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Projeto que desprotege Escarpa do Paraná é inconstitucional

Cânion do Guartelá no Paraná. Ele é um dos trechos mais lindos da Escarpa Devoniana (Foto: Divulgaçao - Observatório de Justiça e Conservação)Cânion do Guartelá, no Paraná. Ele é um dos trechos mais lindos da Escarpa Devoniana (Foto: Divulgação – Observatório de Justiça e Conservação)

O projeto, que tramita na Assembleia Legislativa, pode acabar com a proteção de um monumento natural de 260 quilômetros de extensão, com rios, cavernas e florestas

Tramita pela Assembleia Legislativa do Paraná um projeto de lei que pode acabar com a proteção de um monumento natural brasileiro único no mundo. O estado do Paraná é cortado por uma formação rochosa, uma espécie de degrau colossal, que separa o primeiro do segundo plantalto, marcado por trechos de vegetação única – e já bastante pressionadas por práticas de agricultura, mineração e plantio de espécies exóticas – como Florestas com Araucária e campos naturais, além de cavernas (algumas desconhecidas), rios e cachoeiras. É a Escarpa Devoniana. Essa beleza hoje tem status de área de proteção ambiental (APA), o que restringe algumas atividades mais destruidoras. Mas a proposta de lei acabaria com dois terços da APA, deixando a escarpa vulnerável.

O potencial da Escarpa é tão grande que recentemente um grupo de pesquisas investigou apenas 1 quilômetro da formação geológica e descobriu dez cavernas novas. A formação geológica tem 260 quilômetros de extensão, com várias atrações turísticas. As rochas que a sustentam foram formadas no perído devoniano, há 400 milhões de anos.

Apesar desse potencial, o projeto de desproteção da Escarpa segue na Assembleia. O projeto já foi votado pela comissão de Constituição e Justiça no dia 13 de dezembro do ano passado. No dia 10 de março houve uma audiência pública em Ponta Grossa, com muito tumulto, porque estudantes e demais pessoas interessadas em acompanhar as discussões foram impedidas de entrar no Teatro Ópera, onde o encontro o ocorreu, por falta de espaço. Agora, o projeto está nas mãos da comissão de Meio Ambiente. Depois, ainda será avaliado pela comissão de Agricultura e Cultura.

O projeto é inconstitucional, segundo Alexandre Gaio, promotor de justiça do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Proteção ao Meio Ambiente, Habitação e Urbanismo do Ministério Público do Estado do Paraná. Para ele, mesmo que os deputados do Paraná aprovem a lei, há espaço para vários recursos.

ÉPOCA – O Projeto de Lei 527/2016, que muda o status de conservação da APA da Escarpa Devoniana, é inconstitucional?
Alexandre Gaio – O Projeto de Lei 527/2016, que pretende reduzir a extensão da delimitação da APA da Escarpa Devoniana para apenas 32% de sua área original, caso aprovado e sancionado em lei, seria inconstitucional. Primeiro, em razão de se tratar de proposição que não observou os requisitos técnicos e procedimentos participativos inerentes à alteração de limites de unidades de conservação. Além disso, em razão do evidente retrocesso na proteção ambiental, na medida em que diminuiria drasticamente o grau de proteção ambiental em cerca 68% de sua extensão, equivalente a 266.000 hectares. Ademais, o projeto de lei, caso aprovado, negaria os compromissos assumidos pelo Brasil com a preservação dos recursos naturais e da biodiversidade, colocando em risco importantes ecossistemas relacionados à Escarpa Devoniana.

Manifestação contra a aprovação da lei que desprotege a Escarpa do Devoniano (Foto: Gabriel Ramos de Lima - Divulgação)Manifestação contra a aprovação da lei que desprotege a Escarpa Devoniana (Foto: Gabriel Ramos de Lima – Divulgação)

ÉPOCA – Caso o projeto seja aprovado pela Assembleia Legislativa do Paraná, ele pode ser barrado judicialmente?
Gaio – Mesmo que o projeto de lei seja aprovado pela Assembleia Legislativa do Paraná, ele pode ser vetado pelo governador do estado em controle preventivo de sua constitucionalidade. Na hipótese de ser aprovado pelos deputados estaduais e sancionado pelo governador do Paraná, pode haver a propositura de medidas judiciais que questionem sua constitucionalidade, tanto por meio do controle concentrado, via ação direta de inconstitucionalidade, quanto por meio do controle difuso, via ação civil pública de proteção ao meio ambiente.

ÉPOCA – Alguma instância federal pode questionar essa mudança no status de proteção da APA da Escarpa?
Gaio – Embora a APA da Escarpa Devoniana seja uma unidade de conservação de uso sustentável estadual, eventual aprovação do projeto de lei pode ser questionada junto ao Supremo Tribunal Federal pela Procuradoria-Geral da República ou por algum partido político com representação no Congresso Nacional ou entidade de classe de âmbito nacional.

ÉPOCA – Se o Projeto de Lei 27/2016 for considerado inconstitucional, seria possível um novo projeto com ligeiras mudanças e mesmo teor voltar à Assembleia mais tarde?
Gaio – Essa é uma questão complexa, porque envolve o equilíbrio e a independência de atuação dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Embora tecnicamente não se possa falar em vinculatividade da decisão que declara a inconstitucionalidade em relação à nova atuação do Poder Legislativo, não há como olvidar, por outro lado, que pode haver um impacto nas futuras decisões do legislador. Não se pode olvidar que também há um conjunto de técnicas jurídicas que podem ser empregadas pelos tribunais para modular os efeitos das decisões em controle de constitucionalidade, os quais afetam de maneiras distintas seus destinatários e terceiros. Além disso, um pronunciamento dessa natureza constitui sempre um precedente que, se vincula apenas as partes num caso concreto, direcionará a interpretação jurídica futura e poderá sempre ser reacionado em situações análogas de descumprimento da Carta Magna brasileira.

Cachoeira do rio Pedregulho, uma das belezas naturais da Escarpa (Foto: divulgação - Observatório de Justiça e Conservação)Cachoeira do Rio Pedregulho, uma das belezas naturais da Escarpa (Foto: Divulgação – Observatório de Justiça e Conservação)

Fonte – Alexandre Mansur, Blog do Planeta de 05 de abril de 2017

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