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Newton Cardoso Júnior: fazendo leis e bons negócios na Câmara dos Deputados

Deputado federal do MDB é autor de um projeto de lei que acaba com o licenciamento ambiental para plantações de eucalipto, beneficiando empresas da família

O mais jovem deputado federal do MDB, Newton Cardoso Júnior ganhou a atenção dos principais jornais do país no ano passado quando se descobriu que suas empresas tinham dívidas milionárias com a União. Em uma troca de chapéus que gritava conflito de interesse, o deputado endividado atuava como relator da medida provisória do Refis, que aumentou vantagens e descontos para empresas que devem impostos.

Essa não foi a primeira vez que Cardoso Junior legislou em benefício próprio. Ao cruzar sua atuação como parlamentar e seus negócios, a Repórter Brasil descobriu uma série de conflitos de interesses. O levantamento foi feito a partir do Ruralômetro, ferramenta que mede como a ação dos deputados impacta o meio ambiente e os povos do campo.

O breve histórico do parlamentar, que está no seu primeiro mandato, é de fazer inveja aos mais experimentados mandatários da Câmara.

Newton Cardoso Júnior votou e propôs projetos que beneficiam os negócios rurais de sua família e que geram impactos negativos ao meio ambiente Foto: MDB nacional

Cardoso Junior é integrante da bancada ruralista, a Frente Parlamentar Agropecuária, e carrega o nome e o legado do pai. Newton Cardoso é empresário rural, foi governador de Minas Gerais de 1987 a 1991 e deputado federal por três mandatos. Newtão, como é conhecido, é dono de 145 fazendas e tem um patrimônio total de R$ 2,5 bilhões, segundo afirmou à revista Veja em matéria publicada em 2009. O patrimônio declarado ao Tribunal Superior Eleitoral em 2010 foi de R$ 78 milhões. O Grupo Newton Cardoso, que se define como “um dos maiores do Brasil”, tem uma ampla gama de atuação: se expande pelas áreas de “siderurgia, agropecuária, reflorestamento, indústria e serviços”.

Uma das empresas de agronegócio do grupo cultiva plantações de eucalipto no interior de Minas Gerais, caso da Rio Rancho Agropecuária. Não coincidentemente, o Projeto de Lei 6411/2016, de autoria de Cardoso Júnior, propõe acabar com a necessidade do licenciamento ambiental prévio e dos estudos de impacto para áreas de reflorestamento.
O projeto, que ainda não foi analisado pelas comissões da Câmara, também beneficiaria outra empresa que tem Cardoso Júnior como presidente e que pertence ao grupo Newton Cardoso. A Siderúrgica Pitangui utiliza carvão vegetal, geralmente produzido a partir do eucalipto, como matéria prima para a produção de ferro gusa. Ou seja, ao facilitar a aprovação de novas áreas de plantio de eucalipto, o projeto de lei estaria beneficiando indiretamente a indústria que consome esse produto.

Grandes plantações de eucalipto substituem as florestas de Minas Gerais. Ambientalistas comparam os problemas gerados pela monocultura com os da soja Foto: Gui Gomes/Repórter Brasil

Cardoso Junior nega atuar em benefício próprio. O deputado informou, por meio de nota enviada por sua assessoria, que “defende a desburocratização do licenciamento ambiental, com o objetivo de agilizar o processo, já que os produtores enfrentam lentidão e restrições da legislação que impedem o desenvolvimento”. A nota afirma ainda que o parlamentar representa os interesses do setor de eucalipto devido à sua importância econômica para Minas Gerais, ressaltando que o estado tem a maior área plantada de florestas do Brasil. “A manutenção dessa atividade é de fundamental importância para a economia do estado, tendo em vista que o setor gera 379 mil empregos diretos e indiretos e responde por 9% do PIB mineiro.” Leia a íntegra das respostas.Grandes plantações de eucalipto substituem as florestas de Minas Gerais. Ambientalistas comparam os problemas gerados pela monocultura com os da soja.

O projeto sofre críticas, ainda, por ser considerado prejudicial ao meio ambiente. O texto partiria de um princípio errado: a ideia de que “plantar árvores”, não importa o tipo e a quantidade, seria sempre algo positivo para o meio ambiente. “Toda plantação de monocultura em grandes extensões produz um ecossistema artificial e gera impactos ambientais”, avalia o coordenador do Programa Xingu do Instituto Socioambiental, Rodrigo Junqueira. “Uma plantação de eucalipto deve ser vista como uma plantação de soja – é uma monocultura”.

Outro problema ainda mais grave apontado por Junqueira seria que, caso aprovada, a lei abriria brecha para que outros setores demandem a extinção do licenciamento ambiental.
Ao justificar a elaboração do projeto, o deputado afirma que “a atividade de plantio florestal cada vez mais é reconhecida por sua capacidade de proporcionar benefícios ambientais e sociais”. O texto argumenta que a legislação brasileira está “equivocada” ao considerar a silvicultura como uma atividade que causa degradação ambiental.

Grilagem e dano ao ambiente

Em outras frentes de conflito de interesse, a Rio Rancho Agropecuária, que deve R$ 850 mil ao INSS, é suspeita de ter falsificado documentos para forjar posse de terras públicas no interior de Minas. O Ministério Público Federal investiga a empresa pela chamada “grilagem” de terras da União, invadindo o território de uso tradicional das comunidades geraizeiras.
Apesar da sua empresa ser investigada por esse crime, o deputado se manifestou de modo favorável à única votação nominal dentro do processo de aprovação da chamada “MP da Grilagem”. A Medida Provisória 759/2016 foi amplamente criticada por ambientalistas justamente porque ela amplia as situações em que se permite legalizar áreas públicas invadidas, abrindo caminho para a piora do desmatamento e dos conflitos de terras.

Cardoso Junior votou sim a uma emenda específica dentro da MP, votada em junho de 2017, que ampliava o desconto para produtores rurais com dívidas referentes ao crédito rural.

As plantações de Cardoso Junior são investigadas por invadir terra pública onde comunidades tradicionais cultivam a terra de modo sustentável Foto: Gui Gomes/Repórter Brasil

Além da sua atuação em benefício de suas empresas rurais, o Ruralômetro revela ainda que o deputado teve uma atuação parlamentar desfavorável ao meio ambiente. Como resultado final do balanço de sua atuação parlamentar, o deputado ficou com a temperatura de 39,7º C, indicando a “febre ruralista”.

Cardoso foi mal avaliado porque, além da proposta sobre as plantações de eucaliptos, o deputado teve nove votos considerados desfavoráveis ao meio ambiente, trabalhadores rurais, indígenas e comunidades tradicionais. A ferramenta calcula a temperatura a partir de cada voto e proposta dos parlamentares, considerando a avaliação de organizações do setor socioambiental como o ISA, o Greenpeace e a Comissão Pastoral da Terra.

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O Ruralômetro aponta ainda que, durante a eleição de 2014, o deputado recebeu R$ 51 mil em doações de empresas autuadas pelo Ibama por infrações ambientais – entre elas, a própria Siderúrgica Pitangui.

Mais dívidas

Em Pitangui, no interior de Minas, a siderúrgica que leva o nome da cidade é famosa por ter mão-de-obra qualificada e por empregar cerca de 200 trabalhadores. A empresa, no entanto, nem sempre cumpre suas obrigações trabalhistas. Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de Pitangui, José Vantuir Ferreira, além de não repassar ao INSS as contribuições previdenciárias dos trabalhadores, há diversos casos de funcionários que são obrigados a entrar com ações na Justiça anualmente para cobrar o reajuste salarial. Além disso, segundo Ferreira, a empresa atrasa o pagamento de FGTS com alguma frequência.

Além de ter desconto e condições especiais de parcelamento das suas dívidas com o poder público, Newton Cardoso Júnior conseguiu também, com a MP do Refis alterada em benefício próprio, se livrar de uma ação penal que transitava no Supremo Tribunal Federal e que pedia o bloqueio de seus bens por conta da inadimplência da Siderúrgica Pitangui. Em decisão do último 6 de março, o ministro Celso de Mello decretou a extinção da punibilidade, sob o argumento de que a dívida estava sendo negociada e parcelada.

Monocultura de eucalipto em Minas Gerais, onde o Ministério Público Federal investiga empresa de Cardoso Junior por invasão de terra pública Foto: Gui Gomes/Repórter Brasil

Como os valores totais dos débitos ainda não foram totalmente quitados, a empresa continua inscrita na dívida ativa da União, de acordo com dados disponibilizados à Repórter Brasil pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional em março deste ano. Ao todo, a Siderúrgica e outras seis companhias ligadas ao deputado possuem dívidas de R$ 18 milhões apenas à Previdência Social (dos quais R$ 15,3 milhões referem-se ao INSS Rural) – valores que não incluem outros tributos federais, como Imposto de Renda, PIS, Cofins ou FGTS.

Sobre as dívidas previdenciárias, o deputado explica que são provenientes de “questionamentos judiciais por parte das empresas, por entenderem não ser devido”.

Além de se definir, em seu site oficial, como “um dos maiores do Brasil”, o Grupo Newton Cardoso afirma que suas 14 empresas são administradas com “profissionalismo, modernidade e rigor no cumprimento às obrigações tributárias e trabalhistas”. Foi também com firmeza de discurso que, no debate para a aprovação da MP do Refis, no ano passado, o deputado foi ao microfone do plenário e disse que tem absoluta convicção que seu trabalho na relatoria na MP “foi voltado para interesses nacionais, jamais privilegiando qualquer interesse particular”.

Essa matéria é parte do Ruralômetro, ferramenta que monitora como a ação dos deputados federais impacta o meio ambiente e povos do campo.

Consulte o Ruralômetro: 

Fonte – Ana Magalhães, Repórter Brasil de 16 de março de 2018

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