Por Ellen Nemitz · ECO - 18 de dezembro de 2024 - Câmara ressuscitou “jabutis” da…
Seu telefone nasceu sobre uma montanha de resíduos tóxicos
À medida que aumenta nossa avidez por tecnologia, o risco ao meio ambiente se agrava. Na última década houve 40 transbordamentos de resíduos de metais usados na fabricação de celulares
Daqui até 2020 haverá cerca de cinco bilhões de pessoas no mundo que usarão um smartphone (ou telefone inteligente). Cada dispositivo é fabricado com numerosos metais preciosos e muitas de suas principais funcionalidades não seriam possíveis sem eles. Alguns destes metais, como o ouro, são bem conhecidos, mas outros, como o térbio, parecem algo estranho.
A extração destes metais é uma atividade fundamental sobre a qual se baseia a economia mundial moderna. Mas o custo ambiental pode ser enorme, provavelmente muito maior do que imaginamos. Vamos examinar os principais metais empregados na fabricação de smartphones, o uso que eles têm e o custo ambiental de extraí-los do solo.
O ferro (20%), o alumínio (14%) e o cobre (7%) são os três metais mais comuns em um smartphone médio. O ferro é usado nos alto-falantes, nos microfones e nas carcaças de aço inoxidável. O alumínio é uma alternativa leve ao aço inoxidável e também aparece na fabricação do vidro resistente usado nas telas desses dispositivos. O cobre é empregado em circuitos elétricos.
No entanto, a extração destes metais da terra no processo de mineração produz enormes quantidades de resíduos sólidos e líquidos, que normalmente são armazenados em imensos reservatórios que podem abarcar superfícies de vários quilômetros quadrados. Os vazamentos desastrosos de resíduos de mineração ocorridos nos últimos anos evidenciam o perigo de se aplicar métodos de construção inadequados e métodos de supervisão frouxos.
O maior derramamento registrado ocorreu em novembro de 2015, quando, após o rompimento de uma barragem em uma mina de ferro no Estado de Minas Gerais, cerca de 33 milhões de metros cúbicos de resíduos de alto teor de ferro foram parar no rio Doce (o suficiente para encher 23.000 piscinas olímpicas). Os resíduos inundaram cidades vizinhas, provocaram a morte 19 pessoas e percorreram 650 quilômetros até chegar ao Oceano Atlântico 17 dias depois.
Esse foi um dos 40 vazamentos de resíduos da mineração nos últimos dez anos, e as consequências ecológicas e humanas a longo prazo ainda são amplamente desconhecidas. Em suma, o que é certo é que, à medida que aumenta nossa avidez por tecnologia, os reservatórios de resíduos de mineração crescem em número e tamanho e, portanto, o risco de rompimento também aumenta.
Destruição de ecossistemas
É frequente também o uso de ouro e estanho em smartphones. A extração desses metais é a causa de graves desastres ecológicos que se estendem desde a Amazônia peruana até as ilhas tropicais da Indonésia.
“Os valiosos metais usados na fabricação dos smartphones são um recurso finito. Segundo estimativas recentes, alguns se esgotarão nos próximos 20 a 50 anos”
Nos telefones celulares, o ouro é usado principalmente para fabricar conectores e cabos. A mineração de ouro é uma das principais causas do desmatamento na Amazônia. Além disso, a extração de ouro gera resíduos de alto teor de cianeto e mercúrio, duas substâncias altamente tóxicas que podem contaminar a água potável e a pesca, o que tem sérias repercussões na saúde humana.
Na área eletrônica o estanho é usado na soldagem. O óxido de índio e estanho é usado para aplicar um revestimento fino, transparente e condutor às telas dos smartphones, responsável pela função de tela sensível ao toque. Os mares ao redor das ilhas Bangka e Belitung, na Indonésia, fornecem cerca de um terço da oferta mundial deste metal. No entanto, a dragagem em larga escala do fundo do mar para extrair terras de alto teor de estanho destruiu seu valioso ecossistema de recifes de coral, e o declínio do setor pesqueiro causou problemas econômicos e sociais.
O lugar mais contaminado do planeta?
O que torna o seu telefone inteligente? A inteligência do celular se deve aos componentes feitos de terras raras, um grupo de 17 metais que recebem nomes estranhos, como praseodímio, e que são extraídos principalmente na China, Rússia e Austrália.
As terras raras, chamadas com frequência de metais tecnológicos, são fundamentais para o design e a funcionalidade dos smartphones. A nitidez dos alto-falantes, os microfones e a vibração do dispositivo são possíveis graças a motores e ímãs pequenos e potentes fabricados com neodímio, disprósio e praseodímio. E térbio e disprósio são usados para produzir as cores vivas da tela do telefone.
A extração das terras raras é uma atividade difícil e poluente, que em geral envolve o uso de ácidos sulfúrico e fluorídrico resulta na produção de enormes quantidades de resíduos muito tóxicos. Talvez o exemplo mais perturbador do custo ambiental de nossa ganância para o smartphone, e o que mais nos convida a pensar, seja o lago mundial de lixo tecnológico localizado em Baotou (China). Este lago artificial foi criado em 1958 e acumula lodo tóxico derivado de operações de tratamento de terras raras.
Os valiosos metais usados na fabricação de smartphones são um recurso finito. De acordo com estimativas recentes, algumas terras raras se esgotarão nos próximos 20 a 50 anos, o que nos leva a pensar se ainda haverá smartphones por essa época.
Para reduzir o impacto ambiental desses dispositivos, é necessário que os fabricantes ampliem a vida útil dos produtos, tornem a reciclagem mais fácil e sejam claros sobre como obtêm seus metais e quais os efeitos ambientais.
As empresas de mineração em todo o mundo deram grandes passos para implementar uma atividade de mineração mais sustentável. Mas também é necessário que nós, como consumidores, paremos de considerar que os telefones inteligentes são um item descartável e comecemos a reconhecer que eles constituem um recurso de grande valor que produz um enorme impacto ambiental.
Os autores recebem recursos do Natural Environment Research Council do Reino Unido.
Imagem – O povoado de Bento Rodrigues, sepultado por lama tóxica. SENADO FEDERAL
Fontes – The Conversation / P. B. / K.H.E., El País de 03 de setembro de 2018
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