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Pesquisadores estimam em R$ 43 bilhões o valor da polinização no Brasil em 2018

Julio Pupim/ Flickr Creative Commons

Foto: Julio Pupim/ Flickr Creative Commons

Cerca de 80% desta quantia está associada a quatro cultivos de grande importância agrícola: soja, café, laranja e maçã. A seguir, informações prestadas pela Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos

Em meio a várias ações para o afrouxamento do uso de agrotóxicos no País, a Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) e a Rede Brasileira de Interações Planta-Polinizador (Rebipp) lançam hoje o Relatório Temático sobre Polinização, Polinizadores e Produção de Alimentos no Brasil e seu respectivo Sumário para Tomadores de Decisão. O documento evidencia a alta diversidade de polinizadores além de alertar para as ameaças provocadas pela redução de florestas e o uso de agrotóxicos. Em 2018, o valor econômico do serviço ecossistêmico de polinização para a produção de alimentos no Brasil foi estimado em R$ 43 bilhões (US$ 12 bilhões). Cerca de 80% desta quantia está associada a quatro cultivos de grande importância agrícola – soja, café, laranja e maçã.

  • As principais ameaças aos polinizadores são: perda de habitat, mudança climática, poluição ambiental, agrotóxicos, espécies invasoras, doenças e patógenos.
  • O uso de agrotóxicos pode causar diversos efeitos negativos aos polinizadores, levando à perda do serviço ecossistêmico de polinização em áreas cultivadas e na paisagem como um todo.
  • 76% das plantas utilizadas para produção de alimentos no Brasil, das 91 que foram analisadas pelo estudo, dependem dos polinizadores. Para estas a ação de polinizadores aumenta, em algum nível, a quantidade e/ou a qualidade da produção agrícola.
  •  Nesse grupo, a dependência da polinização é essencial para 35% (32), alta para 24% (22), modesta para 10% (9) e pouca para 7% (6) das plantas.

O relatório segue os moldes do diagnóstico global polinização, lançado em 2016, pela Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) da ONU. O documento global foi acatado pelos países membros da Convenção da Diversidade Biológica e deu origem à Coalizão de Polinizadores, iniciativa internacional formada por países que apoiam os programas de proteção e uso sustentável dos polinizadores nas políticas públicas e da qual o Brasil ainda não é signatário.

A versão brasileira reuniu, durante um ano e meio, 12 pesquisadores de todo o País para preparar o diagnóstico que envolveu a levantamento de mais de 400 publicações e que foi posteriormente submetido a 11 revisores externos. “O documento nacional foi estruturado de modo a subsidiar futuros programas de integração entre os vários setores da sociedade civil e esperamos que o Estado se sensibilize com esta questão”, afirma Vera Imperatriz, da Universidade de São Paulo, que coordenou o diagnóstico global da IPBES.

A ocasião para o lançamento do relatório é oportuna, segundo Carlos Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas e coordenador da BPBES e do Programa Biota/Fapesp, pois coincide com a discussão da regulamentação e liberação de novos agrotóxicos. “Os polinizadores são de vital importância não só para nossas exportações como para produção de alimentos essenciais para a qualidade de vida dos brasileiros. O País deve avaliar com muita cautela a utilização de substâncias que colocam em risco o enorme benefício que estes animais nos trazem”, argumenta.

Alta diversidade de polinizadores é uma oportunidade

A polinização contribui para a variabilidade genética de plantas, fornece frutos, sementes, mel e derivados, além de envolver um conjunto de conhecimentos tradicionais. Por isso, é considerada um serviço ecossistêmico, ou seja, um benefício decorrente da integridade da natureza para sustentar a vida no planeta, assim como a água, a regulação do clima, ar limpo etc.

Em termos monetários, a polinização representou R$ 43 bilhões em 2018 para o País. Para chegar a este valor, os pesquisadores da Rebipp calcularam o produto da taxa de dependência de polinização pela produção anual considerando 67 cultivos. A soja responde por 60% deste valor, seguida pelo café (12%), pela laranja (5%) e pela maçã (4%).

Das 191 culturas agrícolas utilizadas para a produção de alimentos no país, que se tem conhecimento sobre o processo de polinização, 114 (60%) são visitadas por polinizadores. O diagnóstico analisou ainda o grau de dependência dos polinizadores para 91 cultivos agrícolas e constatou que para 76% (69) a ação de polinizadores aumenta a quantidade e/ou a qualidade da produção agrícola.

A lista de visitantes das culturas agrícolas supera 600 animais, dos quais no mínimo 250 com potencial de polinizador. As abelhas predominam como polinizadores, representando 66% das espécies. Besouros, borboletas, mariposas, aves, vespas, moscas, morcegos e percevejos enriquecem a lista. A diversidade de polinizadores é fundamental para a efetividade da polinização, afirma o relatório. E a manutenção do ambiente natural próximo ao cultivo ainda é a principal forma de garantir esta diversidade, na medida em que supre a oferta de recursos e abrigo durante o ano.

No caso da berinjela, por exemplo, a presença do polinizador específico gera um incremento de cerca de 180g por unidade no produto final, explica Kayna Agostini, professora da Universidade Federal de São Carlos e coordenadora do estudo. “Isso, na prateleira, faz diferença para o produtor”, pontua a coordenadora. Por esta razão, nem sempre apenas colocar colmeias de abelha europeia nas plantações é suficiente para resolver a ausência de polinizadores nativos.

O relatório aponta o manejo de polinizadores nativos como uma oportunidade ainda pouco explorada. O país possui uma grande diversidade de espécies sem ferrão que, além de produzirem méis de qualidade e de alto valor agregado, proveem a polinização de diversos cultivos agrícolas. De acordo com o documento, apenas 16 espécies são manejadas. E há muito o que se aprender, neste sentido, com as práticas de manejo associadas ao conhecimento local e indígena.

  •  Os principais polinizadores são: abelhas (66,3%, 165 espécies), besouros (9,2%, 23 espécies), borboletas (5,2%, 13 espécies), mariposas (5,2%, 13 espécies), aves (4,4%, 11 espécies), vespas (4,4%, 11 espécies), moscas (2,8%, 7 espécies), morcegos (2%, 5 espécies) e hemípteros (0,4%, 1 espécie).
  • O manejo de polinizadores para aumentar a produção de alimentos ainda é incipiente: é realizado em apenas 16 espécies, sendo 12 de abelhas nativas sem ferrão.
  • 609 animais foram registrados como visitantes florais de plantas cultivadas ou silvestres no país. Destes, 41% (249 espécies) tem potencial para atuar como polinizadores.

A urgência de uma política de proteção para polinizadores

São múltiplas as causas que ameaçam o serviço ecossistêmico de polinização: perda de habitat, mudanças climáticas, poluição ambiental, agrotóxicos, espécies invasoras, doenças e patógenos. Essas vulnerabilidades colocam em risco a produção de alimentos e a conservação da biodiversidade.

Dentre os poluentes ambientais, os agrotóxicos causam mais preocupação. Os efeitos das doses destas substâncias variam muito, podendo levar à morte ou atuar como repelentes, ressalta o relatório. Efeitos tóxicos subletais, como desorientação do voo, perda da habilidade dos polinizadores para encontrar recursos florais, menos descendentes, entre outros, já estão documentados na literatura principalmente para a abelha europeia. O impacto dos efeitos dos agrotóxicos nas espécies nativas é uma lacuna importante que precisa urgentemente ser estudada, advertem as coordenadoras do diagnóstico.

“Já existem estudos apontando moléculas menos nocivas ao ambiente e com maior efetividade que podem atuar na transição para uma produção mais sustentável”, conta Agostini. Para a pesquisadora, outro ponto que preocupa é a ausência da mitigação dos efeitos do uso destas substâncias.

A falta de evidências sobre os efeitos dos agrotóxicos nos polinizadores e para a saúde humana parece não ter importância quando se considera a liberação destas substâncias, salienta Marina Wolowski, professora da Universidade Federal de Alfenas e coordenadora do relatório, se referindo ao registro de 28 agrotóxicos e princípios ativos pelo Ministério da Agricultura no último dia 10 de janeiro. Entre eles está um aditivo inédito no país, o sulfoxaflor, que já causa polêmica nos Estados Unidos por estar associado ao extermínio de abelhas.

“Infelizmente o Brasil atualmente caminha em sentido contrário ao da comunidade internacional ao persistir no uso de agrotóxicos já banidos na maioria dos outros países”, afirma Braulio Dias, professor da  UnB e Ex-Secretário Executivo da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica. Dias considera que transferir a responsabilidade de aprovação de agrotóxicos exclusivamente para o Ministério da Agricultura, conforme proposto, não vai beneficiar o meio ambiente, os polinizadores, nem a saúde de agricultores e consumidores.

Para Blandina Viana, professora da UFBA e uma das autoras brasileiras do diagnóstico global da IPBES, é preciso criar políticas que visem apoiar sistemas agrícolas diversificados, infraestrutura verde, mas também apoiar redes de pesquisa e extensão transdisciplinares, projetos de ciência cidadã, e comunicação pública do conhecimento cientifico nessa área.

Em 2016, cerca de 150 pesquisadores, motivados pelo relatório global da IPBES, enviaram a Carta de Catalãoao Ministério do Meio Ambiente propondo a elaboração de uma Política Nacional para uso e conservação de polinizadores e do serviço de polinização. Entretanto, a iniciativa ainda não teve eco dentro do governo. “Se não tivermos a proteção dos polinizadores, os produtores terão que investir financeiramente em um serviço que é oferecido gratuitamente pela natureza”, conclui Agostini.

Fonte – Página 22 de 06 de fevereiro de 2019

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