como devemos, se estamos gastando o que é certo ou se esse preço é irrisório. Essas contas têm que aparecer bem decompostas para que o cidadão possa analisar”, recomenda Saint-Clair.
Procurador diz que a participação direta dos moradores no ciclo do lixo é o melhor caminho (Foto: Weliton Martins/RPC)
Para o procurador, o caminho para melhorar o modelo de gestão de resíduos é justamente envolver diretamente o cidadão no ciclo do lixo. Uma das ideias é a de instalar “estações de sustentabilidade”, um modelo europeu em que o próprio cidadão leva os resíduos que produz em contêineres instalados nas esquinas de casa.
“Nós podemos fazer um modelo em que o cidadão colabore mais na coleta. São as estações de sustentabilidade, onde o próprio cidadão pode ir lá levar os seus recicláveis ou aquilo que ele tira de casa, como um fogão, uma geladeira. Ele pode levar a contêineres, onde você vai depositando e não cria problemas para frente. Se houver essa separação adequada, já no primeiro momento, tudo vai melhorar, porque, quanto mais você mistura o lixo, mais problemas você cria”, diz Saint-Clair.
O que diz o governo federal
O Ministério do Meio Ambiente afirma que está realizando avaliações sobre os avanços da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) nos municípios brasileiros, “sobretudo acerca da disposição final/destinação ambientalmente adequada de rejeitos/resíduos, identificando os principais desafios e propondo prioridades para o país”.
Contudo, o governo relata uma dificuldade constitucional para que os órgãos responsáveis fiscalizem as prefeituras.
Governo federal relata dificuldade na fiscalização de municípios (Foto: Gesli Franco/RPC)
“A situação fica um pouco mais difícil do ponto de vista constitucional quando uma lei não pode obrigar outro ente federado a cumprir um prazo, quando este implica em gastos financeiros. Também há o aspecto político, quando o não cumprimento ocorre por parte de um órgão público, como é o caso de uma administração municipal, quem seria o outro órgão público que autuaria a prefeitura e fecharia o lixão?”, questionou a pasta, em nota.
O governo federal ressaltou que, para erradicar os lixões, tem dado apoio à elaboração dos Planos de Resíduos Sólidos, ao fortalecimento dos Consórcios Públicos, à negociação dos acordos setoriais da logística reversa e na coordenação do Plano Nacional de Resíduos Sólidos e Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (SINIR).
Além disso, também disse que envia aos municípios recursos financeiros para a construção de aterros por meio do Ministério das Cidades e da Fundação Nacional de Saúde.
Lixo é despejado em local inapropriado em Mandaguaçu, no norte do estado (Foto: Ederson Hising/G1)
Série especial – Desta segunda (31) até a sexta-feira (4), G1 e Bom Dia Paraná exibem uma série de reportagens sobre os problemas do lixo no estado. Os principais temas abordados são o contexto estadual de gestão de resíduos, os modelos de destinação, as doenças causadas, a situação de quem sobrevive do lixo e os possíveis caminhos para resolução dos problemas.
Fonte – Erick Gimenes, G1 PR de 31 de julho de 2017
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