Entrevista concedida pela FUNVERDE para a revista HM! sobre as malditas sacolas plásticas de uso…
EUA tentam driblar testes de transgênicos
O PHD Michael Hansen, cientista sênior da maior organização de consumidores do mundo, afirma a Galileu que EUA e multinacionais do setor não querem testar efeito de transgênicos à saúde
Parece uma inocente espiga de milho. O que você não sabe é que genes de outras espécies foram inseridos no DNA dela. Não houve avaliação se o procedimento quebrou uma sequência genética importante – ou pior, se criou uma série de genes cancerígena. Por que você não sabe? Porque algumas multinacionais não permitem testes mais longos antes de a espiga chegar ao seu prato. É isso o que conta Michael Hansen, PhD em impactos da biotecnologia na agricultura e cientista sênior da maior organização de consumidores do mundo, a Consumers Union dos Estados Unidos. O estudioso virá ao Brasil em 26 de abril para participar da conferência Segurança dos Alimentos: o que o mundo está discutindo a respeito dos transgênicos e agrotóxicos. Nesta entrevista exclusiva, ele discute o perigo pelo qual, segundo ele, estamos passando.
Estamos aderindo aos transgênicos de maneira responsável?
Nos Estados Unidos, a resposta é absolutamente não. Aqui nós não exigimos testes de segurança antes que estes produtos entrem no mercado e sejam exportados. Existem acordos internacionais que aconselham os países a fazer isso, mas nos Estados Unidos estamos ignorando os potenciais problemas à saúde humana.
O Brasil está sendo mais exigente?
O Brasil permitiu que essas safras [de transgênicos] entrassem no mercado e os mesmos problemas se aplicam. Acredito que haja um problema com a soja, inclusive problemas ambientais, e entendo que a maioria dos dados usados no Brasil para aprovar a comercialização de soja transgênica foram obtidos em pesquisas feitas nos EUA. E também foi descoberto que os produtos químicos que são jogados na plantação de soja para matar ervas daninhas, com o tempo vão fazendo com que essas ervas daninhas se tornem resistentes. Isso já é um problema aqui nos Estados Unidos e logo será no Brasil.
Mutações acontecem o tempo todo na natureza. Não dá na mesma comer um alimento geneticamente modificado ou um que sofreu mutação genética natural?
O que é diferente na engenharia genética é a maneira como o gene é inserido ali. Não existe nenhum controle sobre o lugar em que o gene é inserido dentro do genoma e isso pode ser incrivelmente destrutivo. Com a mutação natural, há uma razão para os genes estarem localizados em cromossomos específicos.
Que problemas os transgênicos podem causar à saúde humana?
Muitas das plantações usam o herbicida glyphosate, produto que pode causar alguns tipos de câncer. Também existem preocupações a respeito das safras Bt [tratadas com um inseticida composto por uma bactéria geneticamente modificada]. Acreditamos que a bactéria usada no algodão Bt é a causa de alergias e reações imunológicas adversas.
Em que evidências você se baseia para chegar a essa conclusão?
Um trabalho desenvolvido pelo oncologista Lennart Hardell, da Suécia, demonstrou que pessoas expostas por muito tempo ao herbicida glyphosate têm mais chances de desenvolver tumores. Outros estudos, em que ratos foram alimentados com transgênicos, mostraram que aconteceu ali uma resposta negativa do sistema imunológico.
Há casos reais em que populações foram afetadas?
Em plantações de algodão Bt, na Índia, muitos dos trabalhadores — tanto da plantação quanto das fábricas em que esse algodão era processado — tiveram sintomas alérgicos, como rachaduras no corpo, olhos avermelhados e lacrimejantes, narizes entupidos. Quando os médicos observaram essa vila, descobriram que mais de ¾ das pessoas com esses sintomas eram trabalhadores do campo. Se afastados das plantações, eles melhoravam, mas, se continuavam trabalhando, os sintomas pioravam.
Algumas pesquisas feitas com trabalhadores rurais nos Estados Unidos também demonstraram que eles geravam anticorpos contra os agrotóxicos Bt [o que significa que seus corpos reconheciam a substância como agressiva ao organismo]. O cientista que descobriu isso, há dez anos, disse “ok, agora eu tenho o reagente que podemos testar para saber se essas safras gerariam reações alérgicas”. E esse cientista, até hoje, não foi capaz de arranjar nenhum patrocínio.
Você acredita que cientistas não conseguem pesquisar transgênicos por causa de lobby de empresas como a Monsanto?
Isso é absolutamente verdadeiro. Há um ano, 26 cientistas americanos que trabalham com insetos escreveram para o EPA (Agência de Proteção Ambiental Americana) e disseram: “não conseguimos fazer nosso trabalho, não podemos analisar essas safras porque não somos permitidos”. Todos eles trabalhavam em universidades. Se algum deles quisesse comparar o milho Bt da Monsanto com outros competidores, ou investigar possíveis efeitos colaterais, ele teria que pedir permissão à empresa. E os contratos que os funcionários assinam antes de trabalhar nessas empresas dizem que eles são proibidos de oferecer amostras das sementes para pesquisadores.
Mas não é do interesse dessas companhias que seus produtos não deixem as pessoas doentes e não lhes rendam processos?
Veja, quantos produtos precisaram estar anos no mercado para que as pessoas soubessem que eles não eram seguros? Pense nos pesticidas, existem exemplos atrás de exemplos de pesticidas que eram maléficos à saúde e demoraram anos a sair do mercado. Em longo prazo isso não é inteligente. Quando você tem mais poder [de barrar] é antes do produto entrar no mercado. Quando ele está sendo comercializado e dando lucro, é muito mais difícil retirá-lo. E digamos que a EPA processe a empresa em US$ 10 milhões. Na verdade, em um ano de vendas deste produto eles ganham US$ 20 ou US$ 30 milhões. Além disso, quando se retira um produto do mercado porque ele não era bom, você abre as portas para processos.
Mesmo que o Brasil imponha critérios mais rígidos, como nós poderíamos estar protegidos contra alimentos importados, que obedeceriam a critérios diferentes?
Hoje nós apoiamos uma iniciativa que se chama The Brazilian Compromisse (Compromisso Brasileiro). Ele tem esse nome porque foi uma sugestão brasileira. Determina que os países podem usar critérios diferentes para rotular seus alimentos transgênicos e que esse rótulo é um meio primordial de comunicação entre o vendedor, de um lado, e o comprador de outro. Se esse documento for aprovado, nenhum país no mundo precisará se preocupar com um protesto comercial dos Estados Unidos, caso eles decidam barrar seus alimentos transgênicos. Eles não poderão alegar que são barreiras comerciais, porque será um direito dos países impor essas barreiras técnicas de qualidade. E é por isso que os Estados Unidos estão lutando para que este documento não seja aprovado.
Um argumento muito comum é o de que as sementes geneticamente modificadas podem viajar pelo ar e se misturar com as plantações comuns. Isso é verdade?
Sim, pode acontecer. Existe aí até mesmo um impacto negativo economicamente falando. No Brasil, por exemplo, a soja transgênica pode contaminar plantações não transgênicas. E existe um mercado para soja não alterada geneticamente – fazendeiros podem inclusive optar por vendê-la mais caro. Se essa soja estiver contaminada, eles não podem mais fazer isso.
Os trangênicos deveriam ser proibidos?
Não. Nossa posição é que isso deveria depender das decisões de cada país. Nós estamos preocupados com a tecnologia, e ela precisa ser testada melhor antes de entrar no mercado. Se eles forem testados e aprovados, poderiam ser permitidos.
Digamos que os testes levem anos. A humanidade, crescendo como está, conseguiria se alimentar sem os transgênicos durante esse período?
Não existe nenhuma evidência de que comida geneticamente modificada seja mais barata. Na verdade, dados dos EUA mostram que essas sementes custam muito caro. Eu também argumento: o culpado pelo problema da fome hoje não é a falta de alimentos, mas a distribuição desigual deles.
Fonte – Mariana Lucena, Revista Galileu
Imagem – Kansas Farmers Markets
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