Por Assessoria de Comunicação - Tecpar - 25 de novembro de 2024 O Instituto de…
O fim do fósforo e o fim do mundo como conhecemos
Talvez você não esteja com muita vontade de ler más notícias, de modo que se for este o seu caso, pule para este post aqui.
Caso não seja, prepare-se para um pesadelo, onde você, infelizmente, não vai acordar.
Pode parecer um subtítulo exagerado, mas é fato que se nós não descambarmos para o caos com base em armas de destruição em massa antes, não vamos poder escapar de uma armadilha do destino que está nos esperando logo ali na curva das próximas décadas! A razão disso é que o fósforo do planeta Terra está acabando.
O fósforo, é um recurso finito escasso na Terra e fundamental para a agricultura.
De acordo com alguns pesquisadores, espera-se que as reservas de fósforo da Terra estejam completamente esgotadas no planeta em 50 a 100 anos e o pico de fósforo será atingido em aproximadamente no ano 2030.
A principal fonte de fósforo é na forma de fosfato e no passado, o guano (ou cocô de gaivota) .
O esgotamento do fósforo é mais relevante para o nosso mundo hoje do que o esgotamento do petróleo. O fósforo é um componente importante em fertilizantes, fertilizantes, sem os quais será inútil. Sem fertilizantes, dois terços da população mundial morrerão de fome porque a terra não pode suportar nossa demanda de alimentos.
Não existem alternativas ao fósforo e pior: não há formas sintéticas de criação. Sem novas fontes de fósforo para agricultura, a humanidade enfrentará grandes problemas de fome nos próximos 50-100 anos, e isso é especialmente terrível para países que são dependentes do agronegócio e grandes produtores de alimentos com exportações mundiais, como o Brasil.
Conforme aprendemos na escola, O fósforo (P) é um dos três macronutrientes primários insubstituíveis das plantas, e é um componente vital da célula. Sem fósforo não há vida.
Como eu disse, uma vez que fósforo é vida, o agronegócio moderno é fundamentalmente dependente da existência e disponibilidade desse elemento químico. Esse modelo de agricultura é responsável, pela maior parcela da produção de grãos e outros alimentos que garantem, uma precária segurança alimentar para a humanidade, que está a se expandir com expectativa de, ainda neste século, aumentar em 50% sua população. Cada vez mais, a humanidade se concentra nos meios urbanos e distantes das áreas de produção agrícola, o que torna dificultoso a reciclagem do fósforo contido nos alimentos exportados para as cidades. Os recursos de rochas fosfáticas já mostram sinais de esgotamento das suas reservas em vários países.
Todo recurso natural finito terá seu ponto de nível crítico, ao qual após atingido tenderá a zero. Se não chegamos a esse ponto no petróleo, estamos em vias de chegar nas próximas décadas. Já com o fósforo, provavelmente isso também se dará com impactos muito grandes.
O esgotamento dos recursos da natureza expõe uma questão central para o debate político neste século: O Fim da Era de Crescimento, iniciada no começo do século XIX, com a Primeira Revolução Industrial.
Nos últimos séculos, especialmente após a revolução industrial, os recursos naturais do planeta sofreram intensa exploração pelo homem. Esse foi um claro reflexo da explosão populacional humana no planeta, bem como sua mudança de hábitos. Uma vez que a população mundial ultrapassou os sete bilhões de indivíduos, com estimativa para 2100 de onze bilhões, de acordo com o artigo publicado na revista Science “World population stabilization unlikely this century”, é previsível projetar também o aumento do consumo em milhares de toneladas de alimentos e outros recursos diariamente.
Foi devido ao grande crescimento populacional que o economista Thomas Malthus propôs sua famosa teoria pelo qual a humanidade iria se extinguir por consumir todos os recursos do planeta. Ele chegou a essa conclusão analisando o crescimento populacional e sua projetada curva de consumo. Malthus estaria provavelmente certo se ele não tivesse dado um vacilo fundamental: Esqueceu que nessa projeção, a humanidade encontraria saídas tecnológicas e energéticas que mudariam todas as regras do jogo. Aliás, o malthusianismo, conhecido como a “ciência da desesperança” é geralmente evocada para explicar por que não devemos acreditar piamente em previsão de futuro de economista.
Para suprir a crescente demanda mundial por alimentos, a produção agrícola de vários países entrou na fase da agro industrialização, deixando para trás o padrão extensivo tradicional e assumindo um padrão intensivo, no qual a produtividade tornou-se a principal fonte de lucratividade. Foi dessa maneira que toda uma agricultura mecanizada se desenvolveu, e a compreensão do processo de cultivo evoluiu para tentativa e erro na direção da ciência agronômica.
Hoje sabe-se com precisão científica as características físicas de qualquer solo. E é graças a essa tecnologia aplicada que as propriedades físicas hoje são mais importantes que as químicas em termos de solo, já que é possível enriquecer o solo escolhido através de tratamentos de adubação e correção dos níveis químicos afim de alimentar as lavouras. Por isso podemos dizer que graças a esse avanço tecnológico com o qual Thomas Malthus jamais sonhou, até certo ponto, hoje é dispensável uma boa fertilidade natural.
Um belo exemplo disso ocorre no cerrado do Brasil. O cerrado é hoje um dos principais celeiros agrícolas do mundo, mas que só produz com a implementação da adubação e da correção da acidez. Em um artigo publicado em 2012 o renomado pesquisador brasileiro Alfredo Scheid Lopes e colaboradores, estes afirmam que nos solos do Brasil predominam graves limitações para a produção agrícola em termos de baixa fertilidade natural, sendo ainda, ácidos e pobres em nitrogênio disponível (N), fósforo (P), potássio (K), de cálcio (Ca), magnésio (Mg), enxofre (S), boro (B), cobre (Cu), molibdénio (Mo) e zinco (Zn).
Nesse caso, quando o solo não disponibiliza naturalmente os nutrientes em quantidades adequadas, há a possibilidade de elevada produtividade somente com o suprimento dos nutrientes deficitários através de adubação. Nutrientes como fósforo, nitrogênio e potássio são necessários para o crescimento e produção das plantas. O nitrogênio pode ser obtido por meio de fixação biológica ou processos industriais, mas outros nutrientes, como por exemplo, o fósforo é obtido em grande parte através da mineração ou em menor quantidade por reciclagem.
Fósforo é vida. E é dindim também!
Como a essa altura você ja deve estar supondo, começou uma corrida pela fertilização. A maior procura e a oferta limitada do fertilizante causou um aumento no custo do fosfato de rocha. Em 1961 a tonelada custava cerca de 80 dólares. Em 2008, o preço bateu em 450 doletas! Desde então, têm flutuado, mas agora já bateu em 700 dólares a tonelada, segundo relatório de 2015 do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).
Não há muito para onde correr, na medida em que o mundo é altamente dependente do fósforo como nutriente para produção de alimentos, no entanto, estima-se que a maior mina de fósforo dos EUA estará esgotada em apenas 20 anos. Um balanço da vida útil das reservas que podem suprir à agroindústria e à população humana estão limitadas a cerca de 60 a 250 anos. E a população crescendo, crescendo… Tá imaginando que isso tende a dar merda, né?
Provavelmente isso pode afetar o equilíbrio geopolítico do poder quando nações e corporações começarem a competir pelas cada vez menores reservas remanescentes em lugares como o Marrocos.
O fato é que a coisa não parece bem la no fim do túnel, ao ponto de a FAO – órgão das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação acender uma luz vermelha em 2011 alertando que oitenta países se encontravam em situação de insegurança alimentar. Essa situação pode se agravar, e muito, com a escassez das reservas de fósforo, quando haverá considerável redução na produtividade agrícola mundial em decorrência da falta desse nutriente, principalmente em lavouras de solos tropicais que tem baixas concentrações de fósforo disponível, que provavelmente se esgotarão no ciclo produtivo.
Há quem sustente que poderemos ver um cenário global de baixa oferta de fósforo, e consequentemente de alimentos, em um futuro não muito distante, podendo culminar em conflitos entre nações pelo domínio das ultimas reservas ou por solos com capacidade produtiva de alimentos.
Vários grupos de cientistas estão debruçados nesse problema, tentando descobrir soluções, mas o mesmo é tão complicado que a solução irá exigir um esforço proporcional à magnitude do problema. No momento, a melhor saída apontada foi a da reciclagem. A reciclagem do fósforo pode ser tomada como a principal saída para contornar a escassez das reservas desse nutriente e evitar a uma grande guerra mundial motivada pela disputa por este recurso finito, que inexoravelmente, um dia vai acabar. Como foi com o Guano. Já vimos esse filme.
O esgotamento das reservas de guano
Milhares de anos de cocô de gaivotas e aves marinhas produziu toneladas e mais toneladas de fertilizante rico em fósforo, chamado Guano.
No início de 1800, Alexander von Humboldt introduziu o guano como fonte de fertilizante para a agricultura para a Europa depois de descobri-lo nas ilhas ao largo da costa da América do Sul . É relatado que, no momento da sua descoberta, o guano em algumas ilhas tinha mais de 100 metros de profundidade!
O guano já havia sido usado pelo povo mochense como fonte de fertilizantes por mineração e transporte que retornaram ao Peru por barco. O comércio internacional em guano só começou 1840. No início do século 20, o guano estava quase completamente esgotado, a sorte foi que ele acabou sendo superado com a descoberta do superfosfato.
Então se o fosfato vai acabar, é possível que a unica saída no curto prazo seja reciclar o máximo de fosfato possível e isso invariavelmente passará por criar usinas de beneficiamento do cocô humano e de gado.
Os mais afetados pela disponibilidade reduzida de fertilizantes fosfatados serão a produção de grãos como trigo , arroz e milho . Esses grãos aumentarão seu preço, naturalmente, porque o preço do fertilizante fósforo aumentará. O aumento de preços aumentará o uso de grãos para consumo humano e diminuirá seu uso como forragem para gado e, portanto, diminuirá a produção e o consumo de produtos de origem animal. Sempre haverá escoamento de campos agrícolas e, portanto, a reciclagem de fósforo não pode ser um circuito fechado, em outras palavras será necessária fósforo adicional de alguma fonte, mesmo que todo o estrume de humanos e gado seja reciclado de volta aos campos. Assim, é fato também que só a reciclagem não vai resolver.
Futuro ruim para o Brasil
A modificação genética para desenvolver variedades que requerem menos fertilizantes é outro caminho promissor, que já se percorre. “Nenhuma mágica da engenharia genética produzirá uma espécie que não precise de fosfato”, mas chegará a uma que o consuma em menor quantidade, diz Eurípedes Malavolta, agrônomo e pesquisador do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo (Cena/USP).
O problema no Brasil é que não são usadas tecnologias disponíveis para utilizar melhor o fertilizante, como análise de solo e de plantas, e acaba-se aplicando mais do que o necessário, desperdiçando um bem que “é impossível fazer durar indefinidamente”, lamenta o especialista.
“O excesso de fosfato na plantação faz com que apenas 30% sejam absorvidos pelas plantas e reduz a produtividade”.
A maior parte desse fosfato fica no solo. Outra parte, com a erosão, contamina águas e faz proliferar vegetações aquáticas, prejudiciais para a saúde humana. A absorção de 30% ocorre na primeira semeadura, mas as seguintes podem aproveitar boa parte do fosfato já retido no solo. Porém, por desconhecimento, os agricultores aplicam fosfato todo ano, gerando desperdício e danos ao cultivo que cobrarão seu preço lá na frente.
A semeadura direta, que deixa na terra os resíduos da colheita, fertilizando e retendo umidade no solo, é outra forma de reaproveitar o fósforo
Mas o que joga contra o Brasil é que a concentração das jazidas de fosfato estão nos países do Norte da África, especialmente no Marrocos, que possui cerca de 42% das reservas mundiais, incluindo o Saara Ocidental. A China, com 26%, e os Estados Unidos, com 8%, são outros privilegiados, que consomem muito e não podem exportar tanto quanto o Marrocos.
Se os países árabes perderem a força que exercem no mercado do petróleo, já é dado como certo que manterão o poder com o domínio do mercado do fosfato, que também ficará escasso e caro. O Brasil, com apenas 0,4% das reservas mundiais, depende das importações. Seus maiores fornecedores são Estados Unidos, Rússia e Marrocos.
A importância deste recurso é tal, que há quem já fale em “phosphorus security”, dada a concentração das rochas de fosfato esse pequeno número de países. Segundo “The Times”, os suecos já estão desenvolvendo sistemas que permitam recolher a urina para daí reciclar o fósforo, até porque ao ritmo de evolução dos preços (700% nos últimos 14 meses) não há nenhuma previsão que o panorama melhore.
Assim, é fato que estamos a enfrentar más notícias que podem apontar para um futuro distópico. Mas é sempre recomendável avaliar com cautela essas afirmações alarmistas, porque tal qual Thomas Malthus, outras curvas de previsão do futuro que apontavam escassez e esgotamento de recursos finitos se mostraram errados ou imprecisos para dizer o mínimo, porque são sempre projeções baseados numa janela de realidade específica, que se extrapola para o futuro.
No documento do Clube de Roma que data dos anos sessenta, previa-se que diversos recursos finitos como o petróleo, se esgotariam ainda antes do fim do Século XX. Embora este documento continue a ser citado e elogiado, sabemos que ele falhou totalmente nas suas previsões. Outras previsões anteriores que previam a finitude de uma série recursos minerais também se mostraram erradas, principalmente as feitas na década de 50.
Arautos do apocalipse geralmente esquecem de lembrar que existem concentrações adicionais intermediárias entre 71 000 Mt de reservas identificadas (pela USGS) de fósforo no mundo e os aproximadamente 30.000.000.000 de Mt de outros fósforos disponíveis na crosta terrestre, com a rocha média de 0,1% de fósforo. Claro, é mais caro e mais difícil de obter esse recurso, mas só podemos especular isso com nosso conhecimento e tecnologia de hoje. Ter certeza de como será o futuro com as ferramentas de hoje é o mesmo que um homem do século XVI imaginar o futuro com mais cavalos e carroças.
Esse post foi uma sugestão do Wagner Bragante, Engenheiro Agrônomo, Mestrando em Ciências Ambientais – UFMT
Fonte – Philipe Kling David. Mundo Gump de 24 de fevereiro de 2018
https://jornalggn.com.br/blog/almeida/o-fim-do-crescimento-fosforo-a-proxima-guerra-depois-da-agua-claro
https://www.ecodebate.com.br/2016/02/18/fosforo-a-proxima-guerra-depois-da-agua-claro-artigo-de-fabio-jose-gomes/
Você dominou muito bem o assunto.
Excelente reportagem. O tema foi bem desenvolvido. Parabéns