Em casos de intoxicação aguda causada por agrotóxicos, os sintomas apresentados geralmente incluem vômitos, náusea, dor de cabeça e tontura durante ou imediatamente após a pulverização nas proximidades. A exposição crônica a agrotóxicos, mesmo em doses baixas, é associada à infertilidade, a impactos negativos no desenvolvimento fetal, ao câncer e a outras consequências graves à saúde. Mulheres grávidas, crianças e outras pessoas vulneráveis aos agrotóxicos podem enfrentar riscos maiores.“Tive uma dor de cabeça forte, dor de barriga e a sensação de que ia vomitar,” disse uma garota de 10 anos que frequenta uma escola no município de Cascavel, no estado do Paraná. “[A professora] falou, ‘Vamos sair da sala porque o cheiro está muito ruim.’ Fomos para casa mais cedo. Cheguei em casa com enjoo, me sentindo mal, com uma forte dor de cabeça. Eu vomitei em casa duas vezes.”
O Brasil não deveria permitir a pulverização de agrotóxicos feita por aviões sobre as residências das pessoas ou por tratores próxima a janelas de salas de aula, disse a Human Rights Watch. Como medida de urgência, o Brasil deveria impor uma suspensão à pulverização aérea e criar zonas de segurança para a pulverização terrestre nas proximidades de locais sensíveis.
Nos próximos meses, o Congresso Nacional deve considerar um projeto de lei que enfraqueceria ainda mais a estrutura regulatória do país sobre agrotóxicos. Uma comissão parlamentar especial aprovou o projeto de lei em junho de 2018, e este precisa ser votado na Câmara dos Deputados antes de seguir para o Senado.
Entre suas muitas propostas, o projeto de lei propõe reduzir substancialmente o papel dos Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente, que são justamente os órgãos especializados nos impactos causados pelo uso de agrotóxicos. O projeto de lei também propõe a substituição do termo legal agrotóxicos por produtos fitossanitários, mascararando os perigos dos agrotóxicos à saúde e ao meio ambiente.
O Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo: as vendas anuais no país giram em torno de 10 bilhões de dólares. A imensa quantidade de agrotóxicos no Brasil é resultado da expansão da agricultura de monocultura em grande escala. Cerca de 80 por cento dos agrotóxicos são usados em plantações de soja, milho, algodão e cana-de-açúcar. Muitos dos agrotóxicos utilizados no Brasil são altamente perigosos à saúde humana. Dentre os 10 agrotóxicos mais usados no Brasil no ano de 2016, quatro não são autorizados para uso na Europa, o que evidencia quão perigosos eles são para outros governos.
“Em vez de enfraquecer ainda mais as leis existentes, o Brasil precisa de regulamentações mais rígidas e de um plano de ação nacional para diminuir o uso de agrotóxicos,” disse Pearshouse. “O Congresso deveria rejeitar o PL 6.299/2002e pressionar os ministérios competentes para que elaborem um estudo detalhado e imediato sobre os impactos à saúde e ao meio ambiente do atual tratamento dispensado aos agrotóxicos.”
Depoimentos selecionados:
“Eu me senti mal, com enjoo e dor de cabeça. Eu vomitei muito, depois que comecei eu não conseguia parar. Eu tive que ligar para o meu marido pedindo ajuda. Estou grávida e minha principal preocupação era com meu filho, eu estava preocupada que isso pudesse afetar sua saúde.” – Eduarda, uma mulher grávida de 20 e poucos anos, moradora de uma comunidade rural a algumas horas de carro da cidade de Santarém, no estado do Pará.
“O avião estava jogando do lado da escola e o vento trazia para a escola. Não dava para sentir o cheiro, mas dava para sentir a nebline, o vapor [de agrotóxicos] entrando pela janela. As crianças, entre 4 e 7 anos reclamavam que suas gengivas e olhos estavam ardendo.” – Marelaine, uma mulher de 20 e poucos anos, professora em uma comunidade rural no sul da Bahia.
“Eu comecei a me sentir mal, enjoada. Eu tentei beber água para melhorar, mas não ajudou. Eu comecei a vomitar várias vezes, até que vomitei tudo que tinha no estômago”. – Carina, uma estudante adulta de uma escola rural no município de Primavera do Leste, no estado do Mato Grosso.
“Dava pra ver o líquido branco [no ar]. Mesmo cheirando, vai para o seu cérebro. Você sente uma amargura na garganta. Você não quer mais respirar veneno – você quer respirar outro tipo de ar – mas não tem nenhum.” – Jakaira, um homem Guarani-Kaiowá de 40 e poucos anos, que vive em uma comunidade indígena a algumas horas de carro de Campo grande, no estado do Mato Grosso do Sul.
“Esta semana, um avião passou por cima da casa [de um vizinho] com o motor [de pulverização] ligado. A gente sente [os agrotóxicos] caindo na pele. Toda vez que bate, tem isso. Nós temos problemas com aviões há uns 10 anos. Fizemos várias ocorrências no quartel, delegacia [de polícia civil]. Não resolve – não existe justiça.” – Bernardo, um homem de 30 e poucos anos de uma comunidade quilombola a algumas horas de carro de Belo Horizonte, no estado de Minas Gerais.
“[A pulverização de agrotóxicos] incomoda e causa náuseas; me dá dor de cabeça. Eu tento me sentar do outro lado da sala de aula [do outro lado de onde eles pulverizam]. Nós temos um ventilador [na sala de aula], ele ajuda um pouco, mas o cheiro continua. Eu senti náusea, tontura. É ruim porque você quer vomitar, mas fica preso na garganta.” – Danilo, um garoto de 13 anos, estudante em uma escola rural a algumas horas de carro de Goiânia, capital do estado de Goiás.
***Todos os nomes foram alterados a fim de proteger a identidade dos entrevistados
Fonte – Human Rights Watch de 20 de julho de 2018
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