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Sem chuva, nível do Cantareira preocupa vizinhos e comerciantes

Foto: Danilo Verpa

Sistema deve terminar mês com precipitação 20 vezes menor que média

O sistema Cantareira deve terminar julho com só 2,5% (20 vezes menos) da média histórica de chuva para o período (48,7 mm) e a preocupação de que a seca atinja o reservatório é grande entre moradores e comerciantes das margens.

O aposentado Marcos da Silva Pinto, 63, vive ao lado da represa Jaguari-Jacareí, a maior do sistema, em Bragança Paulista (a 85 km de SP), onde tem um loteamento. Ele conta que já são três meses sem chuva significativa, o que fez morrer até as mudas de árvores que havia plantado no local.

O que mais o assusta é que o reservatório chegou com nível abaixo do que era esperado para o início do inverno. “É preocupante. Acho que vamos chegar de novo no volume morto. Faltou controlar mais a distribuição, quando choveu.”

O aposentado diz que conta com um poço de onde vem a água para seu consumo, mas que teme o desabastecimento longe dali. “Não gostaria de estar na pele do pessoal que mora no 15º andar de um prédio em São Paulo”, fala.

Na represa de Atibainha, em Nazaré Paulista (a 64 km de SP), a apreensão também é grande. “Se continuar assim por mais quatro meses, vai complicar. A gente depende dos clientes das marinas”, diz o comerciante Rodrigo Lisboa, 21, que divide com o pai um restaurante na cabeceira de uma ponte da rodovia Dom Pedro 1º.

Em um ano, o sistema perdeu água suficiente para abastecer a Grande SP por um mês e meio —23,3% da capacidade desde julho de 2017, de 628 bilhões para 399 bilhões de litros.

Para piorar, as previsões da meteorologia para a primavera não animam. “A temperatura estará entre normal e um pouco acima do normal, o que aumenta o consumo de água. E a chuva entre normal e um pouco abaixo do normal. Pela previsão, tem que ter cautela”, diz o meteorologista do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) Marcelo Schneider.

O empresário Sidney Trindade, 54, tem uma marina na represa Jaguari-Jacareí. Há quatro anos, durante a crise hídrica, viu quase dois terços dos 197 barcos que tinha no local irem embora, junto com 80% de seu faturamento.

Precavido, Trindade passou a diversificar suas atividades para não depender exclusivamente da água. Investiu em hotelaria, eventos corporativos e abriu espaço para festas. Apesar de mais bem preparado, ele espera que o cenário desolador da seca não surja novamente.

“Está começando a ficar preocupante, mas ainda não é uma situação desesperadora”, diz Trindade, que aponta queda de 2,5 m no nível atual, em comparação com igual período de 2017.

O empresário é guardião de uma coleção de fotos que mostram a represa morrendo em meio à crise e se recuperando aos poucos, posteriormente. Ele diz que a população precisa economizar água para evitar o pior. “Achava que só iria acabar a água se estourasse a barragem. E, na crise, quase acabou.”

Especialista em recursos hídricos e professor de engenharia mecânica da Universidade Federal de Itajubá (MG), Carlos Barreira Martinez afirma que a possibilidade de uma nova crise é real.

“Dizer que não existe o risco é uma conversa política para tentar acalmar a população”, diz. “Não sabemos se estamos no meio de um ciclo de longo prazo em que as vazões estarão menores”, afirma. Martinez, porém, diz que a ameaça é permanente. “Se pedisse para apostar, diria que nos próximos cinco ou dez anos essa será uma constante”, afirma.

Coordenadora de engenharia ambiental da Escola Politécnica da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Monica Pertel afirma que o problema é crônico e que a chance de a Grande São Paulo voltar a enfrentar uma nova crise hídrica é alta.

“A chuva apaga a memória da seca. Choveu e a gente esquece o que aconteceu de ruim naquela época. A probabilidade [de acontecer uma nova crise] é muito grande”, diz.

Sabesp diz ter um sistema mais robusto, com mais interligações e maior capacidade de tratamento de água do que antes da crise hídrica entre 2014 e 2015.

“Foram 36 grandes obras entregues pela Sabesp, além de 1.000 intervenções de pequeno e médio portes nos últimos anos, que garantem mais água para a população”, diz.

“A entrada de água nas represas, principalmente a partir de abril, no Sistema Cantareira, tem ficado muito próxima das mínimas já registradas. Por isso é importante que os moradores economizem água.”

O governo estadual, sob gestão Márcio França (PSB), diz que pretende fazer campanha de utilidade pública para uso racional da água. Segundo o governo, “hoje todo o sistema é mais capaz de responder a períodos de escassez aguda de chuvas, que é o que estamos vivendo agora”.

Fonte – William Cardoso, Folha de S. Paulo de 26 de julho de 2018

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