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Substância usada em mamadeiras afeta cérebro de mães camundongos

Mão segurando mamadeiraPesquisa: BPS é uma substância encontrada em artigos plásticos de uso infantil em substituição ao BPA, proibido em muitos países para essa finalidade. (Thinkstock)

Em laboratório, exposição ao Bisfenol S (BPS) em animais foi associada à negligência materna e até mesmo infanticídio

São Paulo – Nos últimos anos, tem crescido o interesse dos cientistas a respeito dos efeitos potenciais de substâncias químicas industriais presentes em artigos do dia a dia sobre a saúde humana e de outros animais. Eles já descobriram, por exemplo, que algumas delas podem se comportar como hormônios impostores e interferir no correto funcionamento do sistema endócrino dos seres vivos, com graves consequências para seu desenvolvimento.

Quando tais substâncias, chamadas de “disruptores endócrinos”, estão presentes em produtos destinados a gestantes e bebês, grupos vulneráveis, a preocupação é redobrada. Atentos aos perigos, vários países do mundo, incluindo o Brasil, proibiram nos últimos anos a venda de mamadeiras de plástico, chupetas e outros utensílios de uso infantil que contenham a substância Bisfenol A (BPA), associada a diversos tipos de câncer e problemas reprodutivos, além de obesidade, puberdade precoce e doenças cardíacas.

Para substituir o BPA, surgiu outra substância, o Bisfenol S (BPS). Mas uma nova pesquisa divulgada nesta semana também coloca em xeque a segurança desse substituto químico. No estudo inédito, a cientista de saúde ambiental Laura Vandenberg e a neurocientista Mary Catanese, da Universidade de Massachusetts Amherst, examinaram os efeitos do BPS sobre o comportamento materno e as regiões cerebrais relacionadas a ele em camundongos.

Elas descobriram mudanças sutis, mas marcantes, no comportamento de nidificação das mães expostas ao BPS durante a gestação e a lactação de sua prole. Um efeito preocupante foi “o aumento surpreendente da incidência de infanticídio” em um grupo de ratos.

Segundo as pesquisadores, embora estudos anteriores tenham indicado baixa exposição humana ao BPS, essa  exposição tem aumentado ao longo dos últimos 10 anos. E, assim como o BPA, há evidências de que BPS também seja um disruptor endócrino.

Os resultados da pesquisa sugerem que os cuidados maternos, incluindo a capacidade das mães para se adaptarem às necessidades de seus filhotes durante o desenvolvimento precoce, foram prejudicados após a exposição ao BPS “com efeitos diferentes baseado na dose, período pós-parto e tempo de exposição durante a gestação.”

A pesquisa foi publicada na revista científica Endocrinology. Segundo as autoras, “descobrir os efeitos de substâncias químicas ambientais que podem influenciar os cuidados maternos adequados têm implicações sociais e de saúde pública amplas” porque, de uma perspectiva evolutiva, o comportamento materno está relacionado à própria sobrevivência da prole.

Metodologia

Para a análise, as pesquisadoras dividiram camundongos grávidas em três grupos de tratamento: um não recebeu nenhuma dose de BPS, enquanto os outros dois receberam doses pequenas mais em níveis diferentes durante a gestação e lactação.

Além disso, duas fêmeas de cada uma dessas ninhadas foram acasaladas com ratos machos não expostos ao BPS e testadas quanto ao comportamento materno usando os mesmos ensaios usados para testar suas mães.

As pesquisadoras registraram o comportamento de cada mãe na construção e proteção do ninho,  comendo, alimentando, bebendo, dormindo, descansando e cuidando dos filhotes em três momentos separados depois que eles nasceram.

Os animais também foram avaliados quanto ao tempo de resgatar os filhotes que foram removidos do ninho, outra medida de cuidado materno.

Durante o processo, as pesquisadoras examinaram os efeitos da exposição ao BPS em uma região do cérebro sensível ao estrogênio (hormônio sexual feminino) ou substâncias químicas que o imitam.

Resultado

As autoras encontraram um surpreendente aumento da incidência de infanticídio entre as mães expostas à menor dose de BPS durante a gestação. Elas relatam que embora esses mesmos efeitos não tenham sido observados na dose mais alta, mais de 10% das fêmeas expostas a 2 microgramas de BPS por quilo ao dia mataram seus filhotes ou forneceram cuidados maternos tão pobres que um ou mais filhotes padeceram.

“Embora não seja estatisticamente significante, a negligência e a má atenção materna que observamos foram impressionantes. ”

Além do infanticídio, elas também encontraram efeitos induzidos por BPS em aspectos importantes do cuidado materno tanto em mães expostas quanto em suas filhas.

As fêmeas expostas à maior dose de BPS durante a gestação e a lactação passaram significativamente mais tempo no ninho do que as fêmeas do grupo de controle, um dado inesperado, tendo em vista que as mães geralmente passam menos tempo no ninho à medida que os filhotes crescem e se desenvolvem. Os pesquisadores sugerem que a exposição da mãe BPS “pode indicar uma falta de ajuste” para a evolução das necessidades de seus filhotes.

As mães expostas a BPS também mostraram latência (o tempo que se estabelece, por exemplo, entre um estímulo e uma resposta) significantemente menor para recuperar seu primeiro filhote removido do ninho e para recuperar sua ninhada inteira, o que pode não representar melhor cuidado, mas “indicar hiperatividade, comportamento compulsivo, stress, resposta a filhotes dispersos”.

Diferentes efeitos foram observados nos comportamentos maternos das filhas expostas ao BPS. Segundo a pesquisa, elas passaram significativamente menos tempo no ninho em comparação com os camundongos não expostos. O tempo gasto na construção do ninho foi maior, o que “pode indicar um comportamento repetitivo ou semelhante ao “TOC”, transtorno obsessivo compulsivo.

De acordo com as cientistas,  “descobrir os efeitos de substâncias químicas ambientais que podem influenciar os cuidados maternos adequados têm implicações sociais e de saúde pública amplas” porque, de uma perspectiva evolutiva, o comportamento materno está relacionado à sobrevivência da prole.

Fonte – Vanessa Barbosa, Exame de 23 de dezembro de 2016

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