Há mais de 7 bilhões de pessoas na Terra. Pavel Novak/ Wikimedia Commons
Tem gente que não acredita que o funcionamento geológico e biológico do planeta anda sendo profundamente alterado pela ação dos seres humanos. Para essas pessoas, o impacto do Homo sapiens pode até ser considerável em escala local, mas jamais seria significativo em escala global. Peço licença para discordar e apresento alguns números que deveriam ser mais conhecidos.
1) População: essa deveria ser óbvia, mas não custa ressaltar. Com mais de 7 bilhões de Homo sapiens caminhando pela Terra neste exato momento, alcançamos um nível populacional jamais sonhado por qualquer outra espécie de mamífero de grande porte. Os únicos bichos de tamanho igual ou superior ao humano que se aproximam da nossa exuberância demográfica são os que nós criamos (1,5 bilhão de bois, 1,1 bilhão de ovelhas, 1 bilhão de cabras).
2) Produtividade primária: eis um termo bem menos intuitivo do que “população”, mas igualmente importante. Produtividade primária é como os ecólogos designam a capacidade que certas criaturas têm de transformar energia derivada de fontes não vivas (em geral, a luz solar) em massa viva. É a mágica que as plantas e muitos micro-organismos fazem, e dela depende todo o resto da vida –eu e você, no fundo, não passamos de parasitas de plantas.
A invenção da agricultura e das demais atividades que fornecem comida e matéria-prima de origem biológica para a nossa espécie corresponde à capacidade humana de se apropriar da produtividade primária da Terra. Quão eficientes temos sido nisso? Muito –cálculos mais recentes indicam que hoje nós usamos 25% da produtividade primária do globo. Em outras palavras, um quarto de tudo o que a vida produz vai para a nossa conta bancária hoje.
3) Concreto “y otras cositas más”: a explosão da nossa capacidade tecnológica nos últimos dois séculos tem um subproduto curioso: a criação, em quantidades elevadas, de materiais que jamais foram produzidos por fenômenos naturais ou por outras espécies. É o caso do concreto, originalmente uma invenção dos velhos romanos, que a civilização global de hoje ama de paixão. Ama tanto que, nos últimos 20 anos, produziu concreto suficiente para cobrir cada metro quadrado do planeta com 100 gramas do material. Ou o alumínio na forma metálica pura. Ou o plástico, que você certamente é capaz de enxergar pra tudo quanto é lado. Se todos os humanos sumissem por um passe de mágica e uma nave alienígena pousasse aqui, seus tripulantes seriam capazes de deduzir a existência pregressa de uma civilização tecnológica só com base na presença de tais materiais.
4) Gases-estufa: feito um cobertor planetário, são os responsáveis por reter perto da superfície da Terra o calor trazido pela luz solar e, portanto, têm papel crucial no clima. O mais importante deles, o CO2, hoje tem uma concentração de 400 p.p.m (partes por milhão) na atmosfera.
Ocorre que essa concentração era de 280 p.p.m. antes que começássemos a bombear loucamente CO2 na atmosfera por meio da queima de combustíveis fósseis, a partir do século 19. Faz pelo menos 1 milhão de anos que não se via tanto gás carbônico no ar. É óbvio que isso fará a Terra esquentar –como temos visto.
Independentemente da sua coloração ideológica, os quatro pontos acima são fatos, não opiniões. Podemos discutir o que fazer a respeito –mas não fazer nada não me parece a melhor das ideias.
Reinaldo José Lopes é jornalista de ciência com graduação, mestrado e doutorado pela USP. É autor do blog “Darwin e Deus” e do livro “Os 11 Maiores Mistérios do Universo”. Escreve aos domingos, a cada 2 semanas.
Fonte – Folha de S. Paulo de 02 de julho de 2017
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