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Por madeira e carne, desmatadores avançam sobre o Xingu

Madeira ilegal na estrada que liga Uruará ao porto Maribel, utilizada para escoamento de madeira retirada da TI Cachoeira Seca|Juan Doblas-ISA. 

Mais de dez mil hectares de floresta foram derrubados em julho na Bacia do Xingu. Pecuária extensiva e degradação ambiental são as principais causas

O avanço da pecuária e da retirada ilegal de madeira coloca em risco a integridade territorial da Bacia do Xingu, entre os estados do Pará e Mato Grosso. Durante o mês de julho foram desmatados mais de 10 mil hectares de floresta, preocupando indígenas, ribeirinhos e seus parceiros.

Apesar da queda relativa em relação aos cinco meses anteriores – em que assistimos a um aumento exponencial do desmatamento, com um pico de 24 mil hectares desmatados em junho – , os números merecem atenção. Mais de 3 mil hectares de florestas foram destruídos no interior de Áreas Protegidas, entre Terras Indígenas e Unidades de Conservação em razão de atividades ilegais.

TI Cachoeira Seca em risco

Terra Indígena (TI) Cachoeira Seca do Iriri, de posse imemorial do povo Arara, viu aumentar em mais de seis vezes o desmatamento entre os meses de junho e julho, com 650 hectares. Desde janeiro foram desmatados 1.096 hectares no interior da área protegida, que tem o triste registro de ser a TI mais desmatada no país nos últimos anos.

A maior parte das áreas abertas se encontra nas proximidades da cidade de Uruará e são extensões de pastos já existentes. Para além da destruição da floresta para a pecuária, foram registradas grandes áreas degradadas para a extração ilegal de madeira nas proximidades da cidade de Uruará.

Segundo Juan Doblas, especialista em geoprocessamento do ISA, a relativa calma nos meses precedentes pode ser explicada por uma trégua dada pelos pecuaristas da região face ao avanço do cadastramento de ocupantes não indígenas. “Nesse contexto, a volta do desmatamento assinala uma ‘quebra’ dessa trégua e a possibilidade de novas invasões no território dos Arara”, aponta Doblas.

A desintrusão da área é uma condicionante da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte que ainda não foi cumprida. Esse processo faz parte de um plano de vigilância e fiscalização que também deveria ter sido implementado antes da construção da usina, em 2009, mas ainda não saiu do papel. [Saiba mais]

Invasões e exploração de madeira na TI Cachoeira Seca colocam atividades produtivas, com castanha, em risco|Leonardo de Moura-ISA

Boi ilegal

O SIRAD X detectou um total de 15.134 ha de floresta derrubada em 2018 no interior da Área de Preservação Ambiental (APA) Triunfo do Xingu desde o início do ano – destes, 1.911 apenas em julho. Esse número coloca a APA na Unidade de Conservação mais desmatada na bacia do Xingu.

O desmatamento de grandes extensões de floresta em um curto período de tempo mostra, segundo Doblas, “o poder e a capacidade de mobilização do setor agroindustrial na APA”. Por exemplo, neste ano, em uma única empreitada, foram desmatados 800 hectares de floresta. [Saiba mais].

São Félix do Xingu, um dos municípios que estão no perímetro da APA, possui o segundo maior rebanho bovino do Brasil e a área protegida constitui uma enorme reserva de recursos. O desmatamento acontece em sintonia com o aumento das exportações brasileiras de carne e o fortalecimento das grandes cadeias de frigoríficos. A implementação completa do chamado ‘TAC da Carne’, que pretende controlar a origem dos animais nos frigoríficos paraenses, é condição necessária para impedir a destruição das florestas na APA.

O TAC é um instrumento importante para inibir a comercialização de carne proveniente de propriedades rurais que desrespeitem a legislação ambiental e trabalhista. As últimas auditorias apontaram que, apesar do avanço no monitoramento ambiental nessa cadeia produtiva, 18% da movimentação de gado comercializado tem origem ilegal.

Desmatamento na APA Triunfo do Xingu|Juan Doblas-ISA

Bruno Marianno, membro da Câmara Técnica da Auditoria (CTA) do TAC da Pecuária e Protocolo Verde dos Grãos, explica que as áreas produtoras ilegais dentro da APA devem ser embargadas e multadas e os frigoríficos que estabelecem relações de compra com elas devem sofrer sanções dos órgãos ambientais e MPF. “Adicionalmente, deve-se realizar auditorias independentes constantes e fornecer assistência técnica rural para a melhoria de índices de produtividade, favorecendo a recuperação de áreas já desmatadas e inibindo novos desmatamentos”, conta.

Há, segundo Marianno, três desafios para a implementação efetiva do TAC: monitoramento mais eficiente da origem do gado, regularização ambiental das áreas e ações punitivas àqueles produtores e frigoríficos que insistam em agir ilegalmente.

Velho garimpo, nova ameaça

Em julho foram detectados pequenos polígonos de desmatamento na Terra Indígena Baú, no Pará. O padrão, pequenas aberturas ao longo do curso do rio, corresponde à exploração de minérios, prática ilegal que coloca em risco o território do povo Kayapó.

O monitoramento revelou que a área aberta coincide com um antigo garimpo chamado de “Coringa”. Segundo Rodrigo Balbueno, do Instituto Kabu, a área voltou a ser intensamente explorada em função do alto preço do ouro e da falta de ações mais definitivas para coibir a atividade ilegal.

Localizado na bacia do rio Curuá, o garimpo mineração aumenta a instabilidade em uma região já bastante tensionada. “A situação do garimpo Coringa causa bastante preocupação a todos que se preocupam com a condição de vida das comunidades indígenas e com a proteção de seus territórios”, alerta Balbueno.

Garimpo Coringa é reaberto na TI Baú|Gustavo Machado-Instituto Kabu

Fonte – Isabel Harari, Instituto Socioambiental de 27 de agosto de 2018

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