Por Ellen Nemitz · ECO - 18 de dezembro de 2024 - Câmara ressuscitou “jabutis” da…
NPK – Fósforo, a próxima guerra? Depois da água, claro!
Lei do Mínimo = Lei de Liebig (originalmente descrita partir de estudos sobre nutrição vegetal): sob condições de estado constante, o nutriente presente em menor quantidade (concentração próxima à mínima necessária) tende a ter efeito limitante sobre a planta.
Nos últimos séculos, especialmente após a revolução industrial, os recursos naturais do planeta sofreram intensa exploração pelo homem. Isso se deve ao aumento explosivo da população humana e à mudança de seus hábitos. Hoje a população mundial passa de sete bilhões de indivíduos, com estimativa para 2100 de onze bilhões, de acordo com o artigo publicado na revista Science “World population stabilization unlikely this century”, sendo que essa população consome milhares de toneladas de alimentos e outros recursos diariamente.
Para suprir a crescente demanda mundial por alimentos, a produção agrícola de vários países entrou na fase da agroindustrialização, deixando para trás o padrão extensivo tradicional e assumindo um padrão intensivo, no qual a produtividade tornou-se a principal fonte de lucratividade.
Surge assim uma agricultura mecanizada onde as características físicas do solo são mais importantes que as químicas, ou seja, o solo deve funcionar como um bom suporte para as plantas, capaz de sustentar as lavouras e ainda tornar possível a mecanização, sendo, até certo ponto, dispensável uma boa fertilidade natural.
Um bom exemplo dessa situação é a agricultura de larga escala que é praticada no cerrado brasileiro, um dos principais celeiros agrícolas do mundo, mas que só produz com a implementação da adubação e da correção da acidez. Em um artigo publicado em 2012 o renomado pesquisador brasileiro Alfredo Scheid Lopes e colaboradores, estes afirmam que nos solos do Brasil predominam graves limitações para a produção agrícola em termos de baixa fertilidade natural, sendo ainda, ácidos e pobres em nitrogênio disponível (N), fósforo (P), potássio (K), de cálcio (Ca), magnésio (Mg), enxofre (S), boro (B), cobre (Cu), molibdénio (Mo) e zinco (Zn).
Nesse caso, quando o solo não disponibiliza naturalmente os nutrientes em quantidades adequadas, há a possibilidade de elevada produtividade somente com o suprimento dos nutrientes deficitários através de adubação. Nutrientes como fósforo, nitrogênio e potássio são necessários para o crescimento e produção das plantas. O nitrogênio pode ser obtido por meio de fixação biológica ou processos industriais, mas outros nutrientes, como por exemplo, o fósforo é obtido em grande parte através da mineração ou em menor quantidade por reciclagem.
A demanda por fertilizantes no cenário internacional é crescente, em especial pelos fosfatados. A maior procura e a oferta limitada causou um aumento no custo do fosfato de rocha. Em 1961 a tonelada custava cerca de 80 dólares saltando para até 450 dólares em 2008, o preço deste insumo, desde então, têm flutuado, mas agora está em cerca de 700 dólares a tonelada, segundo relatório de 2015 do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).
O mundo é altamente dependente do fósforo como nutriente para produção de alimentos, no entanto, estima-se que a maior mina de fósforo dos EUA estará esgotada em 20 anos e um balanço da vida útil das reservas que podem suprir à agroindústria e à população humana estão limitadas a cerca de 60 a 250 anos. Assim, o equilíbrio geopolítico do poder pode ficar abalado quando nações e corporações começarem a competir pelas reservas remanescentes em lugares como Marrocos.
A FAO – órgão das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação acendeu a luz vermelha em fevereiro de 2011 alertando que oitenta países se encontravam em situação de insegurança alimentar. Essa situação pode se agravar, e muito, com a escassez das reservas de fósforo, quando haverá considerável redução na produtividade agrícola em decorrência da falta desse nutriente (vide Lei do Mínimo), principalmente em lavouras de solos tropicais que tem baixas concentrações de fósforo disponível e no decorrer dos ciclos de culturas pode acabar se esgotando.
Surge então uma equação nada fácil de resolver, em que se percebe um cenário global que projeta uma crise de oferta de fósforo, e consequentemente de alimentos, em um futuro não muito distante, podendo culminar em conflitos entre nações pelo domínio das ultimas reservas ou por solos com capacidade produtiva de alimentos.
Será que esse é o destino da humanidade? Padecer por falta de alimento, recorrer a mecanismos como a guerra para garantir a sobrevivência? De acordo com os relatos na literatura existem meios para evitar mais essa tragédia humana. A solução irá exigir um esforço proporcional à magnitude do problema, por exemplo, estudos realizados no Departamento de Ciência do Solo da Universidade Federal de Lavras (DCS/UFLA) procuram uma alternativa para minimizar a necessidade de altas doses de aplicação de fósforo com o uso de bactérias solubilizadoras desse nutriente, enquanto que um outro publicado na renomada revista Nature em 2015 pelo cientista do solo Ronald Amundson e colaboradores apontam que a diminuição das taxas de perda de nutrientes do solo pela erosão hídrica e a reciclagem dos nutrientes são saídas a considerar. Segundo esses autores deve haver parcerias para desenvolver métodos eficientes de reciclagem de nutrientes e sistemas de redistribuição em ambientes urbanos.
Nessa realidade onde a reciclagem é indicada para suprir os nutrientes do solo é aconselhável incentivar o aproveitamento dos resíduos compostáveis e a produção e consumo local de alimentos, uma vez que diminui a demanda por alimentos produzidos pela agroindústria que fatalmente continuará consumindo os fertilizantes das fontes em esgotamento. A reciclagem do fósforo pode ser tomada como a principal saída para contornar a escassez das reservas desse nutriente e evitar a uma grande guerra mundial motivada pela disputa por este recurso.
Outro problema que preocupa nações é a escassez de água potável no mundo. A água doce é uma pequena fração do total existente e uma diminuta parte dessa fração se encontra em rios e lagos, locais onde normalmente o homem usufrui.
A situação fica mais crítica devido à má distribuição espacial e temporal dos recursos hídricos que faz com que algumas áreas sofram permanentemente com a falta de água. Segundo Claudio Hehl Forjaz em seu livro “Água: Substância da Vida” somente 1% da água da Terra é potável, mas a quase totalidade ou é imprópria para o consumo ou está em inacessíveis geleiras.
A água era vista como um recurso inesgotável e ainda dotada de capacidade de autodepuração de todo tipo de contaminante. Esse pensamento levou à poluição e degradação dos recursos hídricos em todos os continentes do mundo, principalmente nos locais mais populosos e que culturalmente tem a água como destino final dos mais diversos resíduos.
Após séculos de utilização da água sem planejamento os recursos hídricos em todo o Mundo sofreram intensa degradação. Nesse contexto surge a preocupação em usar a água de forma sustentável com a proposta de fóruns internacionais para discutir o assunto após a publicação da Carta Européia da Água, na França em 1968. Os principais eventos que sucederam e que discutiram o uso da água no Mundo foram: a Conferência das Nações Unidas, em Estocolmo, no ano de 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre a Água, no Uruguai no ano de 1977 e a Declaração de Dublin, na Irlanda em 1992, esta alertava que a água é um recurso esgotável e vulnerável.
Durante e após esse período de conscientização de autoridades começaram a surgir leis que passaram a proteger os recursos hídricos em diversos países. No entanto, muitas vezes a cultura arraigada de desobediência às leis e a busca pelo crescimento a qualquer custo colocou em segundo plano a proteção ao meio ambiente. Claudio Hehl Forjaz em seu livro afirma que o preço da prosperidade das nações é muito alto, podendo resultar em escassez de água potável. O mundo está prestes a viver uma crise de grandes proporções, podendo levar nações inteiras ao desespero, quando não às guerras.
O texto “Conflitos por causa da água” publicado na ‘Revista Horizonte Geográfico’ em abril de 2008 relata que nos últimos 50 anos foram registrados 1831 casos de disputas por água entre países, sendo que a maioria foi resolvida sem que evoluísse para conflitos armados. No entanto, em muitos locais a guerra pela água se tornou realidade, é o caso de vários países do Oriente Médio, em partes da Ásia, na África, Índia, China, Bolívia etc. A água atrai a cobiça daqueles que não podem obtê-la com facilidade e passa a ser considerada, cada vez mais, como um produto de valor.
Segundo o relatório da Organização das Nações Unidas ONU de 1992, por volta do ano 2020 a carência de água vai afetar 2/3 da população mundial. Essa situação pode se agravar em anos posteriores levando a conflitos armados pelo uso deste recurso.
Com o crescimento da população mundial que passa a demandar cada vez mais água, aliado ao agravamento das mudanças climáticas, há quem diga que se a humanidade enfrentar a III Guerra Mundial será decorrente da disputa por este recurso, considerado por muitos como a maior riqueza do terceiro milênio.
A falta de água potável para abastecimento humano é um problema atual que já se verifica em várias partes do mundo, e que, se não tratado com seriedade e com a aplicação de todas as tecnologias já adquiridas, só tende a agravar, portanto se tiver que ocorrer uma guerra mundial motivada por um recurso escasso, será primeiramente em função da demanda por água potável.
Fonte – Fábio José Gomes, EcoDebate de 18 de fevereiro de 2016
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