Por Jean Silva* - Jornal da USP - 1 de novembro de 2024 - Tucuruvi,…
Racionamento é desastre anunciado
Se os enormes potenciais hidrelétrico, eólico, fotovoltaico e bioenergético disponíveis no Brasil fossem aproveitados criteriosamente, toda a energia consumida no país poderia vir de fontes renováveis e não poluidoras.
No entanto, a presidente Dilma Rousseff, confirmando a sua total ignorância em matéria de energia, vetou a entrada de fontes renováveis (exceto a hidráulica) na matriz prevista no Plano Plurianual 2016-2019, desabonando assim o compromisso que assumiu na COP 21, no final do ano passado. Ignorância ou interesse em não mudar a matriz energética, devido a interesses da quadrilha?
Embora as vazões dos rios brasileiros estejam caindo ano a ano, cerca de 70% da energia elétrica brasileira ainda vem de usinas hidrelétricas. A presente recessão implica uma queda na demanda de eletricidade que nos livra de racionamentos. Uma possível recuperação da economia, no entanto, será dificultada por frequentes apagões.
As bacias dos rios São Francisco, Paraíba, Tietê, Paraná e Iguaçu são devastadas pela pecuária, pelas plantações de soja e cana e pelas serrarias. As mudanças climáticas comprometem ainda mais suas vazões.
No caso do São Francisco, a situação é especialmente grave. Sua nascente, na serra da Canastra, em Minas Gerais, está devastada, assim como as matas que margeavam os rios da região. Essa é uma das causas da escassez de água, que já aflige algumas cidades. Todavia, não se vê nenhum dignitário falar do desastre anunciado que será a perda destas extraordinárias riquezas: a abundância de água e de hidreletricidade.
Em vez de agirem para preservar as bacias hidrográficas, mediante estímulos ao reflorestamento das nascentes e margens dos rios, o governo e as empreiteiras agravam o quadro, insistindo no projeto de transposição de águas do São Francisco.
Atualmente, o fluxo médio deste rio, ao longo do ano, é da ordem de 2.900 m³/s (metros cúbicos por segundo) mas, durante a estação seca, é de apenas 1.000 m³/s. O projeto prevê a retirada de 280 m³/s, portanto, durante esta estação, a transposição “sangrará” 28% do fluxo de um rio moribundo.
Não contente com isso, o governo pensa em implantar centrais nucleares, precisamente quando esta opção é abandonada por países da vanguarda tecnológica, como Alemanha, Bélgica, Suíça e Japão, que reativou apenas 3 centrais nucleares, das mais de 50 que operavam antes da catástrofe de Fukushima.
Os adeptos da opção nuclear (como eu já fui, no passado) apontam a intermitência dos ventos e das radiações solares como desvantagem das fontes renováveis.
Ocorre que o aproveitamento das fontes renováveis pode ser muito aperfeiçoado, começando pela implantação de malhas inteligentes para interligar usinas hidrelétricas com parques eólicos e instalações fotovoltaicas, permitindo que as energias eólica e fotovoltaica fiquem parcialmente “armazenadas” nos reservatórios hidráulicos.
Com isso, aumenta o fator de capacidade do sistema interligado e compensa a intermitência dos ventos e das radiações solares.
Como uma carteira de ações na bolsa de valores, a produção conjunta de todos os parques varia menos do que as produções de cada parque, isoladamente.
Por fim, a eficiência dos painéis solares e das turbinas eólicas pode ser melhorada.
Fonte – Joaquim Francisco de Carvalho – doutor em energia, foi engenheiro da CESP – Companhia Energética de São Paulo, diretor da Nuclen (atual Eletronuclear) e pesquisador associado ao Instituto de Energia e Ambiente da USP. Folha de S.Paulo / Brasilagro de fevereiro de 2016
Imagem – Book’em
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