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Paisagem australiana no sul da Europa

Um dos problemas da chamada “floresta portuguesa” reside sem qualquer dúvida no excesso de eucaliptos (Eucalyptus globulus) em algumas regiões do país.

Esta espécie exótica, proveniente da Austrália, teve o seu período de expansão na segunda metade do século XX e século XXI. De um modo geral, o eucalipto acabou por dominar a vegetação e a paisagem das regiões de maior influência atlântica, principalmente no Norte e Centro, mas também em algumas regiões do Sul do país que, aliás, se encontram agora a arder. A expansão do eucalipto começou por ação dos proprietários privados e empresas de celulose com plantações ordenadas mas massivas, mas acabou por ficar descontrolada e, hoje, o eucalipto nasce sem qualquer intervenção humana, pela germinação das sementes transportadas pelo vento.

A ocorrência de milhares de incêndios nas últimas décadas favoreceu o aumento dos eucaliptais, pois, depois do fogo, germinam e rebentam plantas em muitos locais, dominando o coberto vegetal devido ao seu rápido crescimento. Assim, Portugal assiste ao crescimento de áreas de eucaliptal que marcam a paisagem, retirando espaço às plantas autóctones como o pinheiro, o sobreiro e outras que desaparecem. Cada fogo que ocorre em zonas já dominadas pela espécie acaba por acentuar a dominância da mesma.

Não há dados atuais, mas é mais ou menos consensual que o eucalipto ocupará cerca de 1 milhão de hectares em Portugal, com tendência para aumentar devido ao agressivo carácter invasor da espécie. O atual governo, justiça lhe seja feita, foi o primeiro a reconhecer a existência de um problema e aprovou legislação para tentar travar o aumento da área ocupada pelo eucalipto. A indústria da celulose fez uma enorme pressão para que a referida legislação não fosse aprovada, recorrendo à chantagem, com ameaças de deslocalização da indústria para outros países. Felizmente, o governo não cedeu e a legislação (que ficou conhecida como “anti- eucalipto”) está já em vigor.

As áreas com grande presença de eucalipto têm sido fustigadas por fogos selvagens. Há dezenas de milhares de hectares de área ardida, dado este ter a particularidade de ser prolífero nas chamadas “projeções”, ou seja, no lançamento pelo ar de material incandescente ou a arder que vai cair a distâncias que podem ser superiores a 2 km, desencadeando imediatamente novos incêndios nas imediações, o que na prática se traduz por fogos que se tornam incontroláveis devido ao número de ignições dispersas.

O material incandescente ou a arder que é transportado pelo ar é composto principalmente por folhas e casca, uma vez que esta espécie particular de eucalipto existente em Portugal tem uma casca que se destaca do tronco naturalmente, e que existe em grande quantidade o que torna as “projeções” muito prováveis de acontecer. Podemos citar os exemplos recentes dos incêndios de Águeda, Pedrógão, Oliveira do Hospital e Monchique para exemplificar o descrito.

Outro problema grave está relacionado com as chamadas “espécies lenhosas invasoras”, das quais destaco a árvore conhecida por “mimosa” ou “acácia mimosa” (Acacia dealbata). Esta espécie, também de origem australiana, começou por ser semeada em Portugal por causa da beleza da sua floração e para fixação de taludes. Rapidamente se alastrou por todo o país, criando situações muito graves ao nível da conservação da biodiversidade e do risco de incêndio, sendo o caso mais conhecido o do Parque Nacional da Peneda-Gerês, que tem já alguns milhares de hectares ocupados por esta espécie exótica invasora, o que é perfeitamente visível na zona envolvente da vila do Gerês. O caso da mimosa é preocupante pois nem sequer há dados oficiais sobre a área ocupada pela espécie, mas a Quercus estima que poderá atingir os 60 mil hectares. A mimosa, embora ocupe uma área muito inferior à do eucalipto, tem um comportamento invasor muito mais agressivo, e forma extensos matorrais literalmente impenetráveis que são ao mesmo tempo barreiras intransponíveis para os meios de combate e pasto fértil para as chamas.

Temos, pois, duas espécies com carácter invasor que influenciam o ordenamento do território, o risco de incêndio e a perda de biodiversidade. Estas espécies têm de ser mantidas sob vigilância e têm de ser desenvolvidas políticas para promover a sua substituição por espécies autóctones como o carvalho, o sobreiro ou o pinheiro manso, pelo menos em alguns locais. A tarefa não é fácil e exige vontade política acompanhada de dotação orçamental. Vamos ver qual a resposta ao problema que vai ser dada por este e pelos futuros governos.

João Branco é Presidente da Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza

Foto – Quercus

Fonte – Green Savers de 10 de agosto de 2018

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