Por Ellen Nemitz · ECO - 18 de dezembro de 2024 - Câmara ressuscitou “jabutis” da…
Marca francesa combate resistência a hortifrútis de ‘cara feia’
A rede Intermarché adotou a ideia de vender legumes, frutas e verduras ‘moches’ ou feias
Para combater o desperdício de alimentos, supermercados franceses estão vendendo frutas, verduras e legumes “feios” – que não correspondem aos padrões estéticos habituais e que, de outra forma, acabariam destruídos.
Até então desprezados por atacadistas, centrais de compras de supermercados e também, claro, pelos consumidores, os legumes e frutas moches (feias), como são chamados na França, estão se tornando uma tendência de consumo no país.
Em apenas um ano de existência, a marca Les Gueules Cassées (as caras quebradas, em tradução livre), que reúne produtores agrícolas franceses e visa revalorizar alimentos disformes, já vendeu 10 mil toneladas de hortifrútis “feios”, segundo Nicolas Chabanne, co-fundador da marca.
“Não é possível continuar jogando no lixo toneladas de comida apenas porque o visual e as dimensões não correspondem aos padrões exigidos”, disse à BBC Brasil.
Na França, 20 kg de alimentos são jogados fora anualmente, por pessoa, sendo 7 kg de produtos não consumidos e ainda embalados, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente.
“O consumidor evoluiu e passou a se preocupar mais com questões ambientais e éticas”, afirma Chabanne.
Economia
Mas fatores econômicos também podem explicar as boas vendas destes produtos até então rejeitados pelo consumidor.
Eles custam 30% menos do que frutas e legumes que correspondem aos “padrões de beleza”.
“O consumidor faz bons negócios e, ao mesmo tempo, uma boa ação, contribuindo para reduzir o desperdício de alimentos”, diz Chabanne.
A iniciativa da Les Gueules Cassées parte do princípio de que apesar de “feios”, os alimentos não têm menos sabor ou qualidades nutritivas que os de boa aparência.
Tradicionalmente, atacadistas franceses devolvem aos produtores produtos tortos ou com calibres que não correspondam aos tamanhos fixados.
Produtores de endívias, por exemplo, chegam a desfolhar boa parte das verduras antes de enviá-las ao comerciantes para que elas tenham tamanhos idênticos nas caixas e não sejam devolvidas.
Isso é feito porque os comerciantes sabem que o consumidor “torce o nariz” para produtos com aspecto diferente, como cenouras tortas ou com várias pontas.
De acordo com Chabanne, os alimentos da marca já podem ser encontrados em 5 mil supermercados em todo o país. No início do ano, eram apenas 1,5 mil lojas.
Grandes redes de supermercados, como Monoprix, Franprix, e Leclerc passaram a vender regularmente as frutas e legumes da Les Gueules Cassées.
Mas os produtos, embalados e identificados com o selo da marca (uma maçã com um só dente), ainda não estão disponíveis em todas as lojas dessas redes.
Opositores
Já a rede Intermarché fez operações pontuais de vendas dessas frutas e legumes disformes e chegou a promover comerciais bem-humorados na TV, onde produtos “feios” tinham sentimentos.
Um dos anúncios mostrava um cenoura com duas pontas “deprimida” por não se sentir desejada. Uma voz em off dizia que ela era “feia, mas nem por isso deixava de ser gostosa”.
A última operação comercial desse tipo, no início do ano, resultou na venda de uma tonelada de frutas e legumes por loja que participou da iniciativa, segundo o Intermarché, que tem outros fornecedores.
Mas a venda de alimentos “feios” na França enfrenta opositores. “Isso é uma operação de marketing do varejo para baixar ainda mais os preços. Se os legumes são tortos ou têm outros defeitos é porque o agricultor não trabalhou direito”, disse à BBC Brasil Jacques Rouchaussé, presidente da federação Legumes da França, que reúne 33 mil produtores.
Segundo ele, o setor já limita o desperdício alimentar ao vender para a indústria produtos menos atraentes visualmente, que são transformados em sopas e outros produtos.
Em maio, o Parlamento francês aprovou uma lei que proíbe os supermercados de jogar fora alimentos não vendidos. Eles deverão ser obrigatoriamente doados a associações de caridade ou utilizados para a alimentação animal ou em adubos agrícolas.
As críticas parecem não incomodar a Les Gueules Cassées, que está inclusive ampliando a sua oferta com produtos industrializados ou artesanais que possuem formas, cores e tamanhos que não correspondem às exigências habituais.
Em maio, foi lançado um queijo camembert com pequenos defeitos de formato e de aspecto, menos redondos ou lisos, que já está sendo vendido em mais de 200 lojas do grupo Carrefour no país.
Também foram lançados cereais para o café da manhã com tonalidade diversa e diferença de alguns milímetros no tamanho, vendidos pela metade do preço nos supermercados Casino.
Daniela Fernandes, BBC Brasil de 11 de agosto de 2015
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