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Movimento ambientalista e a energia nuclear

Chernobyl hoje. (Foto: Extra (Globo))O governador do Estado de Nova York, nos Estados Unidos, tomou recentemente uma decisão que pode ter sérias consequências para todo o movimento ambientalista daquele país, com repercussões no resto do mundo. A decisão do governador tem a finalidade de permitir ao Estado de Nova York atingir a meta de 50% de eletricidade de fontes renováveis em 2030. Atualmente, essa participação é de apenas 23%.Análises técnicas concluíram que para alcançar esse ambicioso objetivo será preciso manter em funcionamento duas centrais nucleares, que são deficitárias. Será necessário, portanto, pagar mais pela energia gerada nos reatores nucleares porque reatores nucleares não emitem gases, que são a principal causa do aquecimento global. O subsídio necessário é de US$ 965 milhões para os próximos dois anos.

Com isso os reatores nucleares ganham uma sobrevida, o que encorajou outras iniciativas do mesmo gênero e irritou o movimento antinuclear americano. A decisão tomada pelo governador de Nova York criou, pois, uma divisão no movimento ambientalista, que no passado marchava unido contra o aquecimento global e contra a energia nuclear.

As duas vertentes ambientalistas têm origens históricas diferentes. O movimento tradicional teve início em fins do século 19 e era essencialmente voltado para a conservação da natureza. Com o aumento da poluição resultante da grande atividade industrial do século 20 e do crescimento das cidades, ele se estendeu à melhoria da qualidade do ar e das águas e ao impacto das grandes obras no meio ambiente. Essa é uma preocupação de toda a população e deu origem à criação de ministérios de meio ambiente ou entidades públicas equivalentes no mundo todo.
Mais recentemente, os problemas do aquecimento global passaram a dominar a agenda ambiental, já agora com sérias implicações políticas, porque a redução do consumo de combustíveis fósseis, necessária para diminuir a emissão de gases responsáveis pelo “efeito estufa”, tem profundas consequências econômicas e afeta os países de forma diferente.
O movimento antinuclear é muito mais recente. Desde o início teve um caráter mais político, pelo fato de não haver uma distinção tecnológica clara entre o uso de energia nuclear para fins militares e para fins pacíficos, e foi isso que originou uma enorme mobilização. No início da guerra fria, entre Estados Unidos e União Soviética, o movimento antinuclear era frequentemente acusado de ser antiamericano.

“O movimento antinuclear … teve um caráter mais político”. Pode até ter sido no início do movimento, mas depois dos ambientalistas entenderem o problema para a humanidade, virou uma guerra como todas as outras que lutamos contra a destruição do planeta e da humanidade. Definição besta, querendo desqualificar o movimento ambientalista.

Em condições normais de funcionamento, reatores nucleares são seguros e não podem ser comparados com armas nucleares, porque a radioatividade fica contida numa cápsula de aço. Além disso, não emitem gases de “efeito estufa” e por essa razão são considerados uma fonte de energia renovável.
Quando acontecem acidentes, porém, a cápsula pode se romper e espalhar radioatividade. Foi o que aconteceu em 2011 em Fukushima, no Japão: centenas de milhares de pessoas foram afetadas e o custo da contenção dos danos é enorme, uma vez que a quantidade de material radiativo liberada é comparável à da explosão atômica que destruiu Hiroshima, em 1945.

Seguro? Chernobyl (1986), Three Mile Island (1979), Kyshtym (Ozyorsk – 1957), Césio – 137 (1987), Tokaimura (1999), Seversk (1993), Yucca Flat (1970),  Windscale (1957), Bohunice (1977), Fukushima (2011)… Qualquer acidente afeta de milhares a milhões de pessoas e a contaminação dura milhares de anos. Seguro? Onde? *

A partir de 1970, centenas de reatores nucleares foram construídos em 31 países; operam hoje no mundo 440 deles. Até 20 anos atrás a energia nuclear parecia ser a energia do futuro. Mas os acidentes e o receio de contaminação nuclear levaram vários países, entre os quais Japão e a Alemanha, a abandonar gradativamente essa forma de energia e procurar desenvolver alternativas.

Eletricidade nuclear, que chegou a representar 16% da energia elétrica usada no mundo, representa hoje menos de 11%. Apenas uns poucos países continuam a construir reatores – os principais deles são a China, a Índia, a Rússia e a Coreia do Sul. Nos outros há grandes esforços para manter os reatores existentes em funcionamento e substituir os antigos, que estão atingindo o fim de sua vida útil.

Sucede que os novos reatores são mais caros que os antigos e a competitividade que proporcionavam no custo da eletricidade produzida está desaparecendo: gás natural, que é abundante em muitas partes do mundo, oferece custos menores, da mesma forma que energias renováveis como a eólica e a de biomassa.

Foi por isso que o Estado de Nova York decidiu subsidiar fortemente o setor nuclear para manter aqueles dois reatores em funcionamento. O argumento dado pelo governo é que subsídio é o “custo social do carbono” que seria emitido se os reatores fossem desligados, já que a eletricidade teria de ser gerada usando combustíveis fósseis, que emitem gases do “efeito estufa”.

Essa posição é defendida por alguns ambientalistas, o que cria um conflito com os ambientalistas mais tradicionais. O problema é decidir o que é mais grave: emissões de gases de “efeito estufa”, que são liberados sempre que energia é gerada a partir de combustíveis fósseis, ou os efeitos da radioatividade que poderá ser lançada no meio ambiente apenas quando eventuais acidentes acontecerem.

Opa, os efeitos não são apenas em caso de acidente. Esqueceram de mencionar os resíduos radioativos que são descartados anualmente, depositados em locais específicos e tem que ficar lá por centenas de anos. E nem todos os países que tem usinas nucleares seguem um procedimento seguro. Alguns enterram em minas desativadas, outros no mar, que tem milhares de tambores que podem se romper em algum momento. Como a radiação demora de centenas a milhares de anos para se dissipar, quem garante que daqui há algumas centenas de anos as minas de sal que hoje abrigam o lixo nuclear não estarão sendo exploradas para consumo de sal, contaminando os humanos? Pior ainda, os humanos estarão consumindo peixes sendo contaminados pelos tambores que vazaram no fundo do mar.

É impossível resolver essas diferenças de maneira científica, mas o que está ocorrendo na prática é que diversos países adotaram o “princípio da precaução” e estão abandonando a energia nuclear como opção energética. Exemplos são a Alemanha, a Itália, o Japão e a França. Outros estão reduzindo a sua contribuição.

Como os custos de produção de eletricidade nuclear estão subindo e os de outras energias renováveis estão baixando, o problema provavelmente será resolvido por questões econômicas – que levarão ao abandono da alternativa nuclear.

Por enquanto ela está se mantendo à custa de subsídios, que dificilmente poderão perdurar indefinidamente

José Goldemberg é Professor Emérito da USP, presidente da Fapesp, foi secretário do Meio Ambiente da Presidência da República

Fonte – O Estado de S.Paulo de 17 de outubro de 2016

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Windscale (1957) – Durante o período que sucedeu a Segunda Guerra, a Inglaterra também buscava desenvolver armas nucleares. A pressa em fazer uma bomba atômica em Windscale levou ao incêndio no reator, vazando material radioativo para a atmosfera. Para manter uma boa imagem sobre seu programa nuclear, o governo do país tentou ocultar as negligências que levaram ao acidente, que – supostamente – ocasionou mais de duas centenas de casos de câncer entre as comunidades vizinhas.

Kyshtym (Ozyorsk – 1957) – Criada em 1957, como fruto da corrida nuclear da União Soviética, a usina de Mayak sofreu uma falha no sistema de refrigeração do compartimento de armazenamento de resíduos nucleares. O erro causou uma explosão em um tanque com 80 toneladas de material radioativo. A nuvem de gás contaminou a região em um raio de 800 km. Como a cidade de Ozyorsk, onde aconteceu o acidente, não estava no mapa soviético, o fato ficou marcado como “o desastre de Kyshtym”. Cerca de dez mil pessoas foram evacuadas, sem explicação do governo. Foram registradas pelo menos 200 mortes por causa da exposição à radiação.

Bohunice (1977) – O acidente na usina de Bohunice, na Tchecoslováquia de 1977 (hoje dividida em República Checa e a Eslováquia) ocorreu após uma mudança de combustível. Os absorventes de umidade que cobriam as barras de combustível não foram removidos da forma correta. Como conseqüência, o combustível sofreu superaquecimento, levando à corrosão do reator. Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica, não há estimativas adequadas sobre feridos ou mortos porque, na ocasião, o acidente teria sido encoberto pelo governo soviético. O que se sabe é que os gases radioativos se espalharam por toda a usina.

EUA, 28 de março de 1979 – Em Three Mile Island (Pensilvânia), uma falha humana impediu o resfriamento normal de um reator, cujo centro começou a derreter. Os dejetos radioativos provocaram uma enorme contaminação no interior do recinto de confinamento, destruindo 70% do núcleo do reator. Um dia depois do acidente, um grupo de ecologistas mediu a radioatividade em volta da usina. Sua intensidade era oito vezes maior que a letal. Cerca de 140 mil pessoas foram evacuadas das proximidades do local. O acidente foi classificado no nível 5 da escala internacional de eventos nucleares (INES), que vai de 0 a 7.

EUA, agosto de 1979 – Um vazamento de urânio em uma instalação nuclear secreta perto de Erwin (Tennessee) contaminou cerca de mil pessoas.

Three Mile Island (1979) – A central nuclear de Three Mile Island foi cenário de um acidente que atingiu o nível 5 na Escala Internacional de Eventos Nucleares, em 28 de março de 1979. Localizada próxima a Harrisburg, capital da Pensilvânia, a usina sofreu superaquecimento devido a um problema mecânico, mas não chegou a explodir, pois os técnicos optaram pela liberação de vapor e gases. Apesar de não haver casos de mortes em razão da radiação, cerca de 25 mil pessoas entraram em contato com os gases, que foram liberados para evitar a explosão. No mesmo ano, uma comissão presidencial e a Comissão Nuclear Reguladora chegaram a seguinte conclusão: “ou não haverá casos de câncer ou o número será tão pequeno que nunca será possível detectá-los.”

Japão, janeiro-março de 1981 – Quatro vazamentos radioativos na usina nuclear de Tsuruga, uma cidade na província de Fukui, a 300 quilômetros de Tóquio, deixaram 278 pessoas contaminadas por radiação.

Chernobyl (1986) – O maior desastre nuclear da história ocorreu em Chernobyl, na região da Ucrânia, em 26 de abril de 1986, quando o reator número 4 da usina soviética de Chernobyl, na Ucrânia, explodiu durante um teste de segurança,  liberando uma nuvem radioativa, com 70 toneladas de urânio e 900 de grafite, na atmosfera. O acidente é responsável pela morte de mais de 2,4 milhões de pessoas nas proximidades e atingiu o nível 7, o mais grave da Escala Internacional de Acidentes Nucleares (INES). Após a explosão do reator, vários trabalhadores foram enviados ao local, para combater as chamas. Sem equipamento adequado, eles morreram em combate e ficaram conhecidos como “liquidadores”. A solução foi construir uma estrutura de concreto, aço e chumbo, para cobrir a área da explosão. No entanto, a construção foi feita com urgência e apresenta fissuras, tanto que o local até hoje é nocivo, pela radiação. Para se ter uma idéia da magnitude do acidente, o volume de partículas radioativas em Chernobyl foi 400 vezes maior do que o emitido pela bomba atômica de Hiroshima, lançada no Japão, após a Segunda Guerra. O combustível nuclear queimou durante 10 dias, jogando na atmosfera radionuclídeos de uma intensidade equivalente a mais de 200 bombas atômicas iguais à que caiu em Hiroshima. Três quartos da Europa foram contaminados. Prypiat, cidade elaborada para ser moradia dos trabalhadores da usina, teve seus habitantes mortos ou evacuados. Animais, rios e florestas também foram contaminados e diversas anomalias genéticas se deram na região, que engloba antigos países do bloco soviético, como Bielorrúsia, Ucrânia e Rússia. Hoje, 26 anos após a catástrofe, foi iniciada a construção de uma nova estrutura, para reduzir a ameaça de radioatividade no local. Atualmente a cidade de Prypiat é desabitada.

Césio – 137 (1987) – O acidente radioativo de nível 5 segundo a INES aconteceu em Goiânia, em 1987, quando dois catadores de papel encontraram um aparelho de radioterapia e o levaram para um ferro-velho. Após desmontarem o aparelho, os homens encontraram uma cápsula de chumbo, com cloreto de césio em seu interior. A coloração brilhante do cloreto de césio no escuro impressionou Devair Ferreira, o dono do ferro-velho, que levou o “pó branco” consigo e distribuiu o material para familiares e vizinhos. Após o contato com o césio, náuseas, vômitos e diarréia atacaram (a sobrinha de Devair foi a primeira a falecer, seis dias após ingerir o material). Ao todo, onze pessoas morreram e mais de 600 foram contaminadas. A exposição à radiação atingiu 100 mil pessoas. O ferro-velho onde abriram a cápsula foi demolido, o comércio fechou e muitas pessoas se mudaram. As autoridades sanitárias construíram um depósito em Abadia de Goiânia, cidade próxima, para armazenar as mais de 13 mil toneladas de lixo atômico, resultantes do processo de descontaminação da região.

Yucca Flat (1970) – A região de intensos testes nucleares fica em Nevada, a 65 km de Las Vegas. Em dezembro de 1970, um dispositivo de alta potência foi detonado no subsolo, mas provocou rachaduras, que resultaram em detritos radioativos na atmosfera. Cerca de 86 trabalhadores foram expostos à radiação. Não se sabe o que ocorreu com os funcionários. Atualmente desativada, a região recebeu seu último teste em 1992.

Rússia, abril de 1993 – Uma explosão na usina de reprocessamento de combustível irradiado em Tomsk-7, cidade secreta da Sibéria Ocidental, provocou a formação de uma nuvem e a projeção de matérias radioativas. O número de vítimas é desconhecido. A cidade, hoje chamada de Seversk, é fechada e só pode ser visitada a convite. Possui diversos reatores nucleares e indústrias químicas para separação, enriquecimento e reprocessamento de urânio e plutônio.

Japão, março de 1997 – A usina experimental de reprocessamento de Tokai (nordeste de Tóquio) foi parcialmente paralisada depois de um incêndio e de uma explosão que contaminou 37 pessoas, em um acidente ocorrido no dia 11 de março de 1997.

Japão, setembro de 1999 – A mesma usina voltou a ser palco de um novo acidente nuclear em 30 de setembro de 1999, devido a erro humano, provocando a morte de dois técnicos. Mais de 600 pessoas, funcionários e habitantes dos arredores, foram expostos à radiação e cerca de 320 mil pessoas foram evacuadas. Os dois técnicos haviam provocado uma reação nuclear descontrolada, Ao utilizar uma quantidade de urânio muito superior à prevista durante o processo de fabricação.

Japão, 9 de agosto de 2004 – Na usina nuclear de Mihama, a 320 quilômetros a oeste de Tóquio, um vapor não radioativo vazou por um encanamento que se rompeu em seguida, ao que parece, por uma grande corrosão, provocando a morte de cinco funcionários por queimaduras.

França, 23 de julho de 2008 – Durante uma operação de manutenção realizada em um dos reatores da usina nuclear de Tricastin, no sul da França, substâncias radioativas vazaram, contaminando muito levemente uma centena de empregados. Segundo autoridades francesas, as substâncias chegaram a atingir dois rios próximos ao local. Autoridades chegaram a proibir o consumo de água e a prática de pesca e esportes nos rios.

Japão, 12 de março de 2011 – O terremoto de 9 pontos da Escala Richter que atingiu o Japão em 11 de março, causou estragos na usina nuclear Daiichi, em Fukushima, cerca de 250 quilômetros ao norte de Tóquio. Explosões em três dos seis reatores da usina deixaram escapar radiação em níveis que se aproximam do preocupante, segundo as autoridades japonesas.O acidente foi classificado no nível 5 da escala internacional de eventos nucleares (INES) pelas autoridades japonesas.

Esses são só alguns dos maiores acidentes ocorridos com o uso da pacífica e limpa energia nuclear. Pesquise, aprenda, se posicione contra esta imbecilidade pela qual pagarão todos os nossos descendentes.

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