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STF suspende julgamento do Código Florestal

Julgamento no STF hoje | Nelson Jr. / STF

Análise do caso será retomada, na próxima quarta. Só falta votar o ministro Celso de Mello. Questão da anistia a desmatamentos ilegais ainda está em aberto

O julgamento das quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Lei 12.651/2012, que revogou o Código Florestal de 1965, foi suspenso, no início da noite de hoje (22/2), no Supremo Tribunal Federal (STF). Falta votar apenas o ministro Celso de Mello. O caso será retomado na próxima quarta (28/2).

O julgamento havia sido reiniciado, ontem, quando votaram Marco Aurélio e Cármen Lúcia. Hoje, manifestaram-se todos os outros ministros, com exceção de Mello. Em setembro, Luiz Fux leu seu relatório e, em novembro, seu voto (saiba mais).

A decisão final sobre pontos importantes da lei permanece em suspenso. Daí a relevância da manifestação de Mello. A questão da anistia a multas e outras sanções para quem desmatou ilegalmente, antes de 22 de julho de 2008, deverá ser decidida pelo decano da corte. O mesmo vale para a possibilidade de se realizar atividades agropecuárias em de áreas de declive e topos de morro e a obrigatoriedade de recuperar áreas de RL desmatadas ilegalmente (saiba mais no box ao fim da reportagem).

Mas os ministros também tomaram algumas decisões positivas para a preservação das matas brasileiras. De acordo com a interpretação que prevaleceu, todas as nascentes e olhos de água devem ter APPs preservadas, independente de serem intermitentes ou perenes. Também ficaram proibidas atividades como lixões e aterros e construção de instalações esportivas em APPs (leia mais abaixo).

A contagem dos votos dos ministros até aqui em cada um dos vários temas em jogo traz algumas más notícias para o meio ambiente. Já foram consideradas constitucionais, entre outros pontos: a redução drástica da obrigação de se recuperar Áreas de Preservação Permanente (APPs) na beira de rio, de acordo com o tamanho do imóvel rural; a medição das APPs nesses mesmos locais conforme o “leito regular” do curso de água, segundo sua variação média anual, e não conforme o leito maior medido na cheia, o que implica a redução dessas áreas; e a possibilidade de se recuperar metade das Reservas Legais (RLs) desmatadas com espécies exóticas (veja outros pontos no box ao final da reportagem).

Segundo cientistas, a diminuição das APPs e da obrigação de recuperá-las tem potencial de produzir graves impactos ambientais. As matas de beira de rios e nascentes são fundamentais para garantir o abastecimento de água e evitar desastres climáticos, como inundações e enxurradas. A decisão do STF é ainda mais preocupante num cenário de agravamento de extremos climáticos no país, como secas e chuvas torrenciais (leia mais).

“O Supremo, hoje, infelizmente acabou deixando de reconhecer inconstitucionalidades que, tal como apontados pela ciência, comprometem gravemente o equilíbrio ecológico”, avalia o advogado do ISA Maurício Guetta.

Divergência

Os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli acompanharam grande parte do voto do relator, que declarou inconstitucional a anistia, mas manteve boa parte dos dispositivos questionados, incluindo dispensas de recuperação de áreas desmatadas.

Toffoli foi um dos principais defensores da legislação atual no julgamento. Ele tentou relativizar o perdão de punições por danos ambientais promovido por ela. “Não é todo e qualquer dano ambiental que está anistiado. A anistia não é total”, argumentou. O magistrado insistiu que o Congresso teria autonomia para mudar a lei, mesmo ao custo da proteção ambiental, como fizeram Fux, Gilmar Mendes e Barroso.

Ontem, Marco Aurélio havia aberto a divergência com o relator, com um voto voltado à proteção ambiental. Hoje, Edson Fachin e Ricardo Lewandowski seguiram várias de suas posições.

“O regime de transição estruturado no novo Código Florestal revela proteção insuficiente do meio ambiental e afasta a reparação integral dos processos ecológicos essenciais”, disse Marco Aurélio.

O ministro defendeu com veemência a importância das APPs e condenou a anistia a desmatamentos ilegais. “Não se pode prestigiar infratores em detrimento daqueles que sempre arcaram com o ônus econômico de observar o ordenamento jurídico. A prosperar esse raciocínio, os produtores rurais sempre terão incentivos para desmatar, aguardando nova legislação, nova anistia”, criticou.

Coube a Gilmar Mendes dar o voto mais conservador da sessão de hoje. Ele recusou integralmente toda as quatro ações. Mendes leu um extenso trecho do parecer do então deputado Aldo Rebelo, relator do projeto que acabou resultando na Lei 12.651 e fiel aliado dos ruralistas. O ministro chegou a dizer que as posições contrárias à redução das APPs, defendidas pela comunidade científica, eram “mero achismo” e condenou a atuação das organizações não governamentais e do Ministério Público Federal na defesa do meio ambiente.

“Nenhum direito pode ser considerado absoluto”, repetiu, ao criticar a aplicação do princípio legal da proibição do retrocesso em matéria ambiental. Na véspera, o ministro foi elogiado e aplaudido na festa da posse da nova coordenação da bancada ruralista, em Brasília.

Principais pontos do julgamento do Código Florestal até aqui

Más notícias para o meio ambiente

Foram considerados constitucionais:

– Redução da obrigação de se recuperar APPs na beira de rio, de acordo com o tamanho do imóvel rural

– Medição das APPs na beira de rio conforme o “leito regular” do curso de água, segundo sua variação média anual, e não conforme o leito maior medido na cheia

– Possibilidade de se recuperar metade das RLs desmatadas com espécies exóticas

– Cômputo de APP no percentual de RL

– Redução de APPs para reservatórios

– Possibilidade de aquicultura em APPs

– Possibilidade de se realizar atividades agropecuárias em áreas com inclinação entre 25º e 45º

– Plantio em várzeas para pequenos imóveis rurais

– Dispensa de recomposição de RL se o desmatamento foi feito de acordo com a regra vigente à época

Ainda em aberto

– Anistia a multas e outras sanções para quem desmatou ilegalmente, antes de 22 de julho de 2008

– Compensação de áreas desmatadas por meio da compra de terras a milhares de quilômetros do imóvel onde ocorreu o desmatamento (dentro do mesmo bioma)

– Possibilidade de redução da Reserva Legal (RL) de 80% a 50% pela existência de TIs e Unidades de Conservação (UCs) no município ou quando o Estado tiver Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) e mais de 65% de UC em seu território

– Possibilidade de se realizar atividades agropecuárias em APPs de declive e topos de morros

– Obrigatoriedade de recuperar áreas de RL desmatada ilegalmente

– Possibilidade de autorização de supressão de vegetação para quem desmatou ilegalmente

Boas notícias para o meio ambiente

Segundo os ministros:

– Só é possível desmatar APPs por “interesse social” ou “utilidade pública” quando não houver “alternativa técnica e locacional”

– Não é possível desmatar APPs para implantar instalações de gestão de resíduos ou de atividades esportivas

– Todas as nascentes e olhos de água devem ter APPs preservadas, independente de serem intermitentes ou perenes

– Todas as Terras Indígenas, e não só as “demarcadas”, e todas as áreas de comunidades tradicionais, e não apenas as “tituladas”, devem ter o mesmo tratamento que os pequenos imóveis rurais quanto ao novo regime de proteção das matas

Fonte – Oswaldo Braga de Souza, Instituto Sócio Ambiental de 22 de fevereiro de 2018

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