Por Elton Alisson - Agência FAPESP - 19 de abril de 2024 - Cerca de 90% da…
EUA e China: os dois países com os maiores déficits ambientais
“A inteligência voltada para o mal é pior do que a burrice”
Hélio Pellegrino
Os Estados Unidos da América (EUA) e a China são as duas maiores economias globais e os dois países com maior impacto negativo sobre o meio ambiente do mundo. Ambos possuem aproximadamente a mesma extensão territorial. Mas os EUA, com apenas 4,5% da população mundial, possuem alto padrão de consumo, enquanto a China, com gigantescos 20% da população mundial, possui um padrão médio, mas crescente de consumo. Estes dois países (assim como a média mundial) estão vivendo em déficit ambiental.
A Pegada Ecológica mundial ultrapassou a biocapacidade do Planeta no início da década de 1970. De lá para cá o déficit ambiental vem subindo a cada ano. Em 2012, o mundo tinha uma população 7,1 bilhões de pessoas, com uma pegada ecológica per capita de 2,84 hectares globais (gha) e uma biocapacidade per capita de 1,73 gha, conforme anunciou a Global Footprint Network, em março de 2016.
A Footprint Network apresenta estas duas medidas que são muito úteis para se avaliar o impacto humano sobre o meio ambiente e a disponibilidade de “capital natural” do mundo. A Pegada Ecológica serve para avaliar o impacto que o ser humano exerce sobre a biosfera. A Biocapacidade avalia o montante de terra e água, biologicamente produtivo, para prover bens e serviços do ecossistema à demanda humana por consumo, sendo equivalente à capacidade regenerativa da natureza. A unidade de medida é o hectare global (gha).
O mundo tinha em 2012 uma biocapacidade total de 12,2 bilhões de hectares globais, mas tinha uma pegada ecológica de 20,1 bilhões de hectares globais. Portanto, a pegada ecológica ultrapassava a biocapacidade em 64%. Ou dito de outra maneira, o mundo estava consumindo o equivalente a 1,64 planeta. Portanto, a população mundial vive no vermelho e provoca um déficit ambiental que cresce continuamente.
Em 2012, os EUA tinham uma população de 318 milhões de habitantes, uma Pegada Ecológica per capita de 8,2 gha e biocapacidade per capita de 3,8 gha. A Pegada total era de 2.609,9 bilhões de gha para uma biocapacidade total de 1.193,8 bilhões de gha. A Pegada estava 2,2 vezes maior que a biocapacidade, ou um déficit de 120%. O modelo americano é insustentável e só sobrevive com o apoio do resto do mundo.
Mas o caso chinês é ainda pior. Em 2012, a China tinha uma população de 1,4 bilhão de habitantes, uma Pegada Ecológica per capita de 3,4 gha e biocapacidade per capita de 0,9 gha. A Pegada total era de 4.759,1 bilhões de gha para uma biocapacidade total de 1.323,5 gha. A Pegada estava 3,6 vezes maior que a biocapacidade, ou um déficit de 260%. O déficit ambiental da China cresce mais rápido do que o déficit americano.
As florestas nestes países regrediram na medida em que avançava a Pegada Ecológica. Segundo dados do Banco Mundial, que mede a área com floresta preservada como a parcela territorial ocupada por florestas nativas ou plantadas com árvores de pelo menos 5 metros, seja árvore produtiva ou não, o Brasil tinha uma cobertura de 61% em 2011 e o mundo de 31%. Os Estados Unidos possuíam 33,28% de cobertura florestal em 2011 e a China somente 22,47%.
Estes dois países são péssimos exemplos de como lidar com o meio ambiente e uma prova de que países com grande população e grande consumo são prejudiciais à natureza. Na comparação, um tem a terceira população mundial e grande consumo per capita, enquanto o outro tem padrão de consumo “médio”, mas uma população imensa. O resultado final é o mesmo: grandes déficits ambientais.
Em 2013, o déficit global passou para 68%. Os Estados Unidos tinham uma Pegada Ecológica total de 2,7 bilhões de gha, para uma Biocapacidade total de 1,2 bilhão de gha. Um déficit de 1,5 bilhão de gha. Também em 2013, a China tinha uma Pegada Ecológica total de 5 bilhões de gha, para uma Biocapacidade total de 1,3 bilhão de gha. Um déficit de 3,7 bilhões de gha. Portanto, o déficit da China é mais de duas vezes o déficit ambiental dos Estados Unidos.
A China emite 12,5 bilhões de toneladas de CO2 e os EUA 6,3 bilhões de toneladas. A China – mesmo sendo o maior poluidor do mundo – está investindo pesado na mudança da matriz energética e busca reduzir a emissão de GEE, mesmo porque a qualidade do ar das suas principais cidades está se tornando inviável para a saúde humana e não-humana.
Mas diante desse grave quadro, o absurdo veio com a atitude inconsequente de Donald Trump de romper com o Acordo de Paris e se negar a pagar a dívida ambiental dos EUA com o resto do mundo. Trump recusou até mesmo a ajuda para os países pobres mitigarem as consequências do aquecimento global. Embora muitas empresas, cidades e Estados tenham intenção de cumprir as metas de descarbonização, o Governo Federal dos EUA estão se isolando do mundo e buscando reforçar o seu modelo insustentável de desenvolvimento. Como disse Elon Musk (da Tesla e SpaceX): “Mudanças climáticas são reais. Deixar o Acordo de Paris não é bom para a América ou para o mundo”.
O Acordo de Paris é apenas uma pequena ação para evitar o colapso ambiental. A verdadeira solução passa por uma mudança geral no modelo de produção e consumo dos dois países e do mundo. Manter o crescimento econômico, a extração de matérias-primas, emissão de carbono e a geração de imensas quantidades de lixo é o mesmo que caminhar para o precipício.
É preciso dar um “cavalo-de-pau” na economia mundial. Trocar o vício do crescimento por um decrescimento saudável e próspero. Será preciso diminuir o tamanho da população, diminuir o nível de consumo e principalmente, reduzir as emissões de gases de efeito estufa para descarbonizar a economia e interromper o aquecimento global, redirecionando o rumo do (des)envolvimento para um modelo de vida mais simples e mais harmonioso com a natureza.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal.
Fonte – EcoDebate de 09 de junho de 2017
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