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Ir à Feira, a sustentabilidade nas pequenas coisas

Muitas cidades, até mesmo algumas capitais, ainda podem contar com feiras para a comercialização da produção de pequenos agricultores. Muitos destes têm a produção baseada na mão-de-obra familiar, vendendo o excedente produzido. Esta forma de comercialização de produtos agropecuários é muito importante para a economia local por algumas razões, por exemplo, menor tributação sobre os produtos, ausência de atravessadores, proximidade entre a produção e o consumidor final, valor das mercadorias, menor uso de agrotóxicos e diversidade de produtos. Estas características, além da economia regional, contribuem para a sustentabilidade socioambiental local, por reunir maior geração de renda para a agricultura familiar com impactos reduzidos sobre o meio ambiente.

A menor tributação advém do fato de que a comercialização é feita diretamente entre o produtor e o consumidor, evitando impostos em cascata – que no Brasil, recaem muito mais sobre os pobres que sobre os ricos – isto gera uma renda maior para os produtores rurais, injetando mais dinheiro na economia local. Como a comercialização é uma relação direta entre produtor e consumidor, exclui a necessidade de atravessadores, que em muitos casos ficam com a maior parte do lucro obtido pela comercialização da mercadoria. Estes dois fatos aumentam a rentabilidade da agricultura familiar na hora da venda, no entanto, outras características deste modo de produção também contribuem para o aumento da renda do pequeno produtor.

Como a produção é pequena, impossibilita a venda dos excedentes para grandes centrais de abastecimento, logo, os produtores têm de recorrer a outro meio de comercialização, por este motivo a existências das feiras. Com isto, o cultivo é comercializado na região em que é produzido. Este fato diminui a emissão de poluentes, pois, depende-se de veículos menores e há um consumo menor de combustível, por causa da proximidade entre a produção e o consumidor final, reduzindo a pegada de carbono dos produtos vendidos.

Outra característica interessante da produção em pequena escala, é que permite um uso reduzido de agrotóxicos ou mesmo a ausência do uso destes defensivos agrícolas. Isto reduz o custo de produção. Este fato explica porque muitos dos produtos vendidos nas feiras não têm uma aparência tão boa quanto os produtos vendidos em grandes redes de supermercados. O uso intensivo de agrotóxicos permite que sejam produzidos legumes muito bonitos, com cor e formato adequados. Mas qual é o preço a se pagar para se ter produtos mais atraentes? O consumo de substâncias carcinogênicas existentes em muitos agrotóxicos.

Estes fatos permitem que muitas vezes os preços praticados nas feiras sejam menores do que em outros locais. Além disto, as feiras podem ser consideradas como espaços para interação, sobretudo para pessoas da terceira idade que carecem de momentos de convivência social. Outro ponto positivo das feiras é a diversidade de produtos, nelas é possível encontrar frutas, legumes, grãos e raízes, produtos de origem animal (ovos, frangos, queijo), além de aguardente, quitutes (como doces, biscoitos, roscas e pães), e artesanato. Muitos destes produtos comercializados não são encontrados facilmente em outros locais, por não apresentarem produção comercial em larga escala, sendo muitas vezes produtos tradicionais, que guardam em si um pouco da história regional.

Um uso reduzido de agrotóxicos permite uma maior biodiversidade nas áreas de plantio, possibilitando um controle natural de pragas e polinização mais eficientes, o que muitas vezes auxilia na obtenção de produtos que atendam melhor o apelo estético exigido pelo mercado consumidor. Além de contribuir para a conservação da fauna e flora nativas, permitindo uma maior conexão entre fragmentos florestais. Esta é uma característica de uma produção agrícola, que pelos menos em parte, atende aos princípios agroecológicos. Uma maior biodiversidade que existi na área agrícola é facilitada por outra característica deste sistema de produção, a grande variedade de plantas cultivadas. Muitos produtores permitem que plantas, consideradas daninhas pela agricultura em larga escala, cresçam entre as culturas. Isto permite que haja um número maior de interações ecológicas, contribuindo para a manutenção de mais espécies neste ambiente.

Até agora neste texto, foram apresentados argumentos relacionados a aspectos socioambientais e econômicos da agricultura familiar que têm influência apenas regional. No entanto, é surpreendente a importância da agricultura familiar para todo o País. Segundo o censo agropecuário de 2006, realizado pelo IBGE, 16,4 milhões de pessoas estavam trabalhando no campo (18,9% da população ocupada no país), destes 77,0% são de produtores e seus parentes. Embora a soma de suas áreas represente apenas 30,31% do total, as pequenas propriedades são responsáveis por 84,36% dos empregos deste setor.

Mesmo que cada um deles gere poucos postos de trabalho, os pequenos estabelecimentos (área inferior a 200 ha) utilizam 12,6 vezes mais trabalhadores por hectare que os médios (área entre 200 e inferior a 2.000 ha) e 45,6 vezes mais que os grandes estabelecimentos (área superior a 2.000 ha).

Em 2006, a receita produzida pela agropecuária somou R$ 122,63 bilhões. Os pequenos (área inferior a 100 hectares) geraram 47,13% deste total (R$ 57,79 bilhões). Além disto, alguns produtos que baseiam a alimentação do brasileiro são produzidos principalmente pela agricultura familiar, por exemplo, 70% da produção do feijão advêm de pequenas propriedades com mão-de-obra familiar.

O estimulo a criação de novas feiras e a manutenção das existentes é uma estratégia para que seja possível um desenvolvimento regional mais sustentável ambientalmente e socialmente mais justo. A divulgação da importância das feiras deve ser também uma estratégia voltada para mudanças de comportamentos, sobretudo na educação infantil, para que seja possível a formação de cidadãos que avaliem racionalmente e com um olhar mais amplo suas escolhas na hora das compras, pois estas podem influenciar a qualidade ambiental e aspetos socais da região onde vive.

Autores – Valdir Lamim-Guedes é Mestrando em Ecologia de Biomas Tropicais, Universidade Federal de Ouro Preto e Jéssica Brito é Graduanda em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Ouro Preto

Fonte – EcoDebate de 28 de janeiro de 2010

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