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Ilegal? Eu? Pedestres e motoristas jogam, por dia, 260 toneladas de lixo nas ruas da cidade

Rio de Janeiro, terça-feira, 14h: o gari Alexandre Ferreira da Silva, de 31 anos, varre a Rua São José, no Centro, cumprindo uma rotina que, em dias de muito serviço, exige até quatro faxinas. Nem bem Alexandre deixa o local, uma senhora termina de comer um salgado e joga o guardanapo no chão. Um rapaz engravatado esvazia um pacote de biscoitos e atira a embalagem no solo. Outro homem despeja um copinho de café no canteiro de uma árvore. E um executivo joga um papelzinho aos pés de outra planta. Ao serem flagrados, todos fazem cara de poucos amigos. Em 15 minutos, parece que o lugar conhecido como Buraco do Lume – onde há pelo menos três lixeiras – não é limpo há tempos.

– Muita gente não tem consciência. A lixeira está perto, mas as pessoas jogam o lixo no chão. Somos 15 garis para percorrer toda a área do Castelo até a Avenida Beira Mar. Já morei cinco anos em São José dos Campos (SP) e lá não se vê lixo no chão. Aqui, o nosso trabalho não é reconhecido, nem respeitado – reclama Alexandre, enquanto se prepara para deixar o serviço. Ele será rendido por um colega, que varrerá a mesma rua do final da tarde à noite.

Detritos despejados em logradouros públicos foram alvo de 1.680 denúncias à ouvidoria da Comlurb somente no primeiro semestre deste ano. Mas aquele que reclama também pode estar contribuindo para a desordem urbana. Flagrado quando jogava uma ponta de cigarro no chão, no Centro, um técnico em contabilidade que se identificou apenas como Carlos reconheceu o erro, mas alegou que o que fez não é um hábito.

– Hoje você me pegou. Eu costumo apagar o cigarro e jogar na lixeira. Uma pontinha só não faz diferença no lixo jogado na rua, mas imagina todo mundo fazendo o mesmo? Quantas pontas de cigarro não vão aparecer? Vou me policiar mais – disse Carlos.

Gasto com faxina é de R$ 25 milhões

O descarte irregular de lixo não é um problema só do Centro. Segundo a Comlurb, em um mês, canteiros, calçadas e ruas da cidade recebem 7.800 toneladas de detritos jogados por pedestres e motoristas. O que é recolhido encheria seis campos de futebol com uma pilha de um metro de altura de copinhos, embalagens e sacolas plásticas, guimbas de cigarro e papel, muito papel. Um dia comum de varrição enche 37 caminhões com 260 toneladas de sujeira. Para limpar tudo, é mobilizado um batalhão: dos 12.600 garis da Comlurb, 8.500 (quase 68%) fazem a limpeza urbana. Os demais atuam em hospitais, escolas e na poda de árvores.

A imundície alheia faz vítimas tanto na rua como dentro de casa. O auxiliar administrativo Thiago Silva levou um banho de água suja jogada da janela de um prédio no Centro, na semana passada. O rapaz ficou indignado, mas acha que teve até sorte, uma vez que já viu lançarem um copo de vidro do mesmo prédio. Já a dona de antiquário Lou Vicente, que mora num apartamento térreo em Copacabana, tem que mandar limpar quase diariamente a tela de proteção instalada em sua área de serviço. O motivo? Os vizinhos jogam de ponta de cigarro a absorventes pela janela.

– Já vi papel higiênico usado e camisinha. A tela já existia quando me mudei, há cinco anos. Isso é uma incivilidade. Aqui moram pessoas que têm informação, gente de classe média, que frequentou escola. Mas, para ler jornal na área externa, tenho que ir de chapéu – reclama Lou, de 68 anos.

Ela não está sozinha no infortúnio. A empresária Márcia Loureiro mora num apartamento térreo no Flamengo e conta que, para poder frequentar a varanda, teve que distribuir cartas entre os condôminos do prédio, pedindo o óbvio: que usem a lixeira em vez da janela. A gota d’água foi um absorvente voador, que entrou pelo basculante do banheiro. Depois das reclamações, a situação melhorou, mas, ainda assim, pontas de cigarro continuam a ser lançadas no jardim.

Em Jacarepaguá, a aposentada Nilda Barros também teve que recorrer às cartinhas para chamar os vizinhos à razão:

– Tive que fazer uma cobertura para me livrar do lixo na área. É uma falta de educação tremenda.

Não há como contabilizar o que se joga em áreas internas de prédios, já que o lixo é descartado pelos condomínios na coleta diária. Mas, nas ruas, a infraestrutura de limpeza custa caro para o carioca: são gastos R$ 25 milhões mensais na faxina dos logradouros públicos. Apenas a varrição das ruas leva R$ 3,8 milhões desse total. O número assusta quando comparado com os R$ 9,8 milhões mensais gastos pela Comlurb na coleta domiciliar.

Com o dinheiro da varrição, a prefeitura diz que seria possível comprar 13 ambulâncias com UTI ou montar 51 equipes do Programa de Saúde da Família. Poderia ainda construir uma escola padrão, com 13 salas de aula, ou erguer 80 casas populares, de 32 metros quadrados cada. Segundo a Comlurb, se o carioca descartasse o lixo da forma correta – nos cem mil cestos espalhados pela cidade -, as despesas com a varrição poderiam cair em 70% (R$ 2,6 milhões ao mês).

Para o antropólogo Roberto da Matta, autor do livro “A casa e a rua”, o carioca ainda não conseguiu estabelecer uma relação afetiva com ruas, praças, parques e praias. Como não encara esses espaços como sendo seus, não demonstra o mesmo cuidado que teria com algo de sua propriedade:

– O carioca ainda faz uma divisão entre casa e rua. Um concerto na Quinta da Boa Vista faz com que o parque amanheça imundo. A pessoa não tem a noção de que aquilo é dela. Acha que é do Estado e que por isso não precisa cuidar. Se ela se comportasse na rua como se comporta em casa, a rua seria um brinco.

Fonte – O Globo de 30 de julho de 2009

Foto – The Ghaggster 1.

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Essa matéria é ótima e e mostra o caráter do brasileiro acomodado e porco. Todos nós já observamos estas situações narradas na matéria.

Guardadas as proporções, o mesmo ocorre em qualquer cidade do país, não importa o tamanho. As pessoas não conseguem enxergar a cidade como uma extensão de suas casas, acham que fora da porta, tudo pode, desde que sua casa esteja limpa. De novo, lá vem a lei do umbigo.

E daí chegam as enchentes, ratos, baratas, aranhas, escorpiões e caramujos e o povinho acostumado a reclamar põe a culpa na prefeitura.

O que precisamos é de multas altíssimas para os porcos poluidores, só isso irá mudar o padrão de comportamento destes que não podem ser considerados cidadãos e sim criminosos.

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